Atual modelo tributário brasileiro beneficia o governo e empobrece os menos favorecidos. Entrevista especial com João Eloi Olenike

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Por: Patricia Fachin | 19 Março 2018

A opção do Estado brasileiro de tributar mais a renda do trabalhador, o consumo de bens e serviços, e menos o patrimônio pode ser explicada, segundo o presidente do Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação, João Eloi Olenike, “pela facilidade na arrecadação”, mas a decisão estatal, pondera, “influencia de modo negativo na distribuição de renda aos menos favorecidos”. Isso ocorre porque “a tributação no consumo é perversamente desigual, criando o que chamamos de Regressividade, ou seja, como todos pagam igualmente a carga, como consumidores finais, proporcionalmente os mais pobres acabam pagando mais”, diz Olenike na entrevista a seguir, concedida por e-mail à IHU On-Line. E adverte: “Estamos falando de uma distribuição de renda às avessas, que tira o poder dos mais necessitados e transfere aos mais abastados. Mudando isso, esse quadro também pode sofrer alteração, o que seria muito benéfico à população do país”.

Na avaliação de Olenike, uma reforma tributária deveria considerar “um modelo de tributação mínima sobre o consumo e maior sobre a renda, ganhos, lucros e patrimônio”, porque “o governo tem que incentivar a população e as empresas a terem resultados positivos, para depois, sim, proceder à tributação. Com menor tributação, teríamos mais contribuintes e a arrecadação não iria diminuir”, garante.

João Eloi Olenike (Foto: Sindishopping)

João Eloi Olenike é graduado em Ciências Contábeis pela Faculdade de Administração e Economia – FAE, em Direito pela Faculdade de Direito de Curitiba e pós-graduado em Administração Financeira pela FAE.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Quando se trata de repensar a tributação no Brasil, quais são os pontos fundamentais que não podem ficar de fora de uma reforma tributária?

João Eloi Olenike – São os seguintes: diminuição do número de tributos; desconcentração da tributação sobre o consumo; menores alíquotas dos tributos; aumento da base de arrecadação; mais tributação sobre ganhos, renda e patrimônio e menos incidência sobre consumo; e inserção do imposto sobre grandes fortunas.

IHU On-Line – Por que no Brasil o Estado fez a opção de tributar a renda e não o patrimônio e a riqueza? Quais são as consequências sociais dessa opção?

João Eloi Olenike – O Estado fez a opção de se tributar o consumo e menos a renda e o patrimônio. Isso se deu pela facilidade na arrecadação, mas influencia de modo negativo na distribuição de renda aos menos favorecidos.

IHU On-Line – Alguns especialistas em tributação têm chamado atenção para os equívocos existentes na tributação da renda de um trabalhador que segue o regime da CLT e de um trabalhador que atua como pessoa jurídica – PJ, porque os últimos pagam menos imposto do que os primeiros. Uma das consequências disso é que o PJ também contribui menos para a Previdência Social. Como resolver esse tipo de problema referente à tributação dessas rendas?

João Eloi Olenike – É só o governo diminuir a tributação da pessoa física e deixá-la com a mesma carga da pessoa jurídica.

IHU On-Line – Uma das questões que sempre aparece na discussão sobre a reforma tributária é o alto percentual de impostos que se paga via tributação indireta de bens e serviços. Por que, diferente de outros países, o Brasil não tem uma tributação mais baixa sobre bens e serviços?

João Eloi Olenike – Porque foi uma opção do governo ao instituir o nosso Sistema Tributário, em virtude da facilidade de arrecadação de tributos, dessa forma.

IHU On-Line – Como uma mudança na tributação de bens e serviços poderia contribuir para a redução das desigualdades sociais?

João Eloi Olenike – A tributação no consumo é perversamente desigual, criando o que chamamos de Regressividade, ou seja, como todos pagam igualmente a carga, como consumidores finais, proporcionalmente os mais pobres acabam pagando mais. Estamos falando de uma distribuição de renda às avessas, que tira o poder dos mais necessitados e transfere aos mais abastados. Mudando isso, esse quadro também pode sofrer alteração, o que seria muito benéfico à população do país.

IHU On-Line – Recentemente o Estadão fez um levantamento a partir de dados da Receita Federal e apontou que quase um terço da renda de alguns setores do funcionalismo público, como membros do Judiciário, Ministério Público e Tribunais de Contas, está isento de Imposto de Renda da Pessoa Física – IRPF, como auxílio moradia, ajuda de custos, etc. Por que isso acontece? Dado que esses benefícios não são contabilizados como renda, há algum problema em eles não serem tributados? Ou, de outro lado, é possível questionar a não tributação desses benefícios? Ainda sobre essa questão, quais são as consequências sociais dessas isenções?

João Eloi Olenike – A maioria desses benefícios são considerados isentos pela legislação do Imposto de Renda. Se o governo resolver tributar, teria que mudar a lei. As consequências sociais se dão pelo fato de que as isenções, ao nosso modo de ver, deveriam ser destinadas à camada mais pobre da população, e não, por puro corporativismo, destinada a uma parcela mais abastada da população.

IHU On-Line – Quais são, na sua avaliação, as principais distorções geradas pelo sistema tributário brasileiro atual?

João Eloi Olenike – Penalização tributária dos mais pobres, distribuição de renda ao contrário, interferência no crescimento econômico, alto preço dos produtos, mercadorias e serviços ao consumidor final e falta de competitividade dos nossos preços em relação aos outros países (perda de mercado).

IHU On-Line – Qual é o impacto do atual modelo tributário para os diferentes estratos sociais, especialmente para os pobres e a classe média?

João Eloi Olenike – O impacto é de que enquanto os menos favorecidos e a classe média ficam cada vez mais pobres, os mais abastados ficam cada vez mais ricos.

IHU On-Line – O que seria um modelo tributário eficiente para as necessidades do Brasil de hoje?

João Eloi Olenike – Seria um modelo de tributação mínima sobre o consumo e maior sobre a renda, ganhos, lucros e patrimônio. O governo tem que incentivar a população e as empresas a terem resultados positivos, para depois, sim, proceder à tributação. Com menor tributação, teríamos mais contribuintes e a arrecadação não iria diminuir.

IHU On-Line – Em artigo recente o senhor comentou sobre a necessidade que as empresas brasileiras têm de se manterem atualizadas sobre tributação, por conta das obrigações acessórias que elas devem cumprir. Uma das mais novas obrigações que as empresas estão cumprindo é o eSocial. Qual é a sua avaliação do eSocial? Quais são suas vantagens e desvantagens?

João Eloi Olenike – Entendemos que as obrigações acessórias são importantes, mas não necessitam ser em tão grande número. O eSocial vai suprir uma lacuna sobre a concentração das informações sociais e trabalhistas. Só que o governo deve acabar com outras obrigações acessórias nessa área para o contribuinte não ter que informar os dados em duplicidade. Há que se fazer um estudo geral dessas obrigações e eliminar uma série delas, que não têm mais sentido de existir.

IHU On-Line – Por que é tão difícil fazer uma reforma tributária no Brasil e avançar nessa discussão?

João Eloi Olenike – Simplesmente porque o modelo atual traz facilidade para o governo, na arrecadação de tributos, então não há e não haverá vontade política para a implantação de mudanças no Sistema Tributário Nacional.

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