ONU anuncia queda da pobreza e sociedade civil desconfia

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11 Julho 2014

O prazo para cumprir os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) vence em dezembro de 2015, dentro de 17 meses, mas a Organização das Nações Unidas (ONU) já está anunciando seus limitados êxitos, embora com cautela em seu otimismo. “A pobreza no mundo caiu pela metade, cinco anos antes do prazo de 2015”, diz o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, no último informe de situação dos ODM divulgado no dia 7.

A reportagem é de Thalif Deen, publicada por Envolverde/IPS, 09-07-2014.

Em 1990, quase metade da população do Sul em desenvolvimento vivia com menos de US$ 1,25 por dia. “Essa taxa caiu para 22% em 2010, o que reduziu o número de pessoas vivendo na extrema pobreza a 700 milhões”, segundo o informe de 56 páginas sobre os oito objetivos de desenvolvimento humano fixados por 189 países no contexto da ONU, em setembro de 2000.
O primeiro ODM é erradicar a pobreza extrema e a fome até o final de 2015. A imensa maioria das pessoas que vivem na extrema pobreza pertence a duas regiões: Ásia meridional e África subsaariana, diz o documento. Porém, algumas organizações não governamentais que acompanham de perto os indicadores socioeconômicos no Sul em desenvolvimento desconfiam desses avanços.

Roberto Bissio, diretor da Social Watch, com sede no Uruguai, disse à IPS que a média mundial comemorada pela ONU se deve quase exclusivamente à China, e que a maior parte da redução da pobreza nesse país aconteceu antes de 2000. “Assim, atribui-se resultados aos ODM que ocorreram antes da existência dos objetivos como tal”, ressaltou. “Isto se deve ao fato de o objetivo ser definido como a redução pela metade da linha de pobreza mundial tendo 1990 como referência, não a de 2000 como implica a Declaração do Milênio ao falar em presente”, explicou.

O informe da ONU destaca maior acesso a fontes de água potável, melhoria nas condições de vida dos habitantes de assentamentos precários e a igualdade de gênero alcançada no ensino primário. “Se a tendência continuar o mundo superará as metas dos ODM para malária, tuberculose e acesso ao tratamento contra HIV (vírus causador da aids), enquanto o objetivo referente à fome parece estar próximo”, continua o documento.

Outros temas dentro dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), como acesso às tecnologias, redução das tarifas alfandegárias médias, alívio da dívida externa e crescente participação política das mulheres “mostram um grande progresso”, acrescenta o informe. Nos últimos 20 anos, a probabilidade de uma criança morrer antes de completar cinco anos caiu quase pela metade. Isso significa que a cada dia são salvos 17 mil meninos e meninas, segundo a ONU.

Yoke Ling Chee, da Rede do Terceiro Mundo, com sede na Malásia, disse à IPS que o informe sobre os ODM é “muito otimista” e evita os obstáculos sistêmicos que continuam privando grande parte do mundo de seu direito ao desenvolvimento. “Um mecanismo muito necessário de acordo ordenado da dívida soberana continua sendo rejeitado pelos países ricos, e vemos a Argentina à beira de outra crise por causa da cobiça dos “fundos abutre”, pontuou Chee em referência à sentença de um juiz norte-americano que obriga Buenos Aires a pagar aos seus credores até US$ 15 bilhões no curto prazo.

Todo sucesso alcançado nas últimas duas décadas pode ser anulado se não forem abordadas as barreiras estruturais, alertou a ativista. “Lamentavelmente, a tendência do escritório do secretário-geral da ONU, e de muitos países industrializados, é depositar sua confiança nas empresas privadas e nas ‘associações multilaterais’ que passam por cima dos enormes problemas causados por muitas corporações”, ressaltou Chee.

“A votação do dia 26 de junho no Conselho de Direitos Humanos para iniciar o processo para um tratado que regule as empresas transnacionais é um claro sinal de que se vamos fazer com que o desenvolvimento seja uma realidade, as empresas não podem ser as encarregadas”, acrescentou Chee.

Em comunicado divulgado no dia 7, a organização WaterAid, com sede em Londres, diz que o informe da ONU é a recordação de uma terrível verdade: que ainda há 2,5 bilhões de pessoas no mundo sem acesso a serviços básicos de saneamento. Deste total, mais de um bilhão vivem na Ásia meridional e 644 milhões na África subsaariana. “Não contar com esse direito compromete a saúde, a segurança e a dignidade de milhares de milhões de pessoas”, afirmou Fleur Anderson, diretora de campanhas da WaterAid.

Na medida em que a ONU elabora um conjunto renovado de objetivos de desenvolvimento, é fundamental que o saneamento seja uma prioridade central, afirmam ativistas. Pela primeira vez na história, o acesso universal à água potável e ao saneamento básico “está ao nosso alcance”, pontuou Anderson. “Mas é preciso vontade política e dedicação para consegui-lo. Sem esses elementos básicos não existe uma forma eficaz de lutar contra a pobreza extrema”, destacou.

Bissio disse à IPS que, ao concentrar a atenção na extrema pobreza, os países industrializados descansaram e não sentem que precisam informar sobre seus próprios indicadores em casa. A pobreza nos países desenvolvidos é ignorada, bem como as desigualdades em todas as partes. Este é o principal obstáculo para o crescimento econômico agora, reconhecido inclusive pelo Fundo Monetário Internacional, ressaltou.

O informe da ONU também indica que, após dois anos de queda, a assistência oficial ao desenvolvimento atingiu o recorde de US$ 134,8 bilhões em 2013. “Entretanto, a ajuda se afastou dos países mais pobres, onde os avanços nos ODM frequentemente ficam mais atrasados”, acrescenta o documento.

Das exportações dos países em desenvolvimento, 80% entraram nos países industrializados livres de impostos, e as tarifas alfandegárias se mantiveram em um mínimo histórico. A carga da dívida dos países em desenvolvimento se manteve estável em torno de 3% da renda com exportações, o que representou uma queda perto de 75% desde 2000, segundo a ONU.

A grande quantidade de demandas judiciais que empresas transnacionais apresentaram contra leis ambientais e sanitárias de países em desenvolvimento, invocando direitos corporativos em virtude de acordos bilaterais de investimento, tiram milhares de milhões de dólares desses governos, apontou Chee.

A ativista acrescentou que os países em desenvolvimento que cresceram mas continuam com grandes dificuldades são excluídos dos compromissos dos países industrializados para proporcionar financiamento climático, assegurar o acesso a medicamentos de baixo custo e transferir tecnologias para o desenvolvimento sustentável. “Isto ocorre porque países como China e Índia são considerados como ‘competidores’ dos Estados Unidos, ressaltou.

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