20 Junho 2017
Quando os acionistas da ExxonMobil votaram no final de maio substancialmente a favor de uma resolução para esclarecer os impactos de abordar as mudanças climáticas nos ativos de longo prazo da empresa de petróleo, a Irmã dominicana Patricia Daly estava entre as mais radiantes.
"Isso é maravilhoso", disse a diretora emérita da Coligação Tri-Estadual pelo Investimento Responsável, abrangendo Connecticut, Nova Jersey e Nova York.
A reportagem é de Brian Roewe, publicada por National Catholic Reporter, 13-06-2017. A tradução é de Luísa Flores Somavilla.
Através de grupos de investimento como a coalizão, que compreende 40 instituições católicas, e o ainda maior Interfaith Center on Corporate Responsibility (Centro Inter-religioso de Responsabilidade Corporativa), ela e outros investidores religiosos vem trabalhando há duas décadas para provocar mudanças na forma como a Exxon reconhece e responde às mudanças climáticas.
Na reunião anual da ExxonMobil em Dallas, em 31 de maio, a resolução de acionistas, registrada em conjunto com o Fundo Comum de Aposentadoria de Nova Iorque e a Igreja da Inglaterra, e aderida pelo Interfaith Center on Corporate Responsibility e 50 outras instituições que representam US$ 5 trilhões em ativos gerenciados, recebeu 62,3% dos votos dos acionistas - o maior percentual da Exxon em medidas relacionadas ao clima.
A resolução, à qual a Exxon se opôs, busca fazer com que a maior empresa de energia do mundo produza um relatório anual dos impactos a longo prazo das políticas climáticas globais sobre suas reservas de petróleo e gás, as quais tem o intuito de restringir o aumento médio da temperatura para abaixo de 2°C (3,6°F) e limitá-lo em 1,5°C - o principal objetivo do Acordo de Paris sobre mudanças climáticas, que exige cortes drásticos nas emissões de carbono e uma mudança global rumo a uma economia de carbono zero para atingir o objetivo de 2°C e evitar impactos climáticos ainda piores.
Tracey Rembert, diretora-assistente de investimentos católicos da Christian Brothers Investment Services, disse em um comunicado que, apesar de a Exxon continuar optando "por um futuro energético muito parecido com o passado", ou seja, altamente dependente de petróleo e gás, "nós queremos que ela esteja preparada e com os olhos bem abertos caso surja um mercado diferente e acreditamos que essa proposta é um trampolim para esse processo".
Propostas semelhantes também receberam apoio da maioria dos acionistas durante as votações do mês passado na Occidental Petroleum (67%) e na PPL Corporation (57,2%). Outras resoluções nas empresas de energia quase obtiveram o apoio da maioria, informou o Washington Post .
Uma votação acima de 50% em uma resolução de acionistas geralmente é considerada uma exigência de que a empresa e seu conselho tomem alguma atitude, disse o Interfaith Center on Corporate Responsibility em um comunicado.
"Ninguém ignora uma votação tão expressiva", disse Daly.
A votação ocorreu em meio a notícias generalizadas de que o presidente Donald Trump pretendia retirar os EUA do acordo climático de Paris, atitude de fato anunciada por ele no dia seguinte.
Patricia Daly, que participou da cúpula climática da COP21 em dezembro de 2015, que culminou no Acordo de Paris, disse que concordou com algumas análises que diziam que o voto dos acionistas da Exxon tinha mais importância do que a decisão de Trump - que não tem como entrar em vigor até novembro de 2020, embora em nível federal os EUA tenham indicado que a implementação da redução de emissões prometida no acordo de Paris será interrompida.
Parte do significado da votação da Exxon, segundo Daly, foi que as grandes empresas de investimento, várias das quais apoiavam a resolução, estão buscando cada vez mais divulgar, a partir das empresas do ramo, os riscos colocados pelos países participantes do acordo de Paris que estão tomando medidas políticas para reduzir a emissão de carbono, sendo a fonte primária a queima de combustíveis fósseis.
"Mesmo que os EUA saiam do acordo, eles ainda precisam atuar com integridade e alinhados aos outros objetivos do país", disse Daly.
Apesar do contexto político ao redor da decisão do presidente de deixar o acordo, o movimento dos acionistas foi uma grande conquista para Patricia Daly, Pe. Michael Crosby e outros do Interfaith Center on Corporate Responsibility que engajaram a ExxonMobil na questão das mudanças climáticas ao longo pelo menos dos últimos vinte anos.
"É uma conquista de muito tempo", disse Patricia.
As interações dos investidores inter-religiosos começaram antes da fusão da Exxon-Mobil em 1999. Dois anos antes, Crosby, um frade franciscano capuchinho, apresentou a primeira resolução pedindo um relatório dos impactos das mudanças climáticas sobre as políticas e práticas da empresa, incluindo passivos que possam incorrer e o que poderia ser feito para reduzir as emissões de carbono dos combustíveis fósseis.
A partir daí, as resoluções do centro inter-religioso tentaram fazer com que a ExxonMobil divulgasse suas emissões de gases de efeito estufa; os fundos gastos em lobby e para apoiar as organizações na liderança da negação das questões climáticas, para que denunciasse os riscos climáticos aos seus negócios e reportasse investimentos em energia renovável.
Esses esforços renderam alguns resultados positivos. A Exxon compartilhou informações sobre seus investimentos em energias renováveis, que continua fazendo todos os dias, apesar de a maioria das iniciativas ainda se basearem em petróleo e gás no momento do pedido inicial.
No início deste ano, Crosby, que é diretor executivo da Sétima Geração da Interfaith Coalition for Responsible Investment, retirou uma resolução - originalmente emitida três anos antes, buscando uma pessoa com conhecimentos em mudança climática para participar do conselho de administração da Exxon - depois que a cientista climática Susan Avery foi nomeada para o conselho.
O sucesso da Exxon e de outras empresas em questões como o tráfico de seres humanos reforça para Patricia os méritos da pressão dos acionistas por mudanças positivas nas empresas, especialmente quando grupos ambientais, como vários esforços religiosos e católicos, têm pressionado por um amplo desinvestimento nos combustíveis fósseis.
Até agora, 27 instituições católicas pararam de investir em combustíveis fósseis, entre elas mais de doze comunidades religiosas. Vinte dos anúncios que vieram nos últimos dois anos chegaram através de uma campanha do Global Catholic Climate Movement. Além disso, a Universidade de Dayton e a Universidade de Georgetown retiraram doações de combustíveis fósseis de alguma forma.
Ainda que Patricia Daly credite o movimento de desinvestimento ao conhecimento sobre as mudanças climáticas, ela não endossa esse processo, pois acredita que tirar a economia global da dependência de combustíveis emissores de gases de efeito estufa requer mais esforço: "não se modifica empresas nem sistemas econômicos deste país ou do mundo abrindo mão de seu lugar nas decisões".
"Há muitas pessoas que lavam suas mãos, chamam isso de vitória e conseguem colocar a cabeça no travesseiro, e você sabe que eles não fizeram nada para criar um mundo sem emissões de gases de efeito estufa", acrescentou ela.
Ao contrário, a veterana que há quatro décadas atua na responsabilidade corporativa encoraja as pessoas a se tornarem acionistas ativos e informados e se envolverem em grupos de investimentos em defesa de mudanças socialmente responsáveis, como o Interfaith Center on Corporate Responsibility.
"Imagine o que aconteceria se as pessoas começassem a realmente se envolver de maneira ativa nas empresas que possuem. A administração e o conselho de diretores não têm essas empresas - nós temos", disse ela.
Embora se diga amplamente que o desinvestimento contribuiu para o fim do apartheid na África do Sul, em sua formação em 1971, o Interfaith Center on Corporate Responsibility procurou usar a pressão dos acionistas para que as empresas de serviços críticos saíssem do país enquanto o sistema opressivo não fosse abolido.
Participar de uma empresa não significa ignorar suas falhas e problemas, explicou Patricia.
O The Exxon Knew reports - relatórios que detalham que a Exxon sabia dos riscos das mudanças climáticas no início dos anos 70, mas sonegou a informação de seus acionistas e grupos financeiros, causando negação sobre o assunto, alegações "completamente rejeitadas" pela empresa - tem causado "conversas honestas e tensas" e continua sendo uma preocupação constante, afirmou a irmã dominicana.
Ela acrescentou que estava feliz que as ações judiciais dos procuradores-gerais de Nova York e Massachusetts e uma investigação da Securities and Exchange Commission (Comissão de Valores Mobiliários) dos EUA continuam avançando. Na opinião de Patricia, o papel da empresa em distorcer e atrasar ações a respeito das mudanças climáticas "só as coloca em uma posição de maior responsabilidade em liderar iniciativas e investimentos diferentes para reverter essas alterações no clima".
Os investidores religiosos continuam observando as mudanças da Exxon sob nova direção, de Darren Woods, que sucedeu Rex Tillerson depois que Rex foi nomeado secretário de Estado dos EUA. Patricia organizou um telefonema para que os acionistas agradecessem à empresa pelas cartas escritas, como a carta de Darren Woods para Trump pedindo que ele mantivesse os EUA no Acordo de Paris.
O fato de Tillerson, que também defendeu a permanência no acordo, ter se ausentado do White House Rose Garden durante o anúncio de Trump da saída do acordo de Paris sinalizou para ela que ele ainda entende os riscos das mudanças climáticas. Daly não esquece a ironia de um homem que já fez parte da indústria do petróleo e ofereceu certo suporte à ação em prol do clima ser agora considerado uma espécie de aliado no assunto no atual contexto político, o que para ela simboliza o quão deliciosa a vida pode ser.
"Eu nunca sonhei com um cenário desses, mas aqui estamos", disse ela.
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Acionistas da ExxonMobil pressionam por resolução sobre o clima - Instituto Humanitas Unisinos - IHU