28 Abril 2023
Jeremy Rifkin assessora os principais governos do mundo sobre a próxima revolução industrial ou o que se batizou como New Green Deal, da administração de Joe Biden à de Xi Jinping, passando pela Comissão Europeia. Quando nas casas a internet era interrompida por uma chamada telefônica, ele já previu o fim do trabalho em razão da automação e a generalização das novas tecnologias.
Rifkin, economista, sociólogo e ativista pelo clima é um dos oradores, nesses dias, do Primeiro Congresso Trabalhista Catalão, tribuna que aproveita para convocar os países a começarem a cooperar e compartilhar água, energia e dados como única forma da espécie humana sobreviver à atual crise ecológica.
A entrevista é publicada por El Periódico, 25-04-2023. A tradução é do Cepat.
Ecologicamente falando, em que situação estamos?
Estamos diante de um perigo iminente de extinção, a sexta vivida pelo planeta. Estamos a caminho de, em 70 anos, perder a metade das espécies que existem, aqui, há milhares de anos. Temos que transformar completamente nosso sistema econômico, como nos relacionamos com a natureza, como fazemos pesquisa científica… O mesmo manual de instruções que seguimos para provocar esta crise não pode nos tirar dela, precisamos de novas soluções.
Todo mundo está assustado. As pessoas pensam: “algo está acontecendo e não posso ter o controle”. Grandes nevadas em lugares como a Califórnia, sendo que nunca nevou lá; inundações de primavera seguidas por secas no verão, temperaturas extremas no Mediterrâneo…
Todo o planeta está mudando de uma maneira que não entendemos e estamos começando a perceber que a Terra é muito mais poderosa do que pensávamos e que nós, como espécie, somos muito menores do que acreditávamos. Temos que transformar o medo atual em esperança e as possibilidades em uma oportunidade. Grandes crises geram grandes oportunidades.
E grandes riscos...
Sem dúvida. Para cada grau que a temperatura aumenta, devido aos gases do efeito estufa, a atmosfera extrai 7% a mais das precipitações do solo. Temos que repensar todo o paradigma econômico, com um novo sistema de comunicações, de energia, de mobilidade e para garantir a água.
Isso implica mudar os fundamentos dos governos, assim como a maneira em que educamos nossos filhos e nos relacionamos com a natureza. O início do fim da atual era dos combustíveis fósseis começou com a crise de 2008 e o colapso do sistema bancário.
No entanto, os combustíveis fósseis ainda desempenham um papel vital em guerras como a da Ucrânia.
Será a última guerra pelos combustíveis fósseis, assim espero. A Comissão Europeia está agora convencida a abandoná-los.
Contudo, uma das primeiras reações dos estados foi justamente buscar fornecedores alternativos, olhando para o gás do norte da África.
Sim, é verdade que alguns países optaram por isso, mas a linha da Comissão Europeia é outra. Ela tem clareza de que a energia solar e a eólica são as mais baratas, não geram faturas. A questão é se podemos fazer a transição a tempo, porque está se esgotando e os meios de comunicação mal falam a esse respeito.
Considera que governos como os dos Estados Unidos e China, realmente, levam a sério a crise climática?
Absolutamente, pois não lhes resta outro remédio. Estamos caminhando para o capítulo final, todos estão se olhando de lado e todos vão perder. Temos que passar da geopolítica à biopolítica.
Daí sua ideia de “biorregiões”, coerentes com os ecossistemas, não com as fronteiras nacionais.
Exato, a crise climática não entende de fronteiras, mas, sim, de ecossistemas. O Mediterrâneo, com seus 22 estados, é o ecossistema mais em risco. Está aquecendo mais rápido do que qualquer outro e algumas de suas regiões podem se tornar inabitáveis até 2050.
Sem renunciar aos governos nacionais e regionais, temos que escalar para um novo nível de governança. Nos Estados Unidos, já existem, a China também está nesse desenvolvimento e garanto que no próximo mandato da Comissão Europeia estarão, garanto.
Qual é o papel da Catalunha nessas biorregiões?
A Catalunha está em uma posição única. O Mediterrâneo será a ponta de lança da mudança ou o exemplo do que acontecerá ao resto do mundo se não agirmos. A Espanha pode desempenhar um papel fundamental, especialmente agora que, em julho, assumirá a presidência do Conselho da União Europeia.
A União para o Mediterrâneo, com sua sede em Barcelona e que reúne todos os estados mediterrâneos, tanto do sul como do norte, é uma ideia adormecida que, a partir de julho, deverá ser ativada e Barcelona deverá assumir um papel de liderança.
Como essa transição afetará as grandes empresas?
Dell, Microsoft, Google… todas essas companhias não existirão em 40 anos. Algumas sofrerão mudanças e outras simplesmente desaparecerão. A primeira e a segunda revolução industrial exigiam uma centralização dos processos, a terceira, a que estamos vivendo, exatamente o oposto. A crise climática implica mudanças contínuas e isso é difícil para as grandes corporações e fácil para as pequenas. É o momento das cooperativas.
E como afetará os empregos?
Quase nada em nosso mundo está projetado para a crise climática, tudo deve ser mudado. Comunicação, energia, logística… são grandes oportunidades de trabalho. Se perdermos essa oportunidade, a partir da segunda metade do século, veremos um mundo em que não queremos viver. Estamos vivendo a maior mudança na história do planeta, mas também somos a espécie com maior capacidade de adaptação às mudanças.
A semana de trabalho de 4 dias entra nessa transformação?
Sim, sem dúvida. O capitalismo entrou em uma contradição. A tecnologia é cada vez mais barata e dispensa mais trabalhadores. Contudo, sem muitos trabalhadores com capacidade de consumir e comprar seus produtos, não faz sentido.
Então, ou reduzimos o número de trabalhadores, ou é preciso reduzir a semana de trabalho. E devemos distribuir melhor os salários, não pode haver a desigualdade que existe atualmente, em que 100 corporações acumulam um terço do PIB mundial.
Confia nas novas gerações para essa mudança?
Absolutamente. Pela primeira vez na história, as gerações mais jovens, os millennials e os Z, veem a si mesmos como espécies e como espécies em extinção. Precisam entrar nos negócios, na sociedade civil e na política para difundir essa atitude.
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“Estamos vivendo a maior mudança na história do planeta”. Entrevista com Jeremy Rifkin - Instituto Humanitas Unisinos - IHU