“Não se trata de esquerda e direita, as pessoas vão contra as elites"

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Por: Cesar Sanson | 29 Fevereiro 2016

"A elite será substituída, seja de direita ou esquerda. A sociedade latino-americana quer igualdade perante a lei e direitos sociais, e acesso à justiça". 

A opinião é da chilena Marta Lagos que dirige há 20 anos o Latinobarómetro, a mais respeitada organização de pesquisas da região, em entrevista a Carlos E. Cué publicada por El País, 28-02-2016. 

Segundo ela, "as sociedades latino-americanas sempre foram muito controladas. Agora já não bastam o subsídio, a política paternalista, os caudilhos, o populismo (...) O povo latino-americano é mais sensível que sua elite. Os latino-americanos não são eleitores ignorantes e manipuláveis. A aprovação dos governos caiu 25 pontos em média nos últimos cinco anos. Ninguém mais aplaude os governantes".

Eis a entrevista.

Por que ocorre essa mudança na América Latina?

Existe um padrão, se chama melhorar a democracia, existe uma demanda de mais e melhor governo e mais democracia, que vem desde 2010. Até essa data as pessoas acreditavam que as elites eram capazes de mudar substancialmente as condições de vida de um país. Essa convicção é quebrada, os protestos começam. Acaba o medo de se expressar deixado pelas ditaduras. As sociedades latino-americanas sempre foram muito controladas. Agora já não bastam o subsídio, a política paternalista, os caudilhos, o populismo.

Existe uma guinada à direita?

Não vejo isso. 2003-2008 foi o quinquênio virtuoso. O nível de educação cresce, o nível econômico aumenta. As pessoas perceberam que é possível ser diferente no econômico, mas não somos diferentes no social. Agora surge a demanda social. A derrota de Morales acaba por confirmar que não restará pedra sobre pedra, o tanque irá passar por cima dos que governaram, sejam de direita ou esquerda.

A esquerda foi atingida por essa derrota porque existiam muitos governos de esquerda e porque prometia acabar com a desigualdade, erradicar a pobreza.

Na Bolívia os avanços são enormes em mobilidade social e inclusão, mas não com a rapidez exigida pela população.

Com Michelle Bachelet e Dilma Rousseff acontece a mesma coisa, as pessoas dizem fazem muito, mas não o que eu quero.

E agora o Peru. Mas Keiko Fujimori pode sair daqui a quatro anos se não funcionar.

Assim como Macri. As pessoas vão contra as elites. Não se trata de esquerda e direita, são as elites, que no fundo se comportaram como sempre.

O que pede a população?

As pessoas querem o fim da corrupção, que a representação seja mais ampla, mais igualdade perante a lei. Atinge a esquerda, mas não é ela a responsável. A causa é o desenvolvimento tardio da democracia.

70% da população da América Latina diz que a democracia não trouxe garantias sociais, acesso à moradia, saúde, educação. As sociedades latino-americanas não têm seguro-desemprego, ajudas. As pessoas já não querem mais esperar. A elite será substituída, seja de direita ou esquerda. A sociedade latino-americana quer igualdade perante a lei e direitos sociais, e acesso à justiça. Agora somente os que podem pagar um advogado os têm.

As novas gerações pedem mais?

No Latinobarómetro vemos que 20% dos jovens menores de 25 anos que só têm uma refeição por dia, que são pobres, preferem gastar seu dinheiro em um smartphone ao invés de em uma segunda refeição. Porque sabem que seu futuro está nessa pequena tela, veem o mundo e dizem quero estar ali.

Disseram a Morales que fez um bom trabalho, mas seu tempo já passou. O povo latino-americano é mais sensível que sua elite, a Bolívia demonstra isso. Os latino-americanos não são eleitores ignorantes e manipuláveis. A aprovação dos governos caiu 25 pontos em média nos últimos cinco anos. Ninguém mais aplaude os governantes.