22º domingo do Tempo Comum – Ano C – Subsídios Exegéticos

26 Agosto 2022

 

Subsídio elaborado pelo grupo de biblistas da Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana - ESTEF:


Dr. Bruno Glaab
Me. Carlos Rodrigo Dutra
Dr. Humberto Maiztegui
Me. Rita de Cácia Ló

 

Leituras do dia

 

Primeira Leitura: Eclo 3,19-21.30-31
Salmo: 67,4-7ab.10-11
Segunda Leitura: Hb 12,18-19.22-24ª
Evangelho: Lc 14,1.7-14

 

O Evangelho

 

O evangelho de hoje (Lc 14,1.7-14) mostra Jesus na casa de um dos chefes dos fariseus. É a terceira vez, no evangelho de Lucas, que um fariseu o convida Jesus para uma refeição (Lc 7,36; 11,37 e 14,1). Parece que Jesus teve muitos amigos fariseus, mas nem sempre eles concordavam com as opiniões de Jesus.

 

Os fariseus buscavam sinceramente cumprir a Lei de Deus em tudo. Mas esse desejo virou uma obsessão, a ponto de fazer deles pessoas orgulhosas e intransigentes, que achavam que não precisavam mais se converter.

 

No texto de hoje, Jesus observa como os convidados escolhiam as primeiras cadeiras (v. 7b). No tempo de Jesus, conseguir um lugar de destaque era importante porque dava a possibilidade de comer o que havia de melhor, uma vez que era gigantesca a diferença entre o que era servido na mesa principal o que era servido nas outras mesas.

 

Nos vv. 8-10, Jesus se dirige aos convidados e retoma regras de etiqueta ou de boas maneiras em uso na sociedade. São as mesmas sugeridas pela tradição sapiencial: Não ocupe o lugar dos grandes. É melhor que digam a você: “Suba até aqui”, do que ser humilhado na presença de uma autoridade (Pv 25,6-7; cf. Sr 31,18). Poderíamos concluir, com razão, que esse ensinamento sapiencial de Jesus é absolutamente trivial, um pequeno conselho dentro de um sistema cultural estabelecido. Porém, Jesus não está interessado em fazer recomendações sobre como se comportar durante uma refeição. Ele usa a circunstância como ponto de partida para um ensinamento sobre o Reino de Deus: para entrar no Reino, é necessário humildade.

 

Jesus adverte seus ouvintes acerca do perigo de um comportamento viciado pela soberba e pelo egoísmo: quem dá um alto valor a si mesmo pode passar pela humilhação de ser declarado alguém comum e igual aos outros. A falta de humildade é um perigo constante na Igreja. Muitos irmãos e irmãs de nossas comunidades começam bem sua caminhada, mas aos poucos vão ficando como os fariseus: orgulhosos e intransigentes, e acabam se achando os melhores.

 

Ao anfitrião, Jesus recomenda uma atitude de gratuidade: Quando deres uma festa ou um banquete, não chames teus amigos, nem teus irmãos, nem teus parentes, nem teus vizinhos ricos, para que eles não te convidem também e assim haja retribuição para ti (v. 12). Mesmo por trás do gesto generoso de receber convidados pode se esconder um sentimento de orgulho e egoísmo: convidar somente pessoas que, de algum modo, podem retribuir ao convite.

 

A escolha dos convidados pode ser motivada pelo interesse e por quais vantagens aquele convite pode render ao anfitrião. Para incentivar seus ouvintes a evitar este comportamento interesseiro, Jesus aconselha a convidar os pobres, estropiados, coxos e cegos (v. 13c). No ambiente judaico de Jesus, estas categorias de infelizes não podem participar de nenhuma cerimônia religiosa no Templo (cf. Lv 21,17-21). Mais ainda, tais pessoas nem sequer podiam fazer parte da comunidade religiosa dissidente que habitava Qumran.

 

No v. 14, Jesus profere uma bem-aventurança: e serás bem-aventurado, porque eles não têm com que te retribuir. Mas terás tua retribuição na ressurreição dos justos. Este desafio aos esquemas convencionais de reciprocidade é destacado pela condenação de Jesus ao hábito de convidar aqueles que podem retribuir (vv. 12-14). À luz de um julgamento humano, o que Jesus recomenda é uma ação sem compensação; mas o fiel sabe que será recompensado na vida futura, na qual resplandecerá a “justiça” ou a santidade daqueles que lutam por fraternidade, vida, direito etc. Jesus ensina que o bem deve ser realizado mesmo sem reconhecimento. Não obstante, tudo será compensado, pago. Desta vez o autor do Evangelho de Lucas não fala do banco celestial onde os tesouros estão seguros (cf. 12,33), mas ressalta o trabalho cristão à luz da vida após a morte. Esse é o critério do Reino. O evangelho é anunciado aos despossuídos, cegos, coxos e pobres (7,22). Os cristãos devem ser “misericordiosos, como o Pai é misericordioso” (6,36) para que sejam recompensados por Deus em vez de receberem a recompensa de outros homens.

 

Em nossas comunidades, as duas atitudes estão bem presentes: tanto a busca dos primeiros lugares como a falta de gratuidade. Ambas são atitudes egoístas e Jesus nos convida a combatê-las primeiramente em nós mesmos. Mas precisamos também estar atentos: não devemos confundir “buscar o último lugar na comunidade” com “sentar-se no último banco da igreja”. Buscar o último lugar é uma atitude de serviço e compromisso; sentar-se no último banco muitas vezes é uma atitude de oposição e indiferença.

 

 

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