Meu novo velho amigo Pedro. Entrevista com Roberto Benigni

Foto: mingchee lee/Pexels

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15 Dezembro 2025

Roberto Benigni fala como um homem apaixonado, freneticamente. Ele fez isso por mais de duas horas no dia 10 de dezembro, falando para milhões de telespectadores, mas continua a fazê-lo também nas conversas privadas, um a um, cara a cara, como se tomado por uma urgência, contando ao mundo sobre seu amor, sobre seu novo velho amigo, Pedro, o pescador de Cafarnaum. Então é fácil conversar nessas condições, basta dar o tom e o concerto pode começar.

A entrevista é de Andrea Monda, publicada por L’Osservatore Romano, 13-12-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.

Eis a entrevita.

Mas como nasceu essa amizade “triangular” entre você, Pedro e Jesus?

Exatamente assim, Pedro é o melhor amigo de Jesus, mas agora ele também se tornou meu melhor amigo. Tudo aconteceu há muito tempo. O grande cineasta texano Terrence Malik, de A Árvore da Vida e Além da Linha Vermelha, me procurou e disse que estava fazendo um filme sobre São Pedro e me propôs para interpretar ninguém menos que o diabo, o tentador. É desde então comecei a ler textos e livros sobre São Pedro e, assim, comecei a me apaixonar perdidamente por ele. Porque ele não é como Paulo, o intelectual, o helenizado Paulo, nem como João, o místico; ele é Pedro. Era meu pai, um agricultor, um pescador. É um homem verdadeiro, que comete erros, que depois se arrepende, que chora e não sabe o que fazer. Eu disse: entrou no meu coração, como eu o amo! Além disso, imaginar que ele tinha vinte e oito, vinte e nove anos... quando conheceu Jesus, mais ou menos a mesma idade dele, eram todos jovens, essa é uma história de jovens, uma história maravilhosa, com todas as suas emoções, seus sentimentos, um grupo de jovens que queria conquistar o mundo... e conseguiram!

Um grupo de jovens, você me faz lembrar que durante o monólogo citou a Revolução Francesa: bem, aquela também foi feita por um grupo de jovens, Robespierre e os outros tinham quase todos vinte e poucos anos, todos eles. Mas qual é a diferença? Você menciona isso quando fala da grande revolução do cristianismo...

Não, não... a Revolução Francesa foi algo imenso. Liberdade, igualdade e fraternidade eram princípios enormes do ponto de vista político e histórico; foi um momento crucial na história da humanidade. Só estou dizendo que me faz rir quando a comparo com a revolução que Jesus provocou. Porque a revolução de Jesus foi a invenção do amor e, portanto, também da fraternidade e da solidariedade. Porque o cristianismo não é uma adesão a certas regras, mas uma revolução do amor. Jamais teria ocorrido a Jesus usar a guilhotina contra seus inimigos, porque ele proferiu a frase mais revolucionária, sublime e memorável da história da humanidade e do pensamento humano: "Ame o seu inimigo". É uma frase que divide a humanidade em duas. Uma frase sublime, e não conseguimos alcançá-la justamente por ser sublime demais. Mas alguém a disse, e a disse para sempre. Isso permanecerá para sempre. Ame o seu inimigo é algo que não cabe em nossos corações, algo de maravilhosa beleza. E como não amar Pedro, o melhor amigo de alguém que disse algo assim?

Pedro, você o chamou de "um homem no vento". Talvez esse vento é o amor de que você está falando?

Bem, sim, é um segredo de Polichinelo. Fala-se dele do começo ao fim, e ele está lá, por baixo de tudo. O que é essa força que levou Pedro de sua pequena aldeia nos confins do império ao centro do grande império, e o fez conquistá-lo? Uma força imensa. Algo novo porque Pedro não conhecia o amor, pelo simples fato de Jesus tê-lo inventado, tê-lo fundado. Antes, não existia.

Não só Pedro, ninguém mais no mundo o conhecia. A caridade era conhecida, aquela de São Paulo, mas o amor no sentido moderno como nós o entendemos foi inventado por Jesus. Quando dizemos "eu te amo", quando dizemos "o amor", esse amor que temos hoje é algo inventado por Jesus.

E Pedro o descobre junto com Jesus e talvez só no final ele se dê conta. De fato, ele lhe diz: "eu te amo". Ali, no Mar da Galileia, com Jesus ressuscitado, Pedro não consegue dizer "eu te amo" porque não sabe o que é isso, não consegue, está atrapalhado, não sabe, não quer dizer. Quis fazer uma referência biográfica ao meu pai, que para aquela geração era quase uma vergonha, uma fraqueza, dizer "eu te amo". Mas Pedro finalmente o diz, repete, e é a coisa mais corajosa do mundo. É preciso coragem para falar de amor, uma coragem enorme. Amar, dizer e demonstrar amor, é a coisa mais corajosa do mundo. E assim Pedro descobre o amor. É por isso que o monólogo termina precisamente com essa palavra: "Eu te amo".

Vou citar um poeta que talvez você conheça: "O amor que move o sol e as outras estrelas". Dante está falando do mesmo amor, uma força que age, que move tudo. Seria esse o amor, uma grande força? No entanto, se perguntarmos hoje o que é o amor, todos, crianças e adultos, respondem que é um sentimento. Mas é muito mais do que isso, não é?

Claro, mas cuidado, o amor também é loucura, como Platão apontou. E Platão, não nos esqueçamos, é o inventor da razão. Ora, se o inventor da razão diz que o amor é loucura, quem fala é alguém que entende do assunto. É o amor de que Dante fala, é precisamente essa força que "move o sol e as outras estrelas". O que Dante diz é a definição de Deus: Deus é "o amor que move o sol e as outras estrelas", Deus é o motor do universo. Não tanto o motor imóvel de Aristóteles, não, é algo diferente. É precisamente essa força, aquela de que Jesus fala quando diz: "Uma força saiu de mim", no episódio da mulher com hemorragia. E depois há o amor de Paolo e Francesca, "Amor, que amar a amados não perdoa". Quando Jesus sente que uma força saiu dele por essa mulher que toca a orla de seu manto, ele compreende que é o amor que derramou amor, que tudo isso é amor, e ninguém que é amado se permite não amar em troca. Essa mesma força retorna quando se ama. Esse amor não se perderá no tempo, ele estará lá para sempre, pela eternidade. Vocês amam, e esse amor permanecerá para sempre e lhe será devolvido. Ele voltará. É algo imenso.

O amor como motor de tudo. A pergunta da qual inicia o monólogo é: "Mas o que motivou Pedro?" Porque Pedro está aqui, enterrado em Roma, mas até a metade da sua vida ele estava lá, na Palestina, um pescador tranquilo, ainda que nervoso, talvez até mal-humorado, mas um simples pescador. Então, o que levou aquele homem a morrer aqui em Roma? Deve ter sido algo forte, como um big bang, uma explosão que o impulsionou para cá.

Exatamente: o que aconteceu? O que aconteceu quando ele encontrou aquele homem que o olhou e num instante lhe disse quem ele era, quem ele é e quem ele será, chegando a mudar o seu nome? E Pedro deixou que o fizesse, não se moveu, também porque não sabia o que fazer. Como quando ele anda sobre as águas e, no início, ele também caminha. Essa é a imagem de Deus e do seu amor: se você se entrega, se abandona com confiança, é como o mar, sustenta; mas se você começa a pensar, então cai e afunda. No amor, você tem que se entregar. Eu também descobri essa poderosa força do amor com Pedro, graças a ele.

Tudo começa, portanto, com um encontro, e a frase que você cita no monólogo é belíssima: as coisas importantes da vida não se ensinam, não se aprendem, mas se encontram. É só isso, o segredo está em um encontro, em uma troca de olhares.

Exatamente assim, a bela frase de Oscar Wilde é belíssima porque é verdadeira. Os encontros que temos transformam nossas vidas. As outras coisas servem muito, muito mesmo, mas o que conta é que aprendemos essas coisas em um encontro onde alguém, com seu olhar, seu jeito, as ensinou a nós. Foi o que aconteceu entre Pedro e Jesus, um encontro que durou alguns anos, no qual, afinal, Jesus lhe ensinou muitas coisas que se resumem a uma só: como amar.

No monólogo, você deixa claro que, se há uma coisa que o cristianismo ensina, o "sinal" que essa fé nos deixa é que começaremos a olhar para os outros não mais de forma distraída, mas como "baús de tesouro", como depositários de um imenso mistério.

Exatamente. Quando se lê o Evangelho, esse encontro transformador acontece. E quando eu o li e reli, senti que algo tinha acontecido, e deixei de olhar para as pessoas distraidamente, como se não tivesse nada, mas passei a olhar para cada uma delas como baús de um mistério, depositárias de um destino. As pessoas, qualquer pessoa, eu olho uma pessoa e digo para mim mesmo: essa pessoa tem um destino à sua espera que nunca terá fim, pela eternidade. É impressionante. E isso vale para cada um de nós, mesmo que nossas noites, nossos dias, digamos, não pareçam excepcionais para ninguém. Cada um de nós é o protagonista de uma história que nunca se repetirá pela eternidade. Única, imensa, memorável.

Mas Pedro, que é Simão, nós o chamamos de São Pedro, me desculpe, que tipo de santo é? É alguém que só comete erros, nunca acerta uma!

Exatamente, e nós o amamos justamente por seus erros, por suas gafes. Quão próximo de nós é Pedro, que quase não entende nada! Quantas vezes, ao ler o Evangelho, eu também penso: não entendo isso, e não encontro ninguém que me explique, como acontecia com Pedro. Foi preciso o próprio Jesus para o fazer. E, como disse a ele, também diz a mim: tens uma cabeça dura!. E então, como Pedro, eu também o teria renegado, porque não suportaria a dor do suplício, da crucificação. E se as coisas tivessem sido diferentes, se Pedro também tivesse morrido, o cristianismo não teria nascido. Então Jesus olha para ele com um olhar de amor, avassalador. Ama-o porque o renegou, sim, também porque o renega. Mas quantas Pedro apronta? Pega no sono, age por impulso, só cria grandes confusões. Ele é realmente como um de nós, engraçado, profundo e comovente.

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