27 Setembro 2025
Apesar das melhores taxas de sobrevivência nos países mais ricos, aqueles com rendas mais baixas também estão enfrentando taxas de mortalidade cada vez mais altas, sem ter conseguido reduzir a mortalidade, de acordo com uma análise publicada na The Lancet, que destaca as profundas desigualdades no mundo.
A reportagem é de Sofia Peréz Mendoza, publicada por El Diario, 25-09-2025.
A pesquisa sobre novos tratamentos para o câncer está em uma corrida constante contra o tempo. Os casos estão aumentando rapidamente em todo o mundo — 105% desde 1990 — e, embora as taxas de sobrevivência tenham melhorado, mais de 10 milhões de pessoas morrerão da doença em 2023, 74% a mais do que no início da década de 1990, de acordo com uma análise publicada na revista Lancet, que mede a evolução da pandemia e projeta o que acontecerá nos próximos 25 anos.
As previsões são alarmantes, com um aumento tanto nos diagnósticos — 61%, para 30,5 milhões até 2050 — quanto nas mortes. Estima-se que 18,6 milhões de pessoas morram desta doença, um número que representa um aumento de 75%, se "não houver medidas urgentes e financiamento específico", afirmam os autores. Dois terços dessas mortes ocorreriam em países menos desenvolvidos.
75% mais mortes por câncer no mundo até 2050
Número de casos de câncer, mortes e taxa de incidência desde 1990, 2023 e a previsão para 2050. Taxa de incidência e mortalidade ajustada por idade por 100 mil habitantes

A incidência de câncer ajustada por idade é usada entre populações com diferentes estruturas etárias para permitir comparações. (Fonte: The Lancet/El Diario)
A taxa global de mortalidade por câncer, apesar do aumento nos diagnósticos, caiu de 151 para 115 casos por 100 mil habitantes entre 1990 e 2023. Mas, à medida que a taxa de incidência aumenta — mais pessoas são afetadas —, também há mais mortes. A ponto de a porcentagem de mortes aumentar mais do que a de casos até 2050. Como isso pode ser explicado?
As projeções devem ser analisadas com cautela porque, além de não disporem de dados precisos para todos os países, são influenciadas por diversos fatores. De fato, "quando as taxas globais de casos e mortalidade são ajustadas para levar em conta as diferenças etárias", esse aumento desaparece, apontam os pesquisadores, sugerindo que o aumento se deve principalmente ao envelhecimento populacional — o principal fator de risco inevitável — e ao crescimento populacional.
"Essas estimativas são baseadas em projeções demográficas que não levam em conta mudanças nos fatores de risco ou tratamentos, mas é uma metodologia confiável e reconhecida internacionalmente", afirma Josep M. Borràs, coordenador científico da Estratégia de Câncer do Sistema Nacional de Saúde e diretor do Plano Catalão de Oncologia, ao Science Media Centre Spain.
As lacunas entre os países
As enormes desigualdades entre países ricos e pobres também são fundamentais para a compreensão do panorama global, como pode ser observado no gráfico abaixo. A taxa de mortalidade caiu 24% em todo o mundo entre 1990 e 2023, mas impulsionada apenas pelos Estados mais privilegiados. Nos países de menor renda, aumentou entre 24% e 29%, "destacando o crescimento desproporcional que ocorre nos contextos mais pobres", afirmam os autores.
Em quais países a mortalidade diminuiu ou aumentou?
Diferença pontual na taxa de mortalidade ajustada por idade em 2023 em comparação com 1990 e diferença pontual na incidência ajustada por idade em 2023 em comparação com 1990. Cada bolha é um país, seu tamanho representa a população e a cor indica se a mortalidade está aumentando ou diminuindo.

A incidência de câncer ajustada por idade é usada entre populações com diferentes estruturas etárias para permitir comparações. (Fonte: The Lancet/El Diario)
A lista de lugares nessa situação ainda é muito longa: Índia, Etiópia, República Democrática do Congo, Bolívia, Egito, Paraguai... O Líbano se destaca especialmente por ser o território do mundo com maior aumento, tanto em incidência (de 89,1 para 233,5 casos por 100 mil habitantes) quanto em mortalidade (de 65 para 173).
“Nosso estudo prevê que o crescimento será desproporcional em países com recursos limitados”, alerta a autora principal, Dra. Lisa Force, do Instituto de Métricas e Avaliação em Saúde (IHME) da Universidade de Washington. Apesar da urgência, “as políticas de controle do câncer e sua implementação continuam sendo uma baixa prioridade na saúde global e, em muitos cenários, não há financiamento suficiente para enfrentar esse desafio”, acrescenta.
"Países com baixos níveis de desenvolvimento enfrentarão o desafio do câncer quando ainda tiverem outras doenças infecciosas como principal problema de saúde. É um desafio muito complexo de gerenciar", diz Borràs.
De acordo com os dados compilados pelo estudo, a Espanha está entre os países com maior número de casos de câncer desde 1990 (4%), mas que alcançaram uma redução significativa na mortalidade: quase 28%. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável visam reduzir a mortalidade prematura por doenças crônicas não transmissíveis, incluindo o câncer, em um terço até 2030. Esse número é muito mais alcançável para alguns países do que para outros.
É assim que a incidência de câncer mudou desde 1990
Taxas de incidência e mortalidade ajustadas por idade em cada país para 2023 e crescimento percentual em comparação com 1990 em cada variável.

Primeira parte do gráfico. (Fonte: The Lancet/El Diario)

Última parte do gráfico. (Fonte: The Lancet/El Diario)
Em relação aos tipos de câncer, o câncer de mama foi o câncer mais diagnosticado no mundo em 2023, enquanto o câncer de traqueia, brônquios e pulmão causaram o maior número de mortes.
Quase metade são evitáveis
Mais de quatro milhões das mortes ocorridas em 2023 (42% do total) estavam relacionadas a fatores de risco evitáveis: tabaco, alimentação pouco saudável, consumo de álcool, riscos ocupacionais, poluição do ar, obesidade, sexo inseguro e alto nível de açúcar no sangue.
O tabaco é a principal causa dessas mortes em todos os países, exceto naqueles com rendas mais baixas, onde o sexo desprotegido é a causa mais letal, respondendo por 12,5% das mortes.
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