21 Fevereiro 2024
A fanfarronice de Trump é apenas parte do que ele trouxe para a política. Existe um modo de falar que infecta a política, a imprensa e até mesmo as conversas privadas, sendo insultante tanto para o sujeito quanto para o ouvinte.
A opinião é de Phyllis Zagano, pesquisadora na Hofstra University, de Nova York. O artigo foi publicado em National Catholic Reporter, 20-02-2024.
Segundo ela, "os bispos católicos dos Estados Unidos dizem que sua 'prioridade preeminente' é o aborto e, em suas declarações, expandem seu interesse para a vida humana. É claro que os bispos respeitam genuinamente toda a vida humana, mas, como corpo, parecem estar cada vez mais unidos às políticas trumpianas e, por implicação, à retórica trumpiana".
Eis o texto.
Alguém realmente quer acompanhar o noticiário hoje em dia? Gaza. Israel. Rússia. Ucrânia. Migrantes. Tiroteios em massa. Execuções. Tragédias atrás de desastres, desgraças atrás de calamidades.
E depois temos Trump.
A bombástica retórica do ex-presidente pouco contribui para acalmar os nervos de qualquer consumidor de notícias. Nem melhora a visão mundial sobre a política dos Estados Unidos ou de seu caráter moral.
No entanto, a fanfarronice de Trump é apenas parte do que ele trouxe para a nossa política. Existe um modo de falar que infecta a política, a imprensa e até mesmo as conversas privadas, sendo insultante tanto para o sujeito quanto para o ouvinte.
A linguagem de Trump é a linguagem do mal.
Vimo-lo e ouvimo-lo (entre suas aparições no tribunal) ridicularizando a Otan, o serviço militar e todo o sistema de justiça dos Estados Unidos com termos e expressões faciais debochados.
E não é só Trump quem está sujando as ondas de transmissão. Muitos políticos republicanos estão infectados com a atitude diabólica que emana dos comícios de campanha de Trump. Seu desrespeito pelas pessoas constitui agora um discurso público aceitável.
Os republicanos da Câmara e do Senado difamam rotineiramente outros legisladores e oponentes políticos. De acordo com o The New York Times, os membros republicanos do Congresso ecoam as posições preconceituosas de seu presumível candidato, pois "usam uma retórica que difama as pessoas com base em sua etnia, religião ou nacionalidade”.
O vírus do desrespeito se espalhou. As mídias sociais estão repletas de linguagem grosseira e de comentários maldosos. Estranhos agem com desdém uns com os outros. Pessoas em posições de poder humilham os outros da forma mais óbvia. As engrenagens individuais nas rodas dos sistemas e das organizações esmagam rotineiramente os indivíduos.
A linha divisória não é apenas a etnia, a religião ou a nacionalidade. Qualquer “outro” real ou perceptível converte-se em um alvo. E embora todos sofram, as mulheres sofrem mais. Embora as mulheres enfrentem insultos e perigos diários, desde cantadas a estupros, elas também enfrentam uma resistência passivo-agressiva sempre que tentam participar no mundo do trabalho ou na sociedade.
Na Igreja não é diferente. Pergunte a qualquer mulher que tenha escrito a seu bispo ou pároco sobre um problema que sua paróquia enfrenta e, provavelmente, ela dirá que foi ignorada. Não importa se ela tenha perguntado o que aconteceu com o dinheiro do último evento de arrecadação de fundos, ou por que não há nenhum conselho paroquial, ou onde (ou mesmo quando) irá ocorrer a reunião sobre o Sínodo. Ela sofre o desrespeito eclesial ativo e passivo dentro do crescente clima de desrespeito geral pela pessoa.
Os bispos católicos dos Estados Unidos dizem que sua “prioridade preeminente” é o aborto e, em suas declarações, expandem seu interesse para a vida humana. É claro que os bispos respeitam genuinamente toda a vida humana, mas, como corpo, parecem estar cada vez mais unidos às políticas trumpianas e, por implicação, à retórica trumpiana.
Exemplos disso aparecem por toda a parte. Quando um cartaz paroquial anuncia “Fartos do woke? Nós também”, a necessidade de separação entre Igreja e Estado assume um novo significado.
Quem está pregando dentro daquela igreja? Seria a deputada da Geórgia Marjorie Taylor Greene, que disse no plenário da Câmara dos Representantes que queria censurar o “deputado Ilhan Omar da Somália – quero dizer, de Minnesota”. Ou será que o pregador daquela semana seria o senador Tom Cotton, do Arkansas, que, durante uma audiência do Comissão Legislativa do Senado, perguntou ao CEO do TikTok de Singapura se ele era chinês, se tinha passaporte chinês ou se era membro do Partido Comunista Chinês?
A linguagem preconceituosa em privado no Congresso é supostamente pior.
Quando políticos presumivelmente educados e responsáveis falam como se estivessem pregando em uma mesa de bar à meia-noite, o que o restante de nós pode fazer para remover a difamação furiosa de uma pessoa ou das pessoas de qualquer outro púlpito do qual possamos estar perto? Os votos podem exorcizar o Congresso, mas isso vai acontecer? O problema é que muitos eleitores parecem gostar desse tipo de linguagem. Em outros lugares, algumas pessoas simplesmente vão embora silenciosamente.
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A linguagem de Trump sobre o mal. Artigo de Phyllis Zagano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU