Passagem da noite. Carlos Drummond de Andrade na oração inter-religiosa desta semana

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01 Novembro 2019

Neste espaço se entrelaçam poesia e mística. Por meio de orações de mestres espirituais de diferentes religiões, mergulhamos no Mistério que é a absoluta transcendência e a absoluta proximidade. Este serviço é uma iniciativa feita em parceria com o Prof. Dr. Faustino Teixeira, teólogo, professor e pesquisador do PPG em Ciências da Religião da Universidade Federal de Juiz de Fora – MG.

 

Passagem da noite

É noite. Sinto que é noite
não porque a sombra descesse
(bem me importa a face negra)
mas porque dentro de mim,
no fundo de mim, o grito
se calou, fez-se desânimo.
Sinto que nós somos noite,
que palpitamos no escuro
e em noite nos dissolvemos.
Sinto que é noite no vento,
noite nas águas, na pedra.

E que adianta uma lâmpada?
E que adianta uma voz?
É noite no meu amigo.
É noite no submarino.
É noite na roça grande.
É noite, não é morte, é noite
de sono espesso e sem praia.
Não é dor, nem paz, é noite,
é perfeitamente a noite.

Mas salve, olhar de alegria!
E salve, dia que surge!
Os corpos saltam do sono,
o mundo se recompõe.
Que gozo na bicicleta!
Existir: seja como for.
A fraterna entrega do pão.
Amar: mesmo nas canções.

De novo andar: as distâncias,
as cores, posse das ruas.
Tudo que à noite perdemos
se nos confia outra vez.
Obrigado, coisas fiéis!
Saber que ainda há florestas,
sinos, palavras; que a terra
prossegue seu giro, e o tempo
não murchou; não nos diluímos.
Chupar o gosto do dia!
Clara manhã, obrigado,
o essencial é viver!

(Fonte: Carlos Drummond de Andrade. Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2004, p. 132-133)

 


Foto: Divulgação Sou BH

Carlos Drummond de Andrade (1902 - 1987): Poeta, contista e cronista mineiro, radicado no Rio de Janeiro, é visto como um dos expoentes da segunda geração do Modernismo brasileiro. Suas palavras traduzem a visão de um individualista comprometido com a realidade social. Além disso, Drumond tematizava a vida e os fatos cotidianos que, ora, focalizava os indivíduos, os amigos, a família, ora o questionamento da existência e da poesia. Trabalhou em vários jornais, entre eles, Correio Manhã e Jornal do Brasil, onde atuou como cronista.  Dono de vasta obra literária, que conta com também com textos da literatura infantil, é autor, entre outros: Alguma Poesia (1930), Sentimento do Mundo (1940), A Rosa do Povo (1945), Claro Enigma (1951), Poemas (1959), Lição de Coisas (1962), Boitempo (1968), e Corpo (1984). 

 

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