Jesus e a ética da esperança para os homens de boa vontade

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25 Março 2012

O que resta hoje dos ensinamentos de Jesus? Da sua indignação, da sua caridade, do sacrifício? E onde está, no mundo, a compreensão, a amizade? Mas, acima de tudo, onde está o ser humano? Perguntas pesadas como rochas que são propostas por um livro denso e forte, e que também se referem ao caso italiano, com as muitas distorções da justiça, da ineficiência, da obscuridade em nível institucional.

A reportagem é de Marco Ansaldo, publicada no jornal La Repubblica, 22-03-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Um alto prelado e um escritor atento aos temas da religião se puseram a caminha levando essas interrogações. E o fizeram em Jerusalém, cidade embebida por fés diversas (cujos habitantes, dizia Arthur Koestler, o autor de O Zero e o Infinito, "estão intoxicados pela religião"), em uma peregrinação bem pensada aos lugares da Paixão.

Vincenzo Paglia, bispo de Terni, conselheiro principal da Comunidade de Santo Egídio e desde sempre comprometido com uma atividade diplomática voltada à conquista da paz, e Franco Scaglia, de Camogli, homem do mar e autor de romances de sorte, optaram por dialogar na única cidade do mundo onde a espiritualidade está em movimento contínuo. Um lugar metade de peregrinos e metade de grandes escritores, de Chateaubriand a Disraeli, de Gogol a Flaubert, de Melville a Mark Twain.

E nesse Cercando Gesù [Buscando Jesus], com o subtítulo "Em um mundo cada vez mais confuso ainda somos capazes de amar?" (Ed. Piemme), continuação ideal do seu livro anterior In cerca dell'anima [Em busca da alma], vencedor do Prêmio Hemingway, tentaram juntos uma exploração da figura do profeta de Nazaré, ancorando-a na necessidade de uma nova aliança com o ser humano.

Mas se os dois autores, no seu primeiro trabalho, ilustravam o risco de uma paralisia, da inércia moral e espiritual do mundo (e acima de tudo da Itália), aqui eles mudam de passo. E Jerusalém, emblema das divisões entre os seres humanos, se torna o centro do seu colóquio, "em uma realidade contemporânea – explica Scaglia usando palavras duras – que nos atinge pela sua inércia e injustiça, e sempre pela sua sordidez".

A escolha de Jerusalém, cidade em guerra consigo mesma, não é casual. Tê-la sob seus pés, percorrê-la, acariciar as suas pedras, significa deparar-se todos os dias com a memória do passado. Portanto, a pergunta sobre Jesus, diz Paglia, "é central também para o ser humano contemporâneo. Há uma dimensão que ainda inquieta e interroga para além da simples fenomenologia histórica". Uma altura moral que o bispo, em várias passagens, lembra ter enfrentado em um diálogo com Eugenio Scalfari.

Nesse contexto, o artifício de fazer Jesus percorrer novamente a Via Dolorosa partindo do fim, do Gólgota, torna-se a tentativa de passar por todas as "vias dolorosas" de hoje, porque somente atravessando-as é possível projetar um futuro melhor. E a peregrinação continua, estação por estação, mas não sem ter analisado as últimas sete palavras pronunciadas por Jesus na cruz. Palavras que podem ser reinterpretados na atualidade: das revoltas dos países árabes à forma como conciliar ética e negócios.

Assim, tornam-se fulgurantes as páginas que descrevem a coroa de espinhos posta sobre a cabeça de Jesus, comparada com o arame farpado que ainda hoje, apesar do progresso e da tecnologia cada vez mais avançada, resiste na sua brutal eficácia marcando "as fronteiras e os campos de batalha" . E poderosa é a imagem de Jesus de costas, em que o que conta não é o rosto, mas sim a figura precisamente, as costas que suportam o sofrimento e a redenção do mundo.

Paglia e Scaglia tentam uma visão do futuro para um desenvolvimento que não seja meramente econômico. E, nas raízes do cristianismo, identificam a força de um coenvolvimento oferecido a todas as pessoas de "boa vontade". Assim, na última parte, escrita quatro mãos, eles apresentam propostas concretas, identificando três palavras de ordem: integridade da Criação, perdão, gratuidade.

O que pode ajudar, defendem, é a imagem da Arca de Noé, posto como símbolo da nova Aliança de Deus com o ser humano. E, sob essa imagem, percorre um elenco de ideias concretas, para "se preparar para os desafios que a vida nos apresenta" e "suportar a dor e as adversidades sem se lamentar".

Ao exemplo italiano são são dedicadas linhas amargas, mas cheias de esperança: "Em um país onde a inércia parece bloquear os ânimos, é urgente ter um sonho que aqueça os corações, que abra as mãos, que mova de maneira coletiva para um novo futuro. Só uma nova visão pode desfazer o nó profundo da crise de hoje".

Mas a ética sozinha não basta. Norberto Bobbio chegou a sustentar, para a sobrevivência da democracia, a indispensabilidade da religião. E, do alto do seu magistério, o cardeal Martini alertou que "um homem não é mudado por força de prescrições éticas!". O ser humano hoje sofre por falta de visão. Invadido por luzes demais, tentou se fechar em si mesmo. Porque o futuro não se realiza apenas com a ciência. Há necessidade de profundidade e de reunir as muitas diversidades com o fim de um destino único.

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