Católicos denunciam restrições à assistência espiritual em prisões brasileiras

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16 Dezembro 2025

Restrições reiteradas impostas por governos estaduais e diretores de presídios à assistência espiritual oferecida aos detentos no Brasil levaram a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) a solicitar diretamente ajuda ao ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, no fim de novembro.

A informação é de Eduardo Campos Lima, publicado por Crux, 15-12-2025. 

Agentes da Pastoral Carcerária relatam que muitas unidades prisionais bloqueiam seu acesso por longos períodos, alegando obras em andamento ou uma suposta incapacidade de garantir a segurança. Mas não é só isso.

O padre Almir Ramos, vice-presidente da Pastoral Carcerária, disse ao Crux que tanto o acesso às prisões quanto a realização das atividades planejadas têm sido limitados em todo o Brasil nos últimos anos.

“O sistema penal impõe várias restrições. Em muitos lugares, os agentes pastorais não conseguem se aproximar dos detentos. Só podemos falar com eles por meio de uma pequena portinhola ou de um nível superior para um inferior”, afirmou.

A agente pastoral Rosilda Ribeiro contou que, em sua região, no estado de Mato Grosso do Sul, tudo mudou com a pandemia de Covid-19. “Antes, podíamos visitar os detentos a cada duas semanas. Agora, é apenas uma vez por mês — e por apenas uma hora”, disse.

Enquanto as prisões femininas têm menos internas, os presídios masculinos podem abrigar centenas ou até milhares de presos. Com uma equipe de cinco ou seis agentes atuando por apenas uma hora, o tempo efetivo disponível para conversar com cada pessoa torna-se muito limitado.

Diante disso, a Pastoral Carcerária passou a agendar missas semanais — uma estratégia para estar próxima dos presos apesar das restrições.

O padre Marcelo Moreira Santiago, coordenador da Pastoral Carcerária em Minas Gerais, disse ao Crux que muitos presídios têm menos agentes penitenciários e funcionários do que o necessário.

“Então, quando chegamos para a visita, eles dizem que estão com falta de pessoal e que, por razões de segurança, não podemos entrar. Mas isso acontece com bastante frequência”, afirmou.

Para piorar, as visitas costumam ser marcadas para a manhã ou a tarde, horários em que muitos agentes pastorais estão em seus trabalhos regulares.

“Na cidade de Mariana, onde acompanho essas visitas com mais frequência, elas acontecem às sextas-feiras, às 15h. É impossível para a maioria das pessoas comparecer”, acrescentou.

Ramos relatou que alguns presídios implantaram um sistema de rádio interno e informaram à Pastoral Carcerária que ela deveria enviar um pen drive com o conteúdo a ser transmitido aos detentos — e que esse seria o único contato permitido.

“Em outras palavras, eles não querem que a Pastoral entre na prisão”, explicou.

A demora na emissão de credenciais para os agentes pastorais é outro problema recorrente. Em alguns casos, o processo leva tanto tempo que, quando os documentos finalmente chegam, já estão vencidos.

“Entrar nas prisões com objetos litúrgicos e vinho é outro desafio. Em algumas instituições, é quase impossível”, acrescentou Ramos.

Os agentes pastorais reconhecem que existem razões reais para o sistema penal criar obstáculos ao seu trabalho. Em primeiro lugar, a Pastoral Carcerária não se limita a oferecer apoio espiritual. Ela também monitora as condições de vida dos detentos, denuncia injustiças e violações de direitos humanos e pressiona as autoridades pelas mudanças necessárias.

“Nossa pastoral muitas vezes é punida por denunciar maus-tratos. O sistema impõe restrições ou entraves burocráticos às nossas visitas”, disse Santiago.

Rosilda Ribeiro concorda. “O sistema é parcialmente fechado à Igreja Católica porque nossa perspectiva leva em conta a dignidade humana — e isso muitas vezes não é aceito”, explicou.

Ao mesmo tempo, muitas prisões são bastante abertas a igrejas evangélicas, como a Igreja Universal do Reino de Deus.

“Há alas específicas dominadas por igrejas evangélicas, com detentos que são pastores. Ouvimos relatos de presos que tiveram de se converter e se tornar evangélicos para sobreviver no sistema”, descreveu Ramos.

Segundo Santiago, algumas dessas igrejas atuam intensamente para converter agentes penitenciários e diretores, o que leva à criação de privilégios para suas ações dentro das unidades prisionais.

Durante o governo do ex-presidente Jair Bolsonaro (2019-2022), o sistema penal no Brasil foi parcialmente militarizado. A presença católica foi limitada em vários estados, enquanto a das igrejas evangélicas cresceu.

“Com o atual governo [do presidente Luiz Inácio Lula da Silva], algumas políticas aprovadas pelo governo já começaram a mudar esse cenário. Esperamos que tenham sucesso”, disse Ramos.

A irmã Petra Pfaller, alemã e coordenadora nacional da Pastoral Carcerária, visitou o ministro da Justiça, Ricardo Lewandowski, em 18 de novembro, junto com o bispo auxiliar de Brasília,  dom Ricardo Hoepers, secretário-geral da CNBB, para entregar um relatório sobre os obstáculos à assistência espiritual nas prisões.

O documento mostrou que 64% dos agentes pastorais já foram impedidos de entrar em presídios devido aos itens religiosos que levavam consigo. Entre junho de 2022 e outubro de 2025, houve 18 casos de violação do direito à assistência religiosa dos detentos.

Segundo Pfaller, Lewandowski ouviu atentamente as demandas da pastoral. “Ele se comprometeu a nos ajudar. No próximo ano, haverá um evento para tratar do problema”, afirmou.

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