29 Janeiro 2018
Caro ao juiz Sérgio Moro e a procuradores da República como Deltan Dallagnol, critério se contrapõe a princípios adotados pela Constituição de 1988.
Prevaleceu, no 3 a 0 contra o recurso do ex-presidente Luiz Inácio da Silva, o princípio anglo-americano que aceita como critério para a condenação do réu a existência de prova acima de qualquer dúvida razoável (beyond a reasonable doubt). Caro ao juiz Sérgio Moro – que o defende em seus livros e o cita na sentença recorrida – e a procuradores da República como Deltan Dallagnol, o critério se contrapõe a princípios adotados pela Constituição de 1988 – como o da presunção da inocência, ou presunção de não-culpabilidade, e o in dúbio pro réu.
A reportagem é de Luiz Maklouf Carvalho, publicada por O Estado de S. Paulo, 26-01-2018.
Quem explicitou que usaria o critério da dúvida razoável como baliza de seu voto foi o desembargador João Pedro Gebran Neto, relator do recurso. Respaldou-o com posições de dois ministros do Supremo Tribunal Federal – Rosa Weber e Dias Toffoli. Não as leu, porque constavam do voto escrito, mas as citou. Poderia, se quisesse, ter citado a posição contrária de outro ministro, como a da hoje presidente Cármen Lúcia, ou, mesmo, do ministro decano Celso de Mello, algumas vezes questionadores do conceito não acolhido pela Constituição.
Essa discussão está bem posta em livro do procurador Dallagnol – As lógicas das provas no processo. Apoiando-se também em obras do juiz Sérgio Moro, o procurador, um dos que assinam a denúncia contra o ex-presidente, defende a relatividade da presunção da inocência e, em contraponto, a valoração mais efetiva da prova indireta, especialmente no julgamento de crimes do colarinho branco, mais difíceis de comprovação factual.
O procurador mostrou, no livro citado, a quantas andava essa discussão no Supremo Tribunal Federal. Citou, entre os eventualmente favoráveis à reasonable doubt os dois ministros que Gebran Neto também citou. Acrescentou o contraditório da ministra Cármen Lúcia. Durante o julgamento da Ação Penal 470, o chamado mensalão, a ministra disse: “Para a condenação, exige-se certeza, não bastando, sequer, a grande probabilidade”. Dallagnol comenta: “Na contramão do que temos estudado, a ministra Cármen Lúcia, também no julgamento do mensalão, defendeu que ‘a condenação em processo penal exige juízo de certeza, não bastando a ausência de dúvida razoável sobre a existência do fato imputado ao agente”. Moro é citado mais uma vez: “Cumpre ressaltar, com Moro (no livro Crime de lavagem de dinheiro), que o standard para além de dúvida razoável é um elevado standard, exigido para a condenação do réu a penas criminais”.