A ética em tempos de Coronavírus

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12 Março 2020

"Como se comportar em tempos de emergência do Coronavírus? Algumas normas morais a serem observadas com senso de responsabilidade", refletem Giovanni Del Missier, teólogo e padre italiano, Roberto Massaro, professor da Teologia Moral Sexual na Facoltà Teologica Pugliese, na Itália, em artigo publicado por Settimana News, 11-03-2020. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis o artigo.

A emergência do Covid-19 está testando severamente a Itália e várias outras nações, despreparadas diante de uma epidemia inesperada e em rápida expansão.

Nossos hábitos estão mudando, em virtude de um apelo à responsabilidade que está limitando muitas de nossas atividades diárias e relacionamentos.

A ética também é solicitada a oferecer respostas ou a iniciar processos em face dessa situação emergencial.

Informação

Uma das exigências fundamentais diante da disseminação de uma nova epidemia é a de informações claras, unívocas e cientificamente fundadas, oferecidas por fontes competentes. Isso contribui para evitar reações inconscientes de pânico, instilando consciência, razoabilidade e moderação na opinião pública, que costuma reagir em termos emocionais e irracionais.

As informações devem acompanhar constantemente as medidas preventivas ou restritivas tomadas pelas autoridades públicas para motivar o cumprimento das disposições (compliance) e motivar os cidadãos sobre a eficácia dos sacrifícios solicitados.

É necessária uma colaboração dos meios de comunicação em vista do bem comum, colocando o sensacionalismo e a busca de furos em segundo plano para contribuir para um clima consciente dos riscos, mas sereno e confiante. Isso não significa anular o direito à informação, mas modular seu exercício das formas que a prudência impõe em situações de perigo e emergência.

O papel dos gestores públicos é fundamental e requer a máxima transparência para com os cidadãos, juntamente com a colaboração e a convergência entre os diferentes órgãos e níveis administrativos.

Confidencialidade

Nos últimos dias apareceram com grande facilidade o nome e o sobrenome dos infectados: isso constitui uma violação grave da privacidade dos indivíduos envolvidos em termos de dados sensíveis, como os relativos à saúde.

Em momentos de emergência, é provável que surjam pedidos para identificar os infectados na ilusão de que isso permita combater a epidemia, enquanto muitas vezes apenas contribui para reforçar as falsas seguranças e as formas de marginalização dos pacientes expostos ao público como "apestados" e (possíveis ) hospedeiros.

É bastante instintivo que, em situações de alarme social, seja mais fácil o comprometimento dos direitos fundamentais e mais difícil que se levantem vozes diferentes em defesa de sua proteção. Em vez disso, é preciso reiterar que os direitos fundamentais nunca podem ser anulados em nome de nenhuma força de causa maior; seu exercício pode ser regulado e - em casos extremos - suspenso apenas se for evidente que isso realmente contribui para proteger o bem comum.

E é bom que isso seja implementado apenas por períodos limitados de tempo, a fim de evitar que a urgência e o medo favoreçam o desvio em direção a formas de injustiça e abuso.

Critérios de acesso a recursos médicos limitados

Os anestesiologistas italianos comunicaram a possibilidade de uma alteração nas formas de triagem para definir o acesso do paciente à unidade de terapia intensiva (UTI), caso as vagas sejam extremamente escassas em relação aos pacientes que precisam de tal suporte.

Deve-se lembrar que essa eventualidade, prevista para situações excepcionais de catástrofe ou guerra, corresponde à necessidade de salvar o maior número de pessoas diante de recursos limitados que não podem ser oferecidos a todos, como normalmente acontece. Isso deve ser aplicado quando um nível limite for realmente atingido e o uso de um "racionamento de recursos" realmente corresponda ao único bem possível que pode ser realizado em uma situação grave que não pode ser enfrentada de outra maneira.

Antes de dar esse passo, todas as alternativas disponíveis no território nacional - incluindo as previstas para desastres naturais - devem ser esgotadas, de acordo com uma lógica de solidariedade e compartilhamento de recursos. Nesse caso, uma informação pontual e não alarmista deverá ser fornecida a todos, garantindo a justiça e a imparcialidade dos critérios utilizados para selecionar os pacientes, que deverão ser principalmente de caráter médico e o mais objetivo possíveis para não deixar espaço para discriminações injustas.

Contudo, antecipar as informações antes que se verifiquem as circunstâncias descritas acima, parece ser uma comunicação alarmista imprudente e inoportuna, pelo menos no momento presente.

A comunidade cristã

Os crentes são chamados a se comportar como cidadãos conscientes e colaborativos, assumindo suas responsabilidades em sintonia com as disposições das autoridades.

Se uma das medidas preventivas exige evitar reuniões com a presença de pessoas, a suspensão da participação das pessoas nas celebrações parece legítima e oportuna.

Os ordinários locais são chamados a se pronunciar claramente sobre o assunto, a fim de evitar discrepâncias de comportamento entre os fiéis, incluindo os presbíteros! E os crentes têm uma obrigação moral de se comportar de maneira justa e respeitosa com as normas, evitando subterfúgios.

Certamente, a renúncia à participação em presença da Eucaristia (principalmente aos domingos) é um sacrifício para os cristãos, mas o bem da saúde pública pode exigir em situações excepcionais também a restrição de formas de culto público. Nesses casos, a mídia pode oferecer formas alternativas de participação, de contato com a comunidade e de apoio à oração.

O jejum eucarístico forçado - como outras formas de renúncia impostas pela emergência - pode nos fazer recuperar o valor e a apreciação pelo que muitas vezes tomamos como garantido: eucaristia, comunidade, relações, possibilidades ... que neste tempo de "quaresma especial" constituem formas de jejum eficazes e de compartilhamento com os cristãos que experimentam essa falta como normalidade.

Uma ética da responsabilidade

De vários lados chega uma crítica às disposições do governo, as quais, segundo alguns, careceriam de clareza e não ofereceriam limitações claras a determinados comportamentos considerados irresponsáveis.

Como conter, por exemplo, o êxodo de estudantes e trabalhadores que, da Lombardia, tentam retornar ao sul? Como limitar as formas de agregação em pizzarias ou bares? Como lidar com a suspensão das atividades escolares e acadêmicas? É feita referência à exigência de normas cada vez mais detalhadas que regulamentem a ação civil e prevejam sanções exemplares para quem as transgride.

Acreditamos, no entanto, que seja necessário chamar as consciências para uma ética da responsabilidade. Em tempos de emergência e crise, onde nem mesmo a norma é capaz de cobrir a pluralidade dos casos que a realidade nos apresenta, é necessário desenvolver a capacidade de um discernimento maduro capaz de compreender não o que é útil para si, mas aquilo que constitui "o melhor possível” a ser feito para progredir na caridade e no bem comum.

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