17 Outubro 2018
Intelectual camaronês era visto como o maior filósofo africano da contemporaneidade.
A reportagem é de Lucie Sarr, publicada por La Croix Internacional, 16-10-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.
Intelectuais africanos fazem fila para homenagear Fabien Eboussi Boulaga, o famoso filósofo e teólogo camaronês, que morreu no último dia 13 de outubro aos 84 anos de idade. Alguns o consideravam o maior filósofo africano da atualidade.
O notável teólogo e filósofo, Fabien Eboussi Boulaga
Foto: Reprodução Facebook
Nascido em 1934 na região central de Camarões, ele é particularmente conhecido por sua reflexão sobre o "Muntu", o homem africano.
Em seus livros, “La Crise du Muntu” (A crise do Muntu, em tradução livre) de 1977, e “Christianisme sans fétiche” (Cristianismo sem fetiche, em tradução livre), de 1970, ele oferece uma visão crítica do homem africano e do cristianismo.
Ele foi o responsável por desafiar as afirmações dogmáticas e metafísicas do cristianismo num contexto colonial.
A perda da fé
Boulaga foi membro da Companhia de Jesus de 1955 a 1980. Ordenado sacerdote em 1969, criou seu legado a partir de suas visões teológicas - às vezes perturbadoras.
Em seu livro “La démission”, publicado em 1974, ele pediu a saída dos missionários ocidentais que vivem na África.
Em 1970, “Christianisme sans fétiche” revelou ainda seu profundo questionamento de sua fé católica em relação à sua identidade africana. Este livro inclui uma grande crítica do cristianismo, bem como uma "reinterpretação africana do cristianismo".
Depois, em 1980, o intelectual finalmente deixou a Companhia de Jesus e pediu para ser laicizado, alegando ter perdido sua fé onze anos antes.
Um Concílio Africano
Em 1977, Boulaga participou de uma conferência sobre a civilização negra e a Igreja africana. Durante o evento, a ideia de um Concílio Africano foi apresentada. Isto inspirou Boulaga a fundar o periódico “Pour un Concile africain”, lançado em 1978.
No prefácio da primeira edição, ele explica a necessidade de uma profunda reflexão sobre o cristianismo africano diante dos desafios que existiam no continente.
“Queremos uma avaliação geral da Igreja Católica para debater os graves problemas relacionados com a evangelização interna da África”, disse o camaronês.
“Isso deveria ser feito com todos unidos, não apenas prelados assistidos por vários especialistas, mas por meio de delegados, mas com todo o continente em comunhão com os bispos”, continuou.
“A tarefa de um Concílio Africano seria promover coletivamente comunidades católicas em suas particularidades geográficas”, explicou Boulaga.
Tributo de intelectuais
Muitos africanos expressaram sua tristeza após o anúncio da morte de Boulaga.
"Saudamos a memória de um homem íntegro, um intelectual no verdadeiro sentido do termo, que se tornou raro em Camarões", disse o padre Ludovic Lado, um antropólogo jesuíta de Camarões, em comentário na sua página no Facebook.
“Ele encarnou o rigor de seu pensamento de acordo com sua própria experiência de vida. O Muntu está morto, viva o Muntu ”, disse o padre Lado.
O economista senegalês Felwine Sarr também expressou seu respeito pelo "autor da crise do Muntu", que segundo ele, “foi uma das obras filosóficas mais exigentes e lúcidas que um filósofo do continente africano já desenvolveu”.
Boulaga viveu suas convicções e conseguiu manter sua integridade moral, escreveu Sarr.
“Sentiremos muito a sua falta e estaremos longe de ter aproveitado por completo o imenso legado que nos deixou tanto nos seus escritos como na vida”, disse Sarr.
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Morre aos 84 anos Fabien Eboussi Boulaga, teólogo e filósofo africano - Instituto Humanitas Unisinos - IHU