29 Abril 2025
"O Nunc dimittis continua com a afirmação 'pois os meus olhos agora viram a tua salvação' e, por isso, continuo a me perguntar o que Francisco pode ter visto, ouvido, entendido daquele intenso momento de despedida, precedido, com toda a probabilidade, de muita reflexão e oração: como continuará o tempo da salvação para esta igreja que me foi confiada, para estas pessoas que amei, para este mundo para o qual Cristo se revelou como luz para as nações (cf. Lc 2,32)?", escreve Marinella Perroni, biblista e professora emérita do Pontifício Ateneu Sant'Anselmo, de Roma, em artigo publicado por Il Regno, 24-04-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Aquela sua rápida e inesperada alta do hospital pressagiava que o tempo havia se encurtado, que a ciência médica não tinha mais nada a oferecer e que aquelas pouquíssimas palavras sussurradas haviam sido mais explícitas do que um infausto boletim médico. Eu gostaria que tivesse sido poupado à igreja o drama de vivenciar pela segunda vez a agonia afásica de seu pontífice televisionada ao vivo. Mas não foi assim, talvez permitindo que alguns alimentassem a ilusão de que Francisco poderia ter se recuperado: sempre se pensa assim quando não se quer perder alguém que se ama.
Eu me perguntei se aquele último passeio no papamóvel entre as dezenas de milhares de peregrinos que lotavam a praça se devia a uma pretensão do próprio Francisco, cuja proverbial obstinação não havia se enfraquecido nem mesmo após cinco semanas de hospitalização. Quando, dois dias depois, li que foi ele mesmo quem o quis, pareceu-me claro que o que o fez querer isso foi, muito mais do que teimosia, a consciência de uma última Páscoa a ser vivida com aquele povo que ele sentia compartilhar com seu Deus. Aqueles que cuidavam dele, por outro lado, entenderam que um papa que durante doze anos se dirigiu à igreja e ao mundo com os gestos além das palavras, tinha o direito de, no dia da Páscoa, fazer um gesto que o consagrasse mais uma vez como o “papa do/para/com o povo”. Aquele povo pelo qual, desde seu primeiro momento como bispo de Roma, ele quis ser abençoado antes mesmo de ser ele a abençoá-lo. E foi a última expressão de seu magistério ordinário.
Quando o papamóvel saiu do Arco do Sino, a sabedoria midiática do diretor de televisão evitou cuidadosamente filmar Francisco de frente, que havia se tornado, desde o dia de sua saudação da sacada do hospital, um homem de dores, um de quem os homens escondiam o rosto (cf. Is 53,3). Em vez disso, a câmera acompanhou aquele seu passeio enquadrando-o por trás, e a solicitude afetuosa de seu secretário, que chegou a fazer pequenas massagens em seu pescoço, carregou de calor e cor aquela imagem que, de outra forma, seria imóvel.
Tudo isso conseguiu libertar as últimas imagens de Francisco vivo entre nós da injusta condenação, para ele ainda mais do que para nós, à ostentação de um sofrimento e de uma agonia privados de sua autêntica humanidade porque, precisamente, exibidos como se fossem uma bandeira ou, pior ainda, um troféu, apenas imagens em relação às quais não se pode fazer nenhum gesto de participação e compaixão.
A delicadeza perspicaz do diretor me permitiu acompanhar aquele passeio entre as duas alas da multidão e captar um traço que, poucas horas depois, se revelou a mim em toda a sua presciência luminosa e com a força de um possível significado.
No início do evangelho de Lucas, entre os hinos encastoados nos dois primeiros capítulos dedicados à origem divina do Messias, o último é colocado na boca de um homem idoso, Simeão, que, junto com uma profetisa igualmente idosa, Ana, presidia o Templo na expectativa do Messias. O canto começa com as duas palavras que o gravaram na memória litúrgica da igreja, Nunc dimittis: “Agora, Senhor, podes despedir em paz o teu servo, segundo a tua palavra...” (Lc 2,29). Algumas horas mais tarde, essa percepção incerta se tornou mais clara, e eu tentei pensar naquelas últimas imagens que selaram as celebrações da Páscoa como o Nunc dimittis com o qual Francisco se despediu de sua vida rica em humanidade, habitada por infinitos homens e mulheres que o acompanharam e apoiaram na saúde e na doença, mas também de seu ministério petrino tão cheio de contrastes, de impulsos e freadas, de coisas novas e coisas velhas, como diria o evangelista Mateus (13,52).
Agora, finalmente, ele podia ir, e aquela bênção mútua atestava que tudo havia sido realizado.
Deixando em aberto, no entanto, para mim, a questão fundamental. De fato, o Nunc dimittis continua com a afirmação “pois os meus olhos agora viram a tua salvação” e, por isso, continuo a me perguntar o que Francisco pode ter visto, ouvido, entendido daquele intenso momento de despedida, precedido, com toda a probabilidade, de muita reflexão e oração: como continuará o tempo da salvação para esta igreja que me foi confiada, para estas pessoas que amei, para este mundo para o qual Cristo se revelou como luz para as nações (cf. Lc 2,32)?
Tudo foi casual, evidentemente, nada foi planejado. Se alguém o tivesse imaginado, não teria sido tão bem-sucedido: a imagem de costas de um idoso enrijecido, quase sem vida, diante do qual uma multidão jubilosa expressa toda a sua inesgotável vitalidade, marca um ponto sem retorno, torna-se o ícone de um pontificado, “palavra” de um discurso de despedida de um papa para quem os gestos foram mais magisteriais do que as palavras.