08 Outubro 2021
"Suspiramos pelo aparecimento de um governo justo e de comandantes das Forças Armadas sérios que tenham a coragem de qualificar essas ações nefastas pelo que foram e pelo são e pedir perdão aos Waimiri-Atroari e à humanidade", escreve Egydio Schwade, filósofo e teólogo, um dos fundadores do Conselho Indigenista Missionário - CIMI e primeiro secretário executivo da entidade, em 1972.
Eis o artigo.
Semana passada vimos, outra vez, a mais alta autoridade da República, pisar o povo Waimiri-Atroari, como se este não tivessem direito de viver com autonomia no chão que imemorialmente garantiu para sua sobrevivência e de suas gerações futuras. Não faz muitos meses que vimos em rede nacional o Dep. Gefferson Alves de Roraima, outro capanga oficial, ostentar a sua covardia contra este povo, cortando a corrente que os índios colocam à noite para proteger a vida e as riquezas naturais de seu território, como pede a Carta Magna Cap. VI, Art. 225: “todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defende-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.”
Foi assim que a Ditadura Militar invadiu recentemente o território desse povo, como se fosse um vazio demográfico, com a construção da BR-174. Naquela oportunidade justificou de público a necessidade de ligar Manaus a Boa Vista. Mas o objetivo foi outro. Os documentos que originaram a BR-174, comprovam que a obra visava as jazida minerais da área desses índios.

Região da TI Waimiri-Atroari (Foto: Instituto Socioambiental - ISA)
Antes de iniciar a obra o Cel. Mauro Carijó, diretor do Departamento Estadual de Rodagem do Amazonas, em ofício à PETROBRÁS, solicitou ...“informação sobre o potencial mineral do Estado em vista da elaboração de um Plano Diretor de Transportes para o Estado do Amazonas”. (1). Semelhante foi o objetivo do Presidente Sarney quando nomeou Romero Jucá, Presidente da FUNAI.
O objetivo oculto da Ditadura Militar foram as minas do Pitinga e a construção da hidrelétrica de Balbina nas terras Waimiri-Atroari, para captação de energia. O pagamento a este povo foi um genocídio. Durante a construção das obras, o povo Waimiri-Atroari foi reduzido de 3000 para 332 pessoas e perdeu dois terços do seu território imemorial. Este objetivo tambem faz parte do Linhão que o Governo Bolsonaro está impondo agora a este povo.

Interligação da usina de Tucuruí, na Amazônia (Foto: Divulgação/2013/PAC)
O objetivo principal do LINHÃO não é abastecer de energia o Estado de Roraima. Roraima não precisava sofrer falta de energia. Bastava normalizar de forma civilizada as relações diplomáticas com o governo da Venezuela, interrompidas pela submissão do governo Bolsonaro aos interesses do nada democrático governo dos Estados Unidos. O Linhão de Guri/Venezuela, já existe e funcionou muito bem, trazendo energia mais econômica do pais vizinho, do que o Linhão trará. A interrupção do fornecimento da energia da Venezuela, tem a ver com as burrices do governo Bolsonaro.
O objetivo do Linhão-Bolsonaro é triplamente prejudicial aos indígenas:
- Visa chegar a novas fontes de energia, para abastecer o Sul do País, que prejudicarão os seus territórios.
- O saque dos minerais em suas terras.
- E não por ultimo, a sua “integração” compulsória, ou seja, exterminá-los de vez, para dar livre acesso às empresas capitalistas multinacionais, para o saque dos recursos minerais e vegetais.
É importante nos darmos conta disso. E o povo Waimiri-Atroari, é no momento o principal alvo deste governo genocida, como detentor de um grande potencial mineral, mas também porque no passado, como hoje, é o principal baluarte contra o olho grande das multinacionais. A Casa da Cultura do Urubuí, o CIMI e o CEDI, desde os anos 80, vem alertando e denunciando, nominalmente 13 empresas mineradoras multinacionais que já lotearam entre si o território desse povo.

Mapa do Linhão (Foto: Wikimedia Commons/Anderson PV)
Suspiramos pelo aparecimento de um governo justo e de comandantes das Forças Armadas sérios que tenham a coragem de qualificar essas ações nefastas pelo que foram e pelo são e pedir perdão aos Waimiri-Atroari e à humanidade.
É hora também da sociedade brasileira se dar conta desse crime. Este povo vem sofrendo agressões de diversos tipos, desde a chegada dos primeiros europeus à região. E desde 1944, se tornou o alvo principal da crueldade do governo brasileiro, em especial, dos governos submissos às empresas multinacionais de mineração. Já naquele ano de 1944, os Waimiri-Atroari destruíram uma expedição comandada por dois oficiais norte-americanos, na foz do rio Jacutinga que dá acesso direto às minas do Pitinga.

Reunião dos Waimiri Atroari(Foto: ACWA)
E não por último, é hora de aparecer uma administração municipal em Presidente Figueiredo, (a Terra das Cachoeiras, de tantas belezas naturais, devidas ao trato comunitário e uso carinhoso milenar do povo Waimiri-Atroari,) que olhe com verdade e justiça, e qualificar oficialmente, os fatos que originaram este município, por aquilo que foram, sem atenuantes, renomeie o município e inicie um novo relacionamento com este povo.
E, finalmente era bom irmos à escola desse povo, para “aprender e ensinar uma nova lição”.
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Linhão: mais uma mentira contra o povo Waimiri-Atroari - Instituto Humanitas Unisinos - IHU