Escravidão moderna e mudanças climáticas: o compromisso das cidades e de seus prefeitos

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23 Julho 2015

Publicamos aqui a íntegra da declaração conjunta "Escravidão moderna e mudanças climáticas: o compromisso das cidades", assinada por diversos prefeitos do mundo inteiro, incluindo diversos representantes brasileiros, no encontro realizado no Vaticano, nos dias 21 e 22 de julho, na presença do Papa Francisco.

Do Brasil participam os prefeitos de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Salvador, Curitiba, Porto Alegre e Goiânia.

Junto com sua assinatura, o pontífice deixou a seguinte mensagem em espanhol: "Agradeço esta declaração. Desejo que faça muito bem" (veja imagem acima). Confira as assinaturas originais no documento disponibilizado pela Santa Sé, aqui.

A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.
 
Nós, abaixo-assinados, nos reunimos aqui, na Academia Pontifícia das Ciências e na Academia Pontifícia das Ciências Sociais, com o objetivo de abordar duas dramáticas emergências correlacionadas: as mudanças climáticas induzidas pelo ser humano e a exclusão social nas formas extremas de radical pobreza, da escravidão moderna e do tráfico de pessoas.

Chegamos até aqui de diversos âmbitos e diferentes culturas e, assim, somos o fiel reflexo do desejo, compartilhado por toda a humanidade, de paz, felicidade, prosperidade, justiça e sustentabilidade ambiental. Seguindo o que afirma a encíclica Laudato si', consideramos a esmagadora evidência científica que confirma a existência de uma mudança climática provocada pelo ser humano, assim como a perda de biodiversidade e a vulnerabilidade dos mais pobres aos desastres econômicos, sociais e ambientais.

Diante das urgências representadas pelas mudanças climáticas antropogênicas, a exclusão social e a pobreza extrema, é nossa intenção declarar o seguinte, fruto do nosso consenso.

As mudanças climáticas antropogênicas são uma realidade cientificamente comprovada, e o seu controle efetivo é um imperativo moral que atinge toda a humanidade.

Neste fundamental espaço moral, as cidades de todo o planeta cumprem um papel-chave. Todas as nossas tradições culturais afirmam a inerente dignidade e a responsabilidade social de cada indivíduo em sua relação com o bem comum de toda a humanidade. Elas proclamam a beleza e a maravilha do mundo natural, assim como a sua inerente bondade, e a valorizam como um dom precioso que foi confiado ao nosso cuidado comum; por isso, é nosso dever moral respeitar, e nunca devastar, este jardim que é a nossa "casa comum".

Os pobres e os excluídos, embora participem minimamente na disrupção do clima, estão expostos a temíveis ameaças por causa de perturbações climáticas antropogênicas, tais como a maior frequência de secas, tempestades extremas, ondas de calor e o aumento incessante do nível do mar.

Hoje, a humanidade conta com os instrumentos tecnológicos, os meios financeiros e o conhecimento adequado para reverter as mudanças climáticas antrópicas, pondo fim, ao mesmo tempo, à pobreza extrema, mediante a aplicação de soluções relativas ao desenvolvimento sustentável, tais como a adoção de sistemas de baixo carbono, com o respaldo das tecnologias da informação e da comunicação.

O financiamento das iniciativas em prol do desenvolvimento sustentável, tais como as destinadas a manter um efetivo controle das mudanças climáticas antropogênicas, deve ser impulsionado por incentivos que ajudem na transição para energias de baixo carbono e renováveis, e deve incorporar a busca incansável da paz, o que permitirá que os orçamentos dos governos passem a priorizar os investimentos na sustentabilidade, que tanto fazem falta, em detrimento dos gastos bélicos.

O mundo deve saber que a cúpula sobre as mudanças climáticas, que será realizada em Paris no fim deste ano (COP 21), pode ser a última oportunidade efetiva de negociar acordos para manter o aquecimento antropogênico abaixo dos 2ºC e para apontar, para uma maior segurança, a que se mantenha o clima do planeta bem abaixo desse limiar. No entanto, se continuar a trajetória atual, a humanidade poderia facilmente alcançar a devastadora cifra de 4ºC ou mais.

Os líderes políticos de todos os Estados-membros da ONU têm a especial responsabilidade de concordar, no marco da COP 21, um ousado acordo em prol do clima que limite o aquecimento do planeta a um nível seguro para a humanidade e que proteja os mais pobres e vulneráveis das mudanças climáticas ininterruptas, que coloca as suas vidas em grave perigo. Tal como prometeram, os países com altos níveis de renda devem ajudar a financiar os custos da mitigação das mudanças climáticas nas nações mais necessitadas.

Para reverter as mudanças climáticas antrópicas, será necessária uma rápida transformação que faça do nosso habitat um mundo impulsionado por energias de baixo carbono – entre elas as renováveis – e fundado na gestão sustentável dos ecossistemas. Tais transformações deverão ser realizadas no marco dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que, concordados em nível mundial, terão como objetivo pôr fim à pobreza extrema; garantir o acesso universal à saúde, à educação de qualidade, à água potável e à energia sustentável; e fomentar a cooperação para erradicar o tráfico de pessoas e todas as formas modernas de escravidão.

Como prefeitos, comprometemo-nos a reforçar em nossas cidades e assentamentos urbanos a capacidade de resiliência dos pobres e daqueles que estão em situação de vulnerabilidade, e reduzir a sua exposição aos eventos extremos relacionados com o clima e outros impactos e catástrofes econômicas, sociais e ambientais, que fomentam o tráfico de pessoas e os riscos da migração forçada.

Outrossim, comprometemo-nos a acabar com o abuso, a exploração, o tráfico de pessoas e todas as formas de escravidão moderna, que são crimes de lesa humanidade, incluindo o trabalho forçado e a prostituição, o tráfico de órgãos e a escravidão doméstica.

Também nos comprometemos a desenvolver programas nacionais de reassentamento e reintegração que evitem a repatriação involuntária das pessoas vítimas de tráfico (cf. a revisão dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, n. 16.2, realizada pela PASS).

Queremos que as nossas cidades e assentamentos urbanos sejam cada vez mais socialmente inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis (cf. Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, n. 11).

Todos os setores e todas as partes interessadas deverão desempenhar o papel que lhes corresponde: esse é um compromisso a que cada um de nós se soma plenamente, seja como prefeitos, seja como pessoas.

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