17 Setembro 2021
O principal comandante militar dos EUA esteve tão preocupado com a saúde mental de Donald Trump que tomou medidas secretas para evitar que o então presidente americano desencadeasse uma guerra com a China. A revelação consta em um novo livro a ser lançado no dia 21 de setembro.
A reportagem é publicada por Deutsche Welle Brasil, 15-09-2021.
O chefe do Estado-Maior Conjunto dos Estados Unidos, Mark A. Milley, contatou militares chineses para evitar um conflito armado com o país asiático e também ordenou a seus assessores que não agissem imediatamente no caso de qualquer movimento de Trump para usar as forças nucleares dos EUA.
Milley ligou para um general chinês para tranquilizar Pequim, de acordo com os jornalistas Bob Woodward e Robert Costa em sua obra Peril (perigo, em tradução livre).
O jornal The Washington Post – que tem Woodward e Costa em seu time de colaboradores – e outros veículos de comunicação divulgaram nesta terça-feira (14/09) trechos do livro. Eles descrevem como Milley teria atuado para possibilitar que o Pentágono e a comunidade de inteligência resistissem a qualquer eventual ato de Trump visando aumentar as tensões com a China ou o Irã após sua derrota na eleição presidencial de novembro de 2020.
Milley ligou duas vezes para o general Li Zuocheng, em 30 de outubro, pouco antes da derrota eleitoral de Trump, e em 8 de janeiro, dois dias depois que os apoiadores de Trump atacaram o Capitólio dos Estados Unidos, para assegurar-lhe de que a retórica anti-China do presidente republicano não iria se traduzir em ação militar.
"General Li, quero assegurar-lhe que o governo americano está estável e tudo vai ficar bem", disse Milley a Li em uma teleconferência realizada em outubro, segundo o texto de Woodward e Costa. "Não vamos atacar ou conduzir nenhuma operação cinética contra vocês", disse Milley.
Dois meses depois, Milley usou um canal secreto com Li novamente, depois da invasão do Capitólio, em meio a preocupações tanto de Pequim como de Washington com a instabilidade de Trump. "Estamos 100% estáveis. Tudo está bem. Mas a democracia pode ser desleixada às vezes", disse Milley a Li, de acordo com o livro.
Para tranquilizar os chineses, Milley chegou ao ponto de fazer com que o Comando Indo-Pacífico do Pentágono adiasse exercícios militares que Pequim poderia considerar uma possível ameaça.
Milley também disse ao seu alto escalão que se Trump buscasse exercer seu poder para ordenar um ataque nuclear, ele teria que ser informado primeiro.
E Milley discutiu com outras autoridades importantes, incluindo a diretora da CIA Gina Haspel e o chefe da Agência de Segurança Nacional, Paul Nakasone, a necessidade de estar vigilante em meio a preocupações com a possibilidade de Trump agir irracionalmente. Haspel disse que eles estavam em uma "situação altamente perigosa".
"Alguns podem argumentar que Milley ultrapassou sua autoridade e assumiu um poder extraordinário", escreveram os autores, ponderando que ele acreditava que estava agindo corretamente "para garantir que não houvesse ruptura histórica na ordem internacional, nenhuma guerra acidental com a China ou outros, e nenhum uso de armas nucleares".
O Pentágono se recusou a comentar as afirmações do livro.
Trump atacou Milley nesta terça-feira, xingando o militar e culpando-o pela caótica retirada dos EUA do Afeganistão em agosto. "Suponho que ele seja julgado por traição, por estar lidando com seu homólogo chinês pelas costas do presidente", disse Trump em nota.
A segunda ligação de Milley para Li ocorreu depois que a presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, telefonou para Milley para falar sobre o estado mental de Trump e sua rejeição – mantida até hoje – à vitória eleitoral do presidente Joe Biden.
Dois dias antes, instigados por Trump, centenas de apoiadores atacaram violentamente o Congresso, forçando legisladores a cancelar uma sessão destinada a certificar a vitória de Biden e fazendo com que congressistas de ambos os partidos deixassem o prédio.
Woodward e Costa obtiveram uma transcrição da chamada com Pelosi. "Que precauções existem para evitar que um presidente instável inicie hostilidades militares ou acesse os códigos de lançamento e ordene um ataque nuclear?", perguntou Pelosi. "Se eles não puderam nem mesmo impedi-lo de um ataque ao Capitólio, quem sabe o que mais ele pode fazer?", ela disse. "Ele é louco. Você sabe que ele é louco...e o que ele fez ontem é mais uma prova de sua loucura."
Milley respondeu que o sistema tem "muitas checagens" para evitar o comportamento extremo do presidente, acrescentando: "Concordo com a senhora em tudo."
Os legisladores republicanos rapidamente usaram os trechos do livro para atacar Milley, com o senador Marco Rubio pedindo que Biden demitisse o general.
Rubio, um defensor de Trump, alegou que Milley "trabalhou para minar ativamente o comandante em chefe das Forças Armadas dos Estados Unidos e forneceu um vazamento traiçoeiro de informações confidenciais para o Partido Comunista Chinês".
"Essas ações do general Milley demonstram uma clara falta de bom senso e peço que o demitam imediatamente", disse ele, em uma carta a Biden.
O general também temia que Trump pudesse dar um golpe de Estado após perder as eleições, de acordo com outro livro publicado em julho. Segundo a obra, escrita por dois jornalistas do The Washington Post, Milley chegou a dizer que, com suas mentiras sobre as eleições, Trump estava difundindo o "evangelho do Führer", em referência ao ditador nazista Adolf Hitler.
Milley foi nomeado por Trump em 2018 e mais tarde provocou a ira do presidente ao expressar arrependimento por participar de uma sessão fotográfica com o presidente em junho de 2020, depois que a forças federais esvaziaram um parque perto da Casa Branca, expulsando de forma violenta manifestantes pacíficos para que Trump pudesse fazer uma fotografia diante de uma igreja nas proximidades.
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General dos EUA alertou China sobre estado mental de Trump, diz livro - Instituto Humanitas Unisinos - IHU