Por: André | 13 Dezembro 2014
A Cúpula dos Povos, que está sendo realizada paralelamente ao debate oficial, derivou, na quinta-feira, dia 11, em uma longa marcha para questionar o sistema capitalista, criticar as empresas transnacionais e exigir a mudança da política extrativista de recursos naturais.
Fonte: http://bit.ly/1qE4CMz |
A reportagem é de Carlos Noriega e publicada no jornal argentino Página/12, 12-12-2014. A tradução é de André Langer.
Enquanto no quartel general do Exército, conhecido como o Pentagonito, Ollanta Humala e outros presidentes trabalhavam na Conferência das Partes das Nações Unidas sobre o Clima (COP-20), nas ruas de Lima milhares de pessoas marchavam levantando consignas contra a cúpula oficial e em defesa da “Mãe Terra” e dos direitos dos povos indígenas. “Mudemos o sistema, não o clima”, podia-se ouvir nas ruas. Organizações sociais e camponesas, representantes de populações indígenas do Peru e outros países, grupos ambientalistas, sindicatos, uniram-se a esta marcha pacífica organizada pela Cúpula dos Povos. Cerca de 10.000 pessoas participaram da mobilização, que terminou com uma sessão de discursos na Praça San Martín, no centro histórico de Lima.
Agitando bandeiras coloridas e gritando palavras de ordem como “a Terra está queimando, mudemos o sistema”, a multidão percorreu, sob um sol escaldante, as ruas do centro da capital peruana. “Em defesa da nossa Mãe Terra”, “A floresta é de todos, autoridades, ajudem-nos a salvá-la”, “Energia 100% limpa” e outras demandas, como “Conga não sai”, em referência a um milionário projeto de mineração no norte do Peru ao qual se opõem os camponeses e organizações sociais dessa região, podia-se ler nas faixas que acompanhavam a marcha.
Em um palco levantado na Praça San Martín, a segunda mais importante da capital peruana, sucederam-se os discursos. Houve cerca de 20 oradores, que tinham em comum o questionamento do sistema capitalista, ao qual acusaram de ser responsável pela crise ambiental, a forte crítica das transnacionais e a exigência da mudança da política extrativista de recursos naturais que “depreda e deixa a Mãe Terra doente”, a acusação dos governos de não fazerem nada de efetivo contra o aquecimento global e a reivindicação dos direitos dos povos indígenas.
“Os governos propõem paliativos contra o aquecimento global, mas o povo não está pedindo paliativos, o povo exige uma mudança de rumo”, exclamou um dos oradores. “Estamos em luta em defesa da Terra, temos mortos e isso não se esquece”, disse uma representante das comunidades nativas. “Rechaçamos a criminalização dos protestos sociais”, assinalou um terceiro orador. “Todos temos de agir, levantar-nos em resistência, não ficar apenas nos discursos”, pediu outro.
A deputada da Frente Ampla de Esquerda, Verónika Mendoza, acusou o presidente Humala de ter um duplo discurso: “Fala-se de mudança climática enquanto se aprova leis que deixam as empresas poluidoras impunes, florestas são depredadas, criminaliza-se e mata-se os camponeses que lutam em defesa da Mãe Terra”. Mendoza acusou a COP-20 de nela haver “hipocrisia e falsos discursos”.
“Esta marcha é para dizer aos governos que nos levem em conta. O governo peruano nos deu as costas. Aos que estão na COP-20 diria que, em vez de estarem fechados com todas as comodidades, saiam, que vão às comunidades, à Amazônia, e vejam a realidade”, disse ao Página/12 Marishöri Samaniego, da etnia amazônica ashaninka, enquanto marchava com um grupo de membros da sua comunidade.
Como parte das atividades paralelas à COP-20, realizou em Lima o Tribunal Internacional pelos Direitos da Natureza, que teve um painel de juízes internacionais. Doze casos de violações ambientais e dos direitos indígenas em diferentes partes do mundo foram analisados por este tribunal, que tem um caráter ético. Empresas e Estados foram postos nos bancos dos réus. Em alguns dos casos foram emitidas sentenças e outros foram somente apresentados e decidiu-se continuar as investigações.
Em um dos casos apresentados ao Tribunal pelos Direitos da Natureza acusou-se a empresa petroleira argentina Pluspetrol pela contaminação que suas atividades causam na Amazônia peruana, afetando severamente o meio ambiente e a vida das comunidades nativas. Em conversa com este jornal, Aurelio Chino Dahua, apu da etnia amazônica quéchua que vive na zona de operações da Pluspetrol, falou da situação dos povos indígenas. “Nossos irmãos ficam doentes por consumirem a água dos rios e por comerem os peixes e animais que estão contaminados. A Pluspetrol não está cumprindo seu compromisso de resolver os danos ambientais. A contaminação prossegue e ninguém faz nada. Eles estão nos dando a entender que não querem se sentar para conversar conosco”.
O Tribunal Internacional pelos Direitos da Natureza condenou a transnacional Chevron-Texaco pelos “danos irreversíveis” de suas atividades petroleiras no Equador. Também o Estado do Equador foi condenado pela exploração petroleira no Parque Nacional Yasuní. Outros condenados foram a British Petroleum, pelo vazamento de petróleo no Golfo do México, considerado o pior da história, e o governo de Queensland (Austrália), pela destruição do Arrecife de Coral.
Entre os casos aceitos por este tribunal figuram a morte de 33 pessoas em um protesto indígena na Amazônia peruana em junho de 2009 e o processamento judicial de 52 dirigentes indígenas por esses protestos; o questionado projeto mineral Conga, no Peru, contra o qual se levantaram as comunidades indígenas, protestos que deixaram cinco mortos; a construção da central hidroelétrica de Belo Monte na floresta do Brasil, entre outros.
“Este é um tribunal ético; suas resoluções mantêm-se nesse nível, suas sentenças são um apelo ao mundo para defender a natureza. Viemos com uma mensagem que quer mostrar ao mundo a importância de proteger a natureza para a existência da humanidade”, assinalou a este jornal o equatoriano Alberto Acosta, presidente do Tribunal Internacional pelos Direitos da Natureza.
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COP-20. “Mudemos o sistema, não o clima” - Instituto Humanitas Unisinos - IHU