China. Repressão de Xi Jinping não deveria surpreender ninguém

Mais Lidos

  • “Os israelenses nunca terão verdadeira segurança, enquanto os palestinos não a tiverem”. Entrevista com Antony Loewenstein

    LER MAIS
  • Golpe de 1964 completa 60 anos insepulto. Entrevista com Dênis de Moraes

    LER MAIS
  • “Guerra nuclear preventiva” é a doutrina oficial dos Estados Unidos: uma visão histórica de seu belicismo. Artigo de Michel Chossudovsky

    LER MAIS

Revista ihu on-line

Zooliteratura. A virada animal e vegetal contra o antropocentrismo

Edição: 552

Leia mais

Modernismos. A fratura entre a modernidade artística e social no Brasil

Edição: 551

Leia mais

Metaverso. A experiência humana sob outros horizontes

Edição: 550

Leia mais

07 Julho 2018

No terceiro aniversário do interrogatório de 300 advogados, um olhar para como a história recente moldou Xi como um homem duro, que ninguém viu chegar.

“O que pensávamos que eram imutáveis normas internacionais foram desrespeitadas da mesma forma que Xi ignorou aqueles opositores do partido”, escreve Michael Sainsbury, jornalista, em artigo publicado por La Croix International, 06-07-2018. A tradução é de Victor D. Thiesen.

(Foto: Reprodução La Croix International)

Eis o artigo.

09 de julho (9/07) marca o terceiro aniversário do que é agora conhecido na China como o “907” [709, no original em inglês, nde], dia de um movimento de repressão feito pelo presidente Xi Jinping, líder do Partido Comunista, sobre um dos grupos mais corajosos de advogados de todo o mundo: os weiquan, advogados de direitos humanos da China.

No dia 09 de julho de 2015 [9/07], cerca de 300 advogados, assistentes jurídicos e ativistas de toda a China foram reunidos para um interrogatório. A maioria foi interrogada e solta, mas cerca de 40 foram levados sob custódia.

Muitos disseram que eles foram torturados, espancados, algemados e que foram dados choques elétricos, enquanto outros disseram que foram privados de sono e forçados a tomar uma medicação.

O grupo tem sido alvo do partido, particularmente durante a repressão de três anos que seguiu junho de 1989, conhecido como Massacre da Praça Tiananmen, quando pelo menos mil pessoas foram mortas.

Muitos têm sido presos nas últimas décadas, mas sob o domínio de Xi, agora em seu sexto ano, foi reforçado o processo de eliminar os inimigos e os inimigos suspeitos, e pela primeira vez desde Mao Zedong, Xi introduziu um programa sistemático de perseguição religiosa.

As religiões locais, budismo e taoismo, são visadas pela sua comercialização — alguns templos têm cobrando turistas para entrar — mas os principais alvos são as religiões "estrangeiras" do cristianismo e do islamismo.

Mesmo assim, qualquer um que saiba sobre o partido comunista da China e sua história não deveria ficar surpreendido pelos movimentos de Xi, nem por sua intensidade.

Sob Mao, a vida era mais simples: você aprontou você é banido, atirado na prisão ou baleado. Dependeria do quanto Mao pensou que poderia precisar de você no futuro.

Quando o poder de Mao foi ameaçado, ele introduziu o conceito de revolução permanente junto com a destrutiva Revolução Cultural em 1966 que oficialmente só terminou com sua morte uma década mais tarde.

Mas a destruição econômica decorrente desse processo fez com que Mao trouxesse de volta a cena Deng Xiaoping, um homem que tinha banido duas vezes, pois sabia que era muito inteligente e profundamente leal ao partido.

Uma vez que Deng finalmente tomou o cargo, seu programa foi introduzido com virulência. Ele reconciliou sua tendência à ordem capitalista com seu coração marxista-leninista pelo famoso aforismo que justificaria o capitalismo num estado socialista: "Não importa se um gato é preto ou branco contanto que pegue ratos."

Deng estava determinado a tentar colocar nos altos escalões homens que pensavam do seu modo, que queriam mudar a feição da China.

O primeiro, Hu Yaobang, um colega de longa data de Deng, foi demitido após a primeira onda de protestos estudantis de 1986 e 1987. As manifestações deram aos radicais do partido uma justificativa para derrubá-lo.

O sucessor de Hu, Zhang Zemin, que pensava parecido, durou apenas dois anos antes de ser removido por ter efetivamente permitido os protestos da Praça Tiananmen e depois ter ido até a praça para implorar aos manifestantes que fossem embora. Neste tempo todo, Xi Jinping estava observando a intensificação dos conflitos nos bastidores enquanto subia na hierarquia.

Em 04 de junho de 1989, Deng tomou o lado dos extremistas e chamou unidades militares de cerca de doze províncias para garantir que qualquer simpatia pelos manifestantes por parte das unidades militares de Beijing seria suplantada.

Até o massacre, o Ocidente pensou que estava lidando com um novo e pacífico protocapitalismo chinês, até que Deng colocou à mostra seus dentes revolucionários.

Jiang Zemin, chefe do partido em Xangai, foi transferido para Pequim como sendo supostamente neutro, para acalmar os ânimos. Mas ele logo demonstrou suas próprias habilidades políticas tomando o controle do exército e permanecendo na liderança do partido até 2002. Após a morte de Deng, em 1997, Jiang despachou impiedosamente qualquer opositor.

Por volta de 2000, o socialismo com características chinesas (fazendo muita grana) viu empresas privadas superarem empresas estatais na participação do PIB pela primeira vez. Jiang percebeu que esse novo tipo de ideologia livre, com empreendedores multi-milionários, estava se multiplicando rapidamente e criando uma nova ameaça para o partido.

Em 2001, a ideia genial de Jiang foi cooptar estes multi-milionários ao seio do partido comunista nomeando eles ao Congresso Nacional do Povo (CNP) e ao Comitê Consultivo do Povo Chinês.

A solução caiu como uma luva e hoje as pessoas como os três grandes bilionários da tecnologia— Jack Ma do Alibaba, Ma Huateng da Tencent, e Robin Li do Baidu — estão entre os mais de 100 empresários dentro do CNP, composto por 300 pessoas.

A desvantagem era que o movimento permitiu que o capitalismo de compadrio entre empresários e os quadros superiores crescesse sem controle.

Na sua ascensão em 2012, Xi Jinping, deslocou Wang Qishan de tenente para chefe do Comitê de Disciplina Central do Partido, que foi formatado numa espécie de guarda pessoal de Xi: eliminava corruptos para agradar as massas e os inimigos do líder para esmagar as facções.

O compromisso de XI era se tornar algo como um novo Mao Zedong com menos caprichos e com um plano real.

Ele desfez tradições criadas por Deng, como uma liderança nominalmente coletiva. Xi se instalou como líder dos principais grupos do partido que definiam a política para criação de novos grupos internos, controlando, portanto, as facções emergentes.

Fez isso em nome de reafirmar a primazia do Partido. Contudo, pode ser uma espada de dois gumes. Veremos ao longo do tempo.

Em vez de "matar a galinha para assustar os macacos", Xi está matando celeiros inteiros para se certificar de que os macacos vão embora e não voltem.

As primeiras palavras de Xi quando subiu ao púlpito depois de ser apresentado como novo chefe do partido em novembro de 2012 foram sobre o "sonho chinês."

Estamos começando a ver as feições desse sonho, e está mais parecido com um pesadelo para o resto do mundo. O que pensávamos que eram imutáveis normas internacionais foram desrespeitadas da mesma forma que Xi ignorou aqueles opositores do partido.

Alguns, como sagaz e implacável velho ditador do Camboja, Hun Sen, caíram aos pés do Imperador Xi e foram recompensados.

É improvável que ele seja o último. 

Leia mais

Comunicar erro

close

FECHAR

Comunicar erro.

Comunique à redação erros de português, de informação ou técnicos encontrados nesta página:

China. Repressão de Xi Jinping não deveria surpreender ninguém - Instituto Humanitas Unisinos - IHU