11 Setembro 2018
A Pontifícia Comissão para a Proteção dos Menores encerrou no domingo, 9 de setembro, a sessão plenária que começou na sexta-feira passada. Nosso colega Sergio Centofanti entrevistou o cardeal Sean Patrick O’Malley, presidente deste organismo.
A entrevista é de Sergio Centofani, publicada por Vatican News, 09-09-2018. A tradução é do Cepat.
O Papa Francisco destacou a importância central de escutar as vítimas, já que o que viveram representa um guia para a Igreja na proteção de menores vítimas de abusos sexuais. Diante da atual situação e os fatos recentes, as vítimas realmente estão sendo escutadas e quanto se pode aprender com elas?
Certamente, os recentes fatos na Igreja centraram a atenção de todos na urgente necessidade de uma resposta clara da Igreja sobre o abuso sexual de menores. É claro, uma das responsabilidades da Comissão é procurar escutar as vítimas. Sempre estamos atentos a escutar seus depoimentos, que tanto contribuem para nossas deliberações e nossas avaliações.
Desta vez, começamos nossa reunião escutando os depoimentos, em primeiro lugar, de uma mulher da América Latina que foi maltratada por um sacerdote; depois, a mãe de duas vítimas adultas dos Estados Unidos. A voz das vítimas é realmente importante.
Nestes dias, nós nos encontramos com os novos bispos e, assim como aconteceu em outras ocasiões, convidei Marie Collins para escutar o depoimento direto de algumas pessoas que tiveram a experiência de sofrer este horror em suas vidas e que, portanto, podem explicar as consequências e repercussões que os abusos têm sobre o indivíduo, a família e toda a comunidade.
Portanto, levar a voz das vítimas a todos os vértices da Igreja é crucial para fazer com que todos entendam o como é importante para a Igreja dar respostas de maneira rápida e correta a cada situação de abuso, a qualquer momento que se manifeste.
De modo particular, à luz da situação atual, se a Igreja é incapaz de responder com todo o seu coração e fazer deste assunto uma prioridade; todas as nossas outras atividades de evangelização, obras de caridade e educação se verão afetadas. Esta deve ser a prioridade na qual devemos nos focar agora.
Muitas vezes, a Comissão fala de seu dever em promover a “responsabilidade local” pela proteção. O que significa isto em termos concretos? E é realista?
A Comissão é implacável em levar a mensagem de proteção a todo o mundo. Sabemos que há muitos continentes onde se trata de um tema novo, a respeito do qual as pessoas às vezes não falam muito, e de modo particular em terras de missão, onde a Igreja tem muito poucos recursos. Portanto, a partir de nossa última reunião, nossos membros participaram em mais de 100 conferências em todo o mundo. Neste momento, estão sendo planejadas importantes conferências no Brasil, em colaboração com a Conferência Episcopal, assim como na Colômbia, México e Polônia.
Também estamos trabalhando diligentemente na elaboração de linhas-guia: uma de nossas últimas iniciativas é desenvolver instrumentos de verificação que possam ser utilizados pelas Conferências Episcopais para medir a implementação e o cumprimento das mesmas. Desta forma, quando os bispos vierem a Roma por ocasião das visitas ad limina, poderão demonstrar como puderam colocar em prática estas linhas-guia que cada Conferência Episcopal realizou por encargo da Santa Sé e do próprio Santo Padre.
Que feedback ou comentários a Comissão está recebendo a respeito destes esforços?
As Conferências Episcopais que nos veem envolvidos na educação e na formação nos apoiam muito. Uma de nossas iniciativas agora é criar em vários continentes os Survivors Advisory Panels, (Comitês de consulta para os sobreviventes). O primeiro será no Brasil, mas também iniciamos o processo na África e na Ásia.
Desta maneira, contaremos com grupos de vítimas que possam assessorar as Conferências Episcopais locais, oferecer sua contribuição, mas também consolidar o trabalho de nossa Comissão Internacional.
Existe muita confusão sobre o papel da Comissão. Foi criticada muitas vezes por uma aparente falta de “poder” na implementação de reformas incisivas. No entanto, o mandato da comissão estabelece que é um “órgão consultor” do Santo Padre. Como funciona o trabalho em si mesmo?
Às vezes, as pessoas me apresentam como o presidente da “Comissão sobre o abuso sexual” e sempre as corrijo dizendo que não, nossa competência se refere à proteção de menores: é realmente uma tarefa que se refere à prevenção. Não somos um órgão que se ocupa de casos já perpetrados ou de situações particulares de abuso. Estamos buscando mudar o futuro, para que estas histórias tristes não se repitam; e realizamos esta tarefa mediante a adoção de recomendações que apresentamos ao Santo Padre.
Nossa tarefa também é promover as melhores práticas e diretrizes que levem em conta a proteção e a prevenção.
Além disso, realizamos programas de educação e capacitação para aqueles que estão na cúpula da Igreja, para que nossos bispos, sacerdotes e religiosos sejam conscientes da gravidade do assunto e tenham as ferramentas para responder, de maneira que coloquem como prioridade a proteção aos menores e o cuidado pastoral da vítima.
Este é o objetivo que impulsiona nossa atividade. Há outros Dicastérios na Santa Sé que são responsáveis em abordar os casos individuais e as circunstâncias de abuso ou negligência dessas tarefas. Nós temos nossas competências, que acredito que são realmente muito importantes [...]. Com efeito, nosso trabalho é sobre prevenção e tentar fazer da Igreja o lugar mais seguro para crianças e adultos vulneráveis.
Como são as relações com os outros organismos da Cúria Romana?
Como disse, uma de nossas responsabilidades é formar os líderes da Igreja. Por esta razão, organizamos conferências em muitos Dicastérios onde tivemos a oportunidade de falar sobre o tema. Nestas ocasiões, sempre me acompanha uma vítima e falo da missão da Igreja em oferecer proteção. Acredito que estas reuniões foram muito exitosas.
Nesta semana, os membros de nossa Comissão se encontrarão com lideranças da Conferência Episcopal Italiana e a Congregação para a Doutrina da Fé.
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“Urge levar a voz das vítimas de abusos à cúpula da Igreja”. Entrevista com o cardeal Sean O’Malley - Instituto Humanitas Unisinos - IHU