06 Novembro 2025
O discurso do futuro prefeito de Nova York, filho de imigrantes socialistas, deve muito à influência política e ao trabalho intelectual de seus pais, assim como aconteceu no passado com outros líderes democratas.
Artigo de Bécquer Seguín, professor na Universidade Johns Hopkins e autor do ensaio The Op-Ed Novel (Harvard), publicado por El País, 06-11-2025.
Eis o artigo.
Zohran Mamdani, formado em Estudos Africanos e nascido em Kampala, capital de Uganda, há apenas 34 anos, será o próximo prefeito da cidade de Nova York. Ele alcançou a vitória com mais de 50% dos votos, uma conquista notável. E a prefeitura de Nova York que ele representará não é isenta de marcos históricos: ele será o primeiro muçulmano, o primeiro socialista e o mais jovem a ocupar o cargo em mais de um século. Mas, apesar dessas primazias, Mamdani também incorpora uma certa continuidade com um aspecto pouco discutido do Partido Democrata nos últimos anos. Assim como Barack Obama, Kamala Harris e Pete Buttigieg, Mamdani é filho de imigrantes socialistas.
O socialismo desses pais foi forjado durante as décadas revolucionárias de 1960 e 70. Durante a década de 1960, o pai de Obama ocupou um cargo de alto escalão no Ministério da Economia do Quênia, atuando como um socialista autocrítico dentro do projeto econômico defendido pelo carismático líder do Quênia independente, Tom Mboya. Quase na mesma época, mas em meio ao movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos, os pais de Harris se conheceram em um comício da Associação Afro-Americana. Ambos obtiveram doutorado: sua mãe em Endocrinologia, canalizando seu fervor político para o avanço da pesquisa sobre câncer de mama; seu pai em Economia, investigando até que ponto as políticas anticoloniais de sua Jamaica natal poderiam ser aplicadas ao seu país adotivo, os Estados Unidos.
Quanto ao pai de Buttigieg, ele se tornou o principal filólogo sobre a obra de Antonio Gramsci. Mesmo em 2018, quando o encontrei pela primeira e última vez, seu conjunto de referências para entender a política atual ainda era a Itália de Pasolini, o autonomismo e os protestos na fábrica da Fiat.
Os pais de Mamdani compartilham uma trajetória política semelhante. Seu pai, ugandense como ele, chegou aos Estados Unidos em 1963 com uma bolsa de estudos para estudantes da África Oriental. Enquanto estudante, participou de viagens Norte-Sul organizadas pelo Comitê Coordenador Estudantil Não Violento (SNCC). Mais tarde, canalizou esse ativismo para uma carreira acadêmica focada na análise do colonialismo, do pós-colonialismo e das minorias na África.
Sua mãe, nascida na Índia, desenvolveu sua consciência política no teatro de rua de Delhi. Ao chegar aos Estados Unidos como estudante, tornou-se cineasta, dirigindo filmes que desafiavam sutilmente os preconceitos de Hollywood: roteiros filmados em bairros operários no exterior, comédias românticas ambientadas em contextos políticos históricos e elencos totalmente brancos.
Ao contrário de outros democratas com pais socialistas, Mamdani não tentou se distanciar do legado de sua família. Cada movimento seu alude à política familiar. Seu ativismo contra o cerco de Gaza — cuja importância para sua carreira política foi comparada à oposição à Guerra do Iraque para a de Obama — caminha lado a lado com a crítica anticolonial de seu pai. Suas propostas para creches gratuitas, congelamento de aluguéis e supermercados municipais ecoam as muitas tensões domésticas sobre dinheiro que aparecem em filmes como "Salaam Bombay!", "Mississippi Masala", "Monsoon Wedding" e outros dirigidos por sua mãe.
Para os detratores, tudo isso soará como um romance de Houellebecq: um jovem político muçulmano carismático, um cavalo de Troia enganando eleitores bem-intencionados, uma sociedade caminhando involuntariamente para o declínio. Mas, na realidade, o que isso anuncia é uma tentativa de criar uma nova coalizão que une jovens, imigrantes, trabalhadores, devedores, muçulmanos, estudantes, inquilinos e pais: uma coalizão multicolorida que não deixa ninguém para trás. Exceto os bilionários.
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