LabCidade ajuda a pensar em soluções de moradia para o Brasil

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11 Abril 2019

Do primeiro andar da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, na capital paulista, um grupo de pessoas pensa sobre questões que afligem as cidades do Brasil. O País que abriga a oitava maior cidade do mundo, São Paulo, possui desafios singulares, relacionados à habitação e moradia dignas para todos, que são enfrentados pela equipe do LabCidade.

A reportagem é de Denis Pacheco, publicada por Jornal da USP, 09-04-2019.

O LabCidade é um laboratório de pesquisa e extensão que tem como foco principal o acompanhamento crítico das políticas urbanas e habitacionais, particularmente em São Paulo e em outras regiões metropolitanas brasileiras. Além disso, a iniciativa se coloca na linha de frente dos problemas da cidade, propondo uma intervenção direta no debate público.

Coordenado pelas professoras Paula Freire Santoro e Raquel Rolnik, o LabCidade conta com cerca de 20 pesquisadores das áreas de arquitetura e urbanismo, direito, geografia, ciências sociais e comunicações, de graduação, pós-graduação e pós-doutorado.

Originado a partir de um laboratório voltado para o direito à paisagem, coordenado pelo professor Euler Sandeville, o LabCidade começou a tomar a forma atual por volta de dez anos atrás, em 2008, com a entrada da professora Raquel. Sua admissão na USP coincidiu com o período em que assumiu a relatoria especial da ONU sobre moradia adequada.

“Uma decisão importante, na época, foi enraizar o trabalho da relatoria também como um trabalho de pesquisa e extensão da USP”, conta a pesquisadora. “Nesse sentido, o professor Euler ofereceu o espaço do LabCidade para que pudéssemos desenvolver projetos de apoio à relatoria, focalizando projetos no âmbito da pesquisa e extensão na FAU”, esclarece.

Um ano depois, em 2009, nasceu o Núcleo de Direito à Cidade, que permanece parte da estrutura básica do que é o LabCidade hoje, em conjunto com o Núcleo do Direito à Paisagem.

“Começamos a trabalhar comigo na coordenação e, inicialmente, bolsistas de extensão, seguidos por bolsistas de iniciação científica”, explica a professora ao enfatizar que uma das bases que mantiveram o laboratório em atividade veio por meio de apoios financeiros de fora da Universidade.

A partir de apoios da Agência Sueca de Cooperação para o Desenvolvimento Internacional (sigla em sueco Sida), também participante da relatoria da ONU, e verbas vindas do Consulado da Alemanha no Brasil, o LabCidade cresceu para poder oferecer uma quantidade robusta de bolsas para alunos e pesquisadores interessados em trabalhar nos primeiros projetos do grupo.

Unindo pesquisa e ação

O primeiro trabalho, um projeto de disseminação do direito à moradia adequada, gerou de saída frutos concretos, como um site criado para a relatoria em três idiomas (português, inglês e espanhol), além de uma série de documentos escritos em linguagem acessível e ilustrados para traduzir os conceitos de direito à moradia, “ampliando a mensagem na direção de profissionais de outros campos, envolvidos com a questão da moradia, como arquitetos, urbanistas, engenheiros e público em geral”, enumera Raquel. “Era uma ação claramente comunicacional”, sintetiza a professora.

O material, que permanece disponível na internet, está abrigado nos servidores da USP e pode ser acessado pela plataforma do LabCidade, onde também se encontra toda a sua produção, de uma década.

Na sequência, o grupo iniciou um projeto de pesquisa, com apoio da Fapesp, focado na discussão sobre o financiamento da habitação e desenvolvimento urbano no Brasil. “Estávamos tentando entender de que forma as fontes de financiamento existentes dialogavam com a própria estrutura dos municípios do Estado de São Paulo”, explica Raquel. A ideia era entender como essas cidades poderiam oferecer melhores condições de moradia para sua população.

Mesmo com as raízes na extensão, o LabCidade jamais deixou de engrenar em pesquisas acadêmicas de fôlego. “Nós nunca deixamos de ter um lado pesquisa numa perspectiva mais acadêmica, no sentido de propiciar espaços para produção de dissertações de iniciação, mestrado, teses de doutorado, artigos científicos, eventos acadêmicos”, reforça ela ao pontuar que, concomitantemente, o trabalho de extensão do grupo era traduzido para o mundo acadêmico.

“Em 2012, participamos de um edital aberto pelo CNPq de avaliação do programa Minha Casa, Minha Vida, com outros grupos de pesquisa no Brasil”, conta ela. “Montamos uma rede de grupos de pesquisa e o produto disso está na plataforma do LabCidade.” De acordo com Raquel, desde então, o laboratório continua fazendo acompanhamento de política habitacional.

Depois de encerrada a fase de colaboração com a relatoria, que finalizou suas atividades em 2014, o LabCidade também manteve a linha de buscar apoio financeiro privado para sustentar grandes projetos de interesse público. Com auxílio da Fundação Ford, entidade americana criada para financiar programas de promoção da democracia e redução da pobreza, o LabCidade encontrou apoio para iniciar ao todo seis projetos numa parceria que já dura oito anos.

Um desses projetos, o maior atualmente, é o Observatório das Remoções, iniciativa que tem como meta monitorar e desenvolver ações colaborativas em territórios ameaçados de remoções que desrespeitam as condições de moradia digna nos municípios de São Paulo e do ABC.

O observatório trabalha em duas linhas, a primeira delas envolve o mapeamento das remoções na região metropolitana de São Paulo. “São os casos de comunidades que são forçadas a sair do local onde vivem sem ter uma moradia adequada que lhe seja oferecida”, esclarece Raquel ao destacar o quão invisível é esse problema, cujo mapeamento enfrenta dificuldades únicas.

“A outra linha se chama Observando de Perto, que tem a ver com pesquisa-ação, ou seja, entender melhor quem está sendo atingido, para onde essas pessoas vão, quais são os impactos”, explica. Em 2018, por exemplo, o grupo voltou os olhos para a região dos Campos Elíseos, bairro da região central de São Paulo, que abriga a cracolândia, cuja população sofre constantemente com ações policiais, muitas vezes, violentas.

Além desses trabalhos, o LabCidade também é responsável pela iniciativa ObservaSP, um trabalho grande envolvendo uma equipe de comunicação formada no laboratório, que faz um acompanhamento crítico da política urbanística de São Paulo. “Estamos trabalhando muito acompanhando as parcerias público-privadas (PPPs), quais são as transformação do Estado [diante delas] e qual o impacto nas formas de governança a partir desses novos instrumentos e mecanismos”, informa a professora. O ObservaSP é coordenado pela professora Paula Santoro.

LabCidade (Ilustração: Caio Vinícius Bonifácio / Jornal da USP)

Futuro é mais participação no debate

Ampliar parcerias internacionais, consolidar novas redes de pesquisa e emplacar mais um projeto temático duradouro, de cinco anos, estão entre os planos futuros do LabCidade. No ano passado, o grupo assinou convênios com o Ministério Público de São Paulo, incluindo aí formação mútua de pesquisadores e profissionais, além de troca de informações. “Queremos consolidar mais parcerias com instituições públicas”, anuncia Raquel.

De olho em temas como financeirização da cidade e governança pública, os pesquisadores do LabCidade pretendem aumentar a gama de temas cobertos pelo grupo. “A professora Paula está constituindo um grupo de estudos sobre gênero e políticas urbanas, por exemplo”, revela ao reforçar que a ideia é manter o interesse diversificado, criando subgrupos que possam pesquisar e construir novos projetos de pesquisa, sempre buscando diferentes fontes de financiamento.

“Estamos no debate público, disputando narrativas sobre habitação a partir dos resultados das nossas pesquisas”, sumariza Raquel, confiante da importância de lugares que unem pesquisa e extensão como o LabCidade. “A Universidade precisa disso, especialmente no nosso campo, das ciências sociais aplicadas”, afirma.

Mensurados por métricas distintas dos grupos, núcleos e laboratórios que partem das chamadas ciências duras (as exatas, por exemplo), o LabCidade não gera patentes, possui projetos longos de pesquisa que não dão resultados imediatos, o que pode ser pouco compreendido por parcela da comunidade científica.
“Mas para quem está lá, na cracolândia, sofrendo ameaças, a existência de um laboratório de pesquisa da USP dizendo que o que está acontecendo ali não é certo, faz toda a diferença do mundo”, enfatiza Raquel ao concluir: “É uma das riquezas da USP”.

Mais informações acesse aqui.

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