Em seu último livro, Il fascismo e noi. Un’interpretazione filosofica (O fascismo e nós. Uma interpretação filosófica, em tradução livre, Einaudi, 306 páginas, € 26), Roberto Esposito aborda o fascismo não apenas como um fenômeno histórico-político, mas como uma “máquina metafísica”. Para o filósofo napolitano, essa “máquina” atua não apenas no poder, mas também na “experiência interior”, isto é, nos desejos, nas relações e nas linguagens. Para agir contra a inquietante latência do fascismo hoje, é preciso reconhecer seu problema.
A entrevista é de Roberto Ciccarelli, publicada por il Manifesto, 11-09-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Roberto Esposito, quem é o “nós” de quem se fala no título?
Todos nós, italianos, mas não apenas os italianos. O fascismo, em suas diversas expressões, atravessou toda a época contemporânea. Ninguém pode dizer-se completamente estranho. Naturalmente, nem todos responderam da mesma forma. Alguns o combateram, às vezes a ponto de sacrificar a vida, e outros se tornaram seus intérpretes. Mas sempre dentro do horizonte, ou melhor, dentro da ferida que o fascismo abriu no coração do século XX. Todos nós fomos e somos marcados por ele. Até mesmo a condição, lógica e histórica, do antifascismo é o evento do fascismo.
Ser "anti" basta para ser "diferente" do fascismo?
No plano político, ser antifascista é indispensável. No entanto, para combater algo, não podemos simplesmente nos limitar a negá-lo, empurrando-o para fora de nós como um objeto ao qual se contrapor. O fascismo não pode ser reduzido a uma figura meramente de contraste ou de reação. Também foi uma força produtiva de terror e de morte. No livro, abordo essa força. A filosofia serve para superar as pulsões e os pesadelos que nos habitam.
Enxerga um risco de "fascismo" já a partir da definição de "nós", isto é, de nos definirmos como uma "comunidade"?
O termo "comunidade" tem dois lados. Pode ser entendido como uma identidade fechada, defensiva e até agressiva. E, nesse sentido, tem uma raiz fascista, ou um possível desfecho fascista. Mas também pode ser entendido no sentido aberto da communitas, como compartilhamento de uma ausência de identidade, diferença em comum. A ideia, e mesmo a prática, de comunidade está sempre equilibrada entre uma semântica fascista e uma semântica radical. Pode-se acrescentar que a experiência histórica do comunismo, o chamado "real", abrange ambos os significados.
Mais do que apenas um regime, um movimento ou uma doutrina, você define o fascismo como uma "máquina metafísica". Não há o risco de desistoricizar o fascismo?
Não acredito. Minha análise sempre parte de um dado histórico e dá grande ênfase à historiografia do fascismo, muitas vezes de alta qualidade. No entanto, busca combiná-la com uma análise paradigmática voltada à essência do fenômeno fascista. Nessa perspectiva, a filosofia, assim como a psicanálise e a literatura resultam essenciais. O fascismo, como concepção da vida e da morte, do espaço e do tempo, de ser e do devir, expressa, ainda assim, uma aberrante posição metafísica. Mas se trata de uma metafísica "realizada", produtora de catastróficos efeitos. Nesse sentido, foi uma "máquina", ao mesmo tempo metafísica, pulsional e bélica. Não por acaso tanto Heidegger (Machenschaft) quanto Jünger (Mobilmachung) usem o termo, que também foi retomado em chave crítica por Gilles Deleuze e Félix Guattari (máquina desejante).
O fascismo não é apenas algo externo, mas também "experiência interior". O que significa?
Que o fascismo atua profundamente, não apenas nos corpos, mas também nas mentes, no imaginário e nos desejos daqueles que são simultaneamente seus "sujeitos" e "sujeitados". Ele os oprime, mas também desencadeia neles instintos sádicos e masoquistas, pulsões de vida e de morte. É por isso que consegue ampliar tanto seu círculo de influência. Vontade de poder e pulsão de morte fazem parte de cada um de nós, em graus variados e com resultados distintos. Mas o fascismo torna presente e ativo o que está latente em nós.
Spinoza, no século XVII, já se perguntava por que os homens desejam a repressão. Como esse problema influenciou a relação entre filosofia e psicanálise e a análise do nazifascismo?
Bastante. Sigmund Freud não faz referência explícita a Spinoza. Mas o tema espinosiano, antecipado por Étienne de La Boétie, circula na cultura psicanalítica. Wilhelm Reich e Eric Fromm ambos o retomam. Sem mencionar Gilles Deleuze, grande conhecedor de Spinoza. Voltemos ao "nós". Nós vivemos dentro de dispositivos de controle e de obediência.
Como os neutralizamos?
De certa forma, são inevitáveis. Para outros, são uma atitude induzida. A liberdade é uma condição necessária e difícil, a ponto de, como acredita Fromm, em certas circunstâncias nos levar a fugir dela. O fascismo explora essa ambivalência. Não acaso argumenta, pelas palavras dos "Senhores" de Salò-Sade — o último filme de Pasolini — que o poder é sempre anárquico, imposto aos outros e absolutamente arbitrário em relação a si mesmo.
Você escreve que o fascismo desafiou a filosofia. De que forma?
Colocando-se em seu próprio terreno. Os interpretes insistiram com razão na primazia, no fascismo, da ação sobre a reflexão, da práxis sobre a teoria. No entanto, o fascismo deu — basta pensar em Giovanni Gentile — à própria ação um significado espiritual. Até o nazismo foi definido por Emmanuel Levinas como "filosofia do hitlerismo".
O "hitlerismo" foi uma filosofia?
Estou bem ciente de que conjugar o nazismo à filosofia possa ser doloroso, como o próprio Levinas reconhece. Mas dizer, como se argumentava durante o nazismo, que a essência do homem, sua "alma", é constituída por seu corpo racial, ao qual o homem permanece grudado para sempre, não é apenas um gesto filosófico, mas também metafísico. Por outro lado, com todas as distinções necessárias, o fato de Heidegger ter sido nazista e Gentile, fascista, torna impossível proteger a filosofia do século XX do fascismo.
Michel Foucault definiu o Anti-Édipo de Deleuze e Guattari de um livro "antifascista". Esse texto, provavelmente o mais importante sobre essas questões nos últimos 50 anos, é também um livro contra o capitalismo. Qual é a relação entre fascismo e capitalismo?
Max Horkheimer estava certo ao argumentar que falar de fascismo sem falar de capitalismo é impossível. Mas talvez a pessoa que melhor formulou a questão foi Karl Polanyi. Para ele, o fascismo é uma forma violenta e radicalmente antidemocrática de sair da crise do capitalismo da década de 1920. O fascismo simultaneamente despolitizava a sociedade, entregando-a ao governo de uma economia corporativa, e a politizava, impondo tal governo pela força. Um sistema de partido único implica a destruição de todo elemento da democracia. Ora, sem transpor automaticamente essa condição para o presente, a tentação de uma solução autoritária para a crise econômica é sempre possível. Em sua época, o fascismo se opôs não apenas à democracia, mas também ao liberalismo. Isso nem sempre precisa ser assim.
Desde que Trump foi reeleito para a presidência dos Estados Unidos, há um debate sobre como definir sua política. A questão é se ele é fascista e de que forma. O que acha?
A personalidade de Trump tem fortes traços fascistas. Naturalmente não significa que ele se assemelhe aos ditadores da década de 1930. Seu mundo é a economia, o mundo opaco dos negócios, não a política. Mas mesmo a "teologia econômica", como a teologia política, é suscetível a uma inclinação fascista. Afinal, como não detectar no desprezo com que Trump trata os não brancos e os não ricos, em geral seus adversários, um tom fascista?
O racismo foi um componente essencial do nazifascismo. Quais são as diferenças com o racismo contemporâneo?
Conhecemos as consequências catastróficas do racismo fascista. O racismo contemporâneo é menos assustador do que o racismo nazista, mas talvez mais amplo. Não se concentra em uma única etnia, mas diz respeito a todo o mundo não ocidental. Não é construído por meio do confronto com uma raça que se apresenta superior, mas sim baseado em uma condição de privilégio que, para permanecer assim, deve excluir definitivamente aqueles que não fazem parte dela. Daí a rígida separação entre incluídos e excluídos. Aqueles que tentam cruzar essa linha estão expostos a uma violência que pode chegar à morte. Uma morte não infligida voluntariamente, mas permitida, segundo a tese já defendida por Foucault, uma vez que a biopolítica contemporânea "deixa viver" alguns e "deixa morrer" outros.
Como definiria o desejo dos Estados de trancar os migrantes em campos de concentração em países terceiros ao longo da costa do Mediterrâneo, ou o desejo de estabelecer uma força policial nos EUA dedicada às deportações?
Uma tendência securitária que pode desembocar numa pulsão fascista.
A "experiência interior" do fascismo inclui o desejo de dominação e o desejo cada vez mais praticado, de aniquilar a vida das mulheres pelos homens?
Os fascistas dividiam as mulheres em duas categorias: "mães-irmãs" e "mulheres perdidas". Como diz Klaus Theweleit, a enfermeira branca e a prostituta vermelha. Eles ao mesmo tempo desejavam as mulheres, assim como os não fascistas, e as temiam. Alimentavam um forte sentimento de impotência que, infelizmente, ainda está muito vivo hoje. A partir disso, a tentação de destruí-las até mesmo fisicamente é sempre o passo possível.