28 Junho 2022
"Comemoramos a data de 29 de junho, solenidade de São Pedro e São Paulo, de um ponto de vista diferente, aquele dos túmulos dos papas na basílica vaticana de São Pedro, num período de tempo que vai do V ao XII século, praticamente desde o famoso Leão Magno, que ascendeu ao trono petrino da Tuscia em 440, até Eugênio III que morreu em 1153", escreve o cardeal italiano Gianfranco Ravasi, prefeito do Pontifício Conselho para a Cultura, em artigo publicado por Il Sole 24 Ore, 26-06-2022. A tradução é de Luisa Rabolini.
Os túmulos dos papas. Um detalhado estudo histórico e epigráfico sobre os túmulos dos papas que dirigiram a Igreja do século V ao XII.
Comemoramos a data de 29 de junho, solenidade de São Pedro e São Paulo, de um ponto de vista diferente, aquele dos túmulos dos papas na basílica vaticana de São Pedro, num período de tempo que vai do V ao XII século, praticamente desde o famoso Leão Magno, que ascendeu ao trono petrino da Tuscia em 440, até Eugênio III que morreu em 1153. Quem reconstrói esta sequência histórica através de 42 epígrafes funerárias em latim é Ottavio Bucarelli, professor de Arqueologia na Pontifícia Universidade Gregoriana, que escolheu o título de seu ensaio com uma das fórmulas adotadas nesses textos: hic requiescit papa (usada por Pelágio em 561 e por Gregório Magno em 604).
Antes, porém, reservamos uma premissa particular para a figura fundamental do apóstolo Pedro. É interessante notar que a Primeira Epístola do Novo Testamento que leva seu nome contém uma curiosa indicação final: "A vossa comunidade co-eleita na Babilônia vos saúda" (5,13). Sabe-se, também através do Apocalipse, que "Babilônia" era frequentemente o símbolo usado para indicar a Roma imperial. "Pedro, apóstolo de Jesus Cristo" que escreve essa Epístola aos cristãos da Ásia Menor (1, 1) estaria, portanto, na capital.
Mas prossigamos para buscar uma conexão do martírio de Pedro com a cidade de Roma. Se os escritos do Novo Testamento são omissos a esse respeito, não devemos ignorar a existência de documentos pouco posteriores aos eventos que confirmam esse vínculo. Em sua Carta aos Coríntios, escrita por volta do ano 95, o Papa Clemente I (talvez de 92 a 99), faz uma referência explícita ao martírio romano das duas "colunas mais elevadas" da Igreja (5, 2-3), ou seja, Pedro e Paulo. Estamos poucos anos depois dos fatos e, portanto, era fácil contestar esse dado, que, ao contrário, já era considerado pacífico.
Aliás, o famoso historiador da Igreja do III-IV século Eusébio de Cesareia, em sua obra História Eclesiástica (2, 25, 1-8), cita o escrito de um sacerdote romano do século II, Caio, que atestava a existência de um "troféu" na área Vaticana em memória da morte de Pedro com a inscrição do nome do apóstolo (assim como outro havia sido erguido na Via Ostiense para Paulo).
A partir de 1939, através das várias prospecções arqueológicas nos subterrâneos da Basílica de São Pedro, foram identificados vestígios dessa antiga memória, também através de inscrições em grego do nome de Pedro e grafites devocionais com invocações ao apóstolo. Para além da confirmação, sempre a ser assumida com muita cautela, oferecida pelos escritos apócrifos cristãos (por exemplo, os Atos de Pedro), resta, portanto, uma atestação - que floresceu nas primeiras décadas da vida da Igreja, e documentada ao longo do tempo imediatamente sucessivo - não só da presença de Pedro em Roma, mas também de seu martírio e sepultamento na área do Vaticano.
Mas voltemos ao catálogo que Bucarelli elaborou com extraordinária acribia, vasculhando testemunhos e envolvendo os muitos estudiosos que há tempo submeteram aquelas epígrafes a um ideal microscópio filológico, identificando também sua topografia. Essa pesquisa tem seu ápice nas 42 fichas epigráficas muito precisas, acompanhadas pelo tradicional cortejo de índices, concordâncias e bibliografias. Também se parte do palimpsesto bíblico, onde domina o símbolo do "bom pastor" (João 10) que salva o rebanho dos fiéis dos lobos: é paradoxal, mas no epitáfio do Papa Sérgio III (século X) o lobo que espalha o rebanho não é outro senão seu predecessor João IX.
Não faltam, no entanto, referências a autores clássicos (Plauto, Virgílio, Ovídio), aos Padres da Igreja ou a poetas cristãos famosos como Venâncio Fortunato (século VI). Desfilam também títulos oficiais solenes como pontifex, pastor, papa, pater e assim por diante, e não faltam perfis pastorais, doutrinais e históricos dos vários pontífices. E é precisamente nesta linha que as epígrafes oferecem uma riqueza de dados: selecionamos apenas alguns exemplos dotados de um fascínio todo particular. O primeiro diz respeito ao intenso final da epígrafe fragmentária do papa romano Bonifácio II, falecido em 532: "Ninguém ignora, Santo Padre, que você está com Cristo, sua esplêndida vida demonstra que Ele estava com você". Com 14 palavras do texto em latim, escolhidas como imagem de capa do volume, é possível sintetizar um passado existencial luminoso sustentado por aquele Cristo que agora acolhe consigo o pontífice em um presente eterno.
O outro exemplo que extraímos dessa coleção epigráfica é bastante inesperado. O pontífice em questão é outro romano, Adriano I, que morreu em 795, e o texto funerário de 40 linhas está gravado em uma laje de mármore preto. O elemento mais surpreendente é a aparição naqueles hexâmetros da figura de Carlos Magno que se dirige ao papa beatus usando o apelativo de pater e confessando ter escrito aqueles versos entre lágrimas. É uma declaração de afeto, encastoada dentro de uma elegia apaixonada, com referência até mesmo ao Enéas virgiliano. Eis a voz ideal daquele que se denomina em outro hexâmetro Karolus rex, cujas palavras dispensam tradução: ...
lacrimans Karolus haec carmina scribsi /
tu mihi dulcis amor, te modo plango, pater/
tu memor esto mei...
Ottavio Bucarelli, Hic requiescit papa, GBP, Pontifícia Universidade Gregoriana, Pontifício Instituto Bíblico, pp. 262, € 34
Foto: Divulgação/Amazon
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“Hic iacet” um sucessor de Pedro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU