Mundo em guerra: somos assombrados pelos fantasmas do passado. Destaques da Semana no IHU

Confira os destaques de 9 a 15 de março

Arte: Marcelo Zanotti | IHU

Por: João Vitor Santos | 18 Março 2024

Nesta edição do Destaques da Semana, mergulhamos na conjuntura de uma guerra europeia, mas que pode levar ao fim do mundo diante da ameaça nuclear. Também olhamos para Gaza, que tem se tornado um território livre para bombardeios, fome, morte e muita dor. Lembramos que a corrida armamentista vem ganhando desdobramentos e reorganizando a ordem mundial. E como agir, enquanto humanidade, diante do silêncio de Deus ante tanto sofrimento? 

Um mundo perigoso e seus fantasmas

Neste mundo de tempos perigosos, em que avança uma extrema-direita nutrida no rancor e no ódio, o professor emérito da UFRJ José Luís Fiori alerta para a presença de quatro fantasmas. No artigo Os quatro fantasmas e o novo projeto alemão para a União Europeia, ele detalha esses assombros e alerta que está emergindo uma nova potência na Alemanha. O “senão” é que esta potência se move no terreno de guerra na Ucrânia. Sim, isso mesmo, este governo social-democrata alemão está se movendo em território de guerra, enquanto geopoliticamente coloca a França de lado. Quando a Alemanha se move, com olhos na indústria da guerra, os fantasmas do passado afloram.

Estupidez do envio de tropas

Em sua densa análise, Fiori não chega a abordar a questão da China, que também não está alheia aos movimentos ocidentais de uma União Europeia que quer chamar para si o protagonismo. De outro lado, temos os países da África, e o Sul Global em geral, que se perfilam com Putin e uma Rússia que não hesita, ameaçando com a guerra nuclear. Em meio a todos estes outros fantasmas, o antigo primeiro-ministro e ex-ministro dos Negócios Estrangeiros francês, Dominique de Villepin amplia a análise deste cenário de uma explosiva Europa. E ele não poupa nem o presidente Macron, que deseja mandar mais tropas para reforçar a resistência ucraniana.

 

Território movediço e armado

Como aponta a reportagem de Julio Zamarrónk, do El Salto, estamos em um território movediço, tão perigoso que parece não se tratar mais de uma guerra dos ucranianos, mas uma guerra dos europeus cujas consequências podem abalar o mundo. Vide as tristes e dramáticas experiências do século XX. Observe que a indústria bélica europeia está de olho, as importações de armas cresceram 94% e já há um recorde de US$ 1 trilhão para apoiar a indústria militar.

 

Bandeira branca: paz ou rendição?

Em meio a este fogo cruzado e às comemorações de seus 11 anos de pontificado, veio a público a fala de Francisco, ao comentar sobre a guerra na Ucrânia, defendendo que seja hasteada a bandeira branca. 

O problema é que, em tempos de guerra, falas lúcidas e proféticas quase sempre não são entendidas. E vêm acompanhas as reações duríssimas, que confundem ações pela paz com rendição. Como pontua Raniero La Valle, os espíritos belicosos parecem mesmo voltar a 1939, ao não se darem por conta que Francisco não é Pio XII. Talvez, até por não entender – ou seria ignorar? – este “magistério do Papa Francisco em tempos de guerra”.

Sofrimento do mundo

No fim das contas, seja com bandeira branca, seja com bandeira da cor que for, o Papa está quebrando um tabu ao trazer a sua preocupação com o sofrimento do mundo, como escreve Leonardo Boff.

Aliás, esta perspectiva do silêncio de Deus em um mundo em guerra – que nos perturba – e a teologia do Papa Francisco neste cenário são temas da conferência com Leonardo Boff dentro da programação da Páscoa IHU.

Enquanto isso em Gaza...

Obviamente que enquanto a Europa se engalfinha e volta suas atenções para a Ucrânia e as disputas veladas entre Ocidente e Oriente, a expansão da OTAN revela os sinais dos tempos num pós-guerra fria, como aponta Massimo Faggioli. Assim, o conflito de Gaza fica para depois, seguem os bombardeios e a promessa de intensificação do cerco à Faixa de Gaza: Benjamin Netanyahu aprovou o plano do exército israelense para ofensiva em Rafah, refúgio de 1,5 milhão de palestinos. Devemos assistir a mais um capítulo dessa barbárie.

Enquanto isso, quem não morre diretamente pela guerra, morre de fome. Ou seja, a fome passa a ser uma estratégia de guerra, matando especialmente crianças.

Outra arma de guerra

Além da fome, seja na Ucrânia, seja em Gaza, no Iraque ou no Congo, a mulheres são alvo de outra perversa arma de guerra: a violência sexual. A entrevista com Nadia Murad revela este drama delas que veem seus pais, irmãos e maridos morrerem na guerra, os filhos morrerem de fome e, ainda depois de abusadas, têm que se reerguer das cinzas que sobraram.

Violência étnica e violência de gênero

Nos porões das constituições dos seres humanos, há uma perversidade que move ações de violência. Talvez não seja exagero dizer que este desvio alimenta tanto a guerra e suas violências contra povos como a violência de gênero contra mulheres e outros gêneros que não o masculino.

Seguindo a reflexão de Eduardo Hoornaert, “quem conserva dentro de si a verdade sólida tem o futuro na mão, pois está absolutamente convicto de que sua maneira de pensar é a única verdadeira e que todas as demais são falsas. Não têm direito de existir e devem ser combatidas”.

Memórias de 1964

Antes de encerrar, pontuamos que em março se faz memória do Golpe de 1964, que jogou o Brasil num dos capítulos mais dramáticos da sua história. E na semana que passou, lembramos também o comício histórico de Jango, na Central do Brasil, realizado nas barbas do Golpe.

Este comício foi tema de atividade aqui do IHU, na live com o professor Valerio Arcary.

Este bate-papo abriu uma série de conferências que o IHU promoverá com o objetivo de fazer memória a todo o contexto que levou ao Golpe em perspectiva com sua conjuntura atual. Na próxima semana, já tem outra live agendada.

Com o olhar fixo e atento nesta dura realidade, mas com coração e mente livres para tempos de esperança, desejamos uma ótima semana a todas e todos!