18 Dezembro 2025
Nos últimos meses, vários países europeus têm endurecido suas políticas de imigração, enquanto o novo quadro regulamentar da UE continua a tomar forma: o Conselho Europeu quer deter migrantes irregulares por até 30 meses, em comparação com a proposta já rigorosa de 18 meses da Comissão Europeia.
A reportagem é de Gabriela Sánchez, publicada por El Diario, 09-12-2025.
Confiscar joias de requerentes de asilo, construir centros em países não pertencentes à UE para se livrar de migrantes que desejam deportar; deter requerentes de asilo por três meses após arriscarem suas vidas no mar, complicar os procedimentos de nacionalidade; abrir caminho para encarcerar pessoas que não cometeram nenhum crime em prisões comuns… Essas são algumas das medidas debatidas nos últimos meses em toda a Europa, que, após anos de tentativas frustradas de endurecer as políticas de imigração, continua optando por um maior rigor na migração como forma de reduzir as chegadas irregulares e apaziguar a extrema-direita.
Até agora, neste ano, vários países europeus anunciaram diversas regulamentações nacionais para reduzir a imigração: o Reino Unido, a Alemanha, a França, Portugal, a Suécia, os Países Baixos, a Grécia e a Itália implementaram iniciativas que restringem os direitos dos migrantes. Mesmo a Espanha, que se mantém distante da postura intransigente promovida pela extrema-direita, também aprovou uma reforma que, embora facilite a regularização de milhares de pessoas, desestimula outras milhares a pedir asilo, dadas as novas penalidades impostas àqueles cujos pedidos são rejeitados.
Todas essas iniciativas nacionais estão ocorrendo enquanto a União Europeia finaliza a implementação do Pacto Europeu para as Migrações, que transformará a política migratória em nível da UE e abrirá caminho para uma série de medidas repressivas inimagináveis há uma década, quando o lema “Bem-vindos, refugiados” ainda era o discurso de figuras importantes da Europa. Soma-se a isso três iniciativas legislativas sobre imigração, atualmente em negociação pelas instituições europeias, cuja abordagem estabelece as bases para o retorno de migrantes até mesmo para países com os quais não possuem qualquer vínculo: o Regulamento de Retorno, o Regulamento sobre Países de Origem Seguros e o Regulamento sobre Países Terceiros Seguros.
Meses atrás, a Comissão Europeia introduziu, em sua proposta de regulamento de retorno — que desenvolve as políticas de expulsão e retorno previstas no pacto europeu —, a criação de centros de detenção europeus em países terceiros, com o objetivo de enviar migrantes com ordem de retorno definitiva para esses países, bem como longos períodos de detenção. Nesta segunda-feira, o Conselho Europeu adotou uma postura ainda mais rigorosa após a reunião dos ministros do Interior da UE, incluindo períodos de detenção mais longos, sanções ampliadas contra imigrantes indocumentados (incluindo a possibilidade de penas de prisão) e abriu caminho para o aumento das operações policiais de detenção de pessoas sem documentos.
“Esta nova proposta tem todas as características de um estado policial. Permitir que as autoridades entrem em residências privadas com tal discricionariedade é uma clara tentativa de intimidar qualquer pessoa que ajude outro ser humano e de colocar pessoas necessitadas em ainda maior perigo”, criticou Silvia Carta, gestora de advocacia da Picum, uma ONG sediada em Bruxelas que defende os direitos dos migrantes na UE. “Não podemos permitir que a aplicação das leis de imigração se torne a porta de entrada para a normalização das práticas de um estado policial na Europa”, acrescentou.
Haverá também consequências para as pessoas que receberem ordem de regresso e não cooperarem. Os Estados-Membros podem “decidir negar ou reduzir certos benefícios e subsídios, negar ou revogar autorizações de trabalho ou impor sanções penais”, que, segundo a posição do Conselho, deverão incluir também penas de prisão.
Segundo a Picum, um novo artigo proposto pelo Conselho permitiria às autoridades realizar “batidas domiciliares, investigações e verificações adicionais para efetivar as deportações”.
Os Estados-Membros também defendem períodos de detenção mais longos do que os propostos pela Comissão. Enquanto a Comissão propõe 18 e 24 meses, o Conselho defende uma extensão para 30 meses, inclusive para crianças.
Além disso, estão a criar novos motivos para deter migrantes. "Isto equivale a uma criminalização de facto da pobreza e da exclusão", critica o Picum.
Como era esperado, o Conselho também manteve sua posição sobre a possibilidade de os Estados-Membros estabelecerem centros de deportação fora da UE, apesar da rejeição de alguns países, como Espanha, França e Portugal.
O Conselho manteve a posição inicial de Bruxelas de que esta medida só deve afetar os migrantes que receberem uma decisão definitiva de retorno. A única condição imposta pela Comissão relativamente aos locais onde estas medidas podem ser implementadas é que o Estado-Membro que as aplica tenha um acordo bilateral com o país para o qual pretende enviar os seus migrantes e que respeite os direitos humanos. Contudo, a Comissão ainda não definiu como estas garantias serão monitorizadas, o que abre caminho para a arbitrariedade e para a falta de salvaguardas dos direitos humanos — consequências comuns de processos conhecidos como "externalização das fronteiras", em que um país europeu cede a gestão da migração a um país não pertencente à UE em troca de dinheiro ou da concessão de posições sobre determinados interesses políticos.
O regulamento de retorno é uma das principais medidas com as quais a UE pretende intensificar a detenção de imigrantes e a deportação de pessoas em situação irregular, mesmo em países não pertencentes à UE.
“O chamado ‘Regulamento de Retorno’ estabelece um regime de deportação que perpetua a punição, a violência e a discriminação. Em vez de investir em segurança, proteção e inclusão, a UE opta por políticas que empurrarão mais pessoas para o perigo e para um limbo jurídico”, denuncia a Carta. “A posição do Conselho contraria os princípios fundamentais da humanidade e os valores da UE. Cabe agora ao Parlamento Europeu rejeitar esta abordagem. A gestão da migração deve basear-se na dignidade e nos direitos, e não no medo, no racismo ou na exclusão”, acrescenta a Carta.
Menos garantias
O Parlamento Europeu terá de adotar a sua própria posição negocial nos próximos meses. Posteriormente, ambas as instituições, o Parlamento e o Conselho, precisarão chegar a um texto comum para garantir um acordo.
“A aplicação do mesmo pacto já representa um endurecimento das normas em comparação com o que tínhamos antes, na Europa em geral e ainda mais em Espanha. De um modo geral, torna as coisas mais difíceis, mas dependerá de cada Estado, dado que alguns pontos podem ser aplicados de forma mais protetiva”, argumenta Elena Muñoz, assessora jurídica da CEAR.
O acordo europeu prevê o aumento das detenções, a rejeição célere dos pedidos de asilo e o retorno ou expulsão mais rápidos dos migrantes… “Esta tendência é reforçada pelas três iniciativas legislativas que a UE está a preparar”, salienta Muñoz. Para além do regulamento sobre o retorno, as outras duas iniciativas definem os conceitos de “país de origem seguro” e “terceiro país de origem seguro”, que irão constituir o quadro da nova política europeia de migração.
De acordo com o acordo europeu, aqueles provenientes de um país considerado "seguro" pela UE estarão sujeitos a um procedimento acelerado de análise dos seus pedidos de asilo e terão uma elevada probabilidade de terem o seu pedido rejeitado.
“Este procedimento mina as garantias dos requerentes de asilo, pois impõe prazos muito curtos. E, se a decisão for de negar o asilo, eles recebem uma ordem de retorno diretamente. Podem recorrer, mas isso não impede automaticamente a expulsão, o que reduz os direitos dessas pessoas”, argumenta o advogado do Cear.
O que já foi aprovado
Os Estados-Membros têm até o próximo verão para transpor o Pacto Europeu para a Migração e o Asilo para a sua legislação nacional e criar a infraestrutura necessária para a sua implementação. A implementação do acordo alterará, entre outras coisas, o procedimento ativado em casos de chegadas irregulares. Por exemplo, após o desembarque de uma das pequenas embarcações que frequentemente chegam às Ilhas Canárias. O novo sistema baseia-se no que muitos especialistas em migração criticamente denominam de "limbo jurídico", em que as pessoas não entram em território da UE ao atravessarem a fronteira, mas ficam numa espécie de terra de ninguém jurídica. Após uma triagem inicial, se os recém-chegados desejarem solicitar asilo, seguem para o processo de asilo. Caso contrário, seguem para o processo de retorno. Em ambos os casos, enquanto as autoridades analisam o pedido de proteção ou enquanto realizam os procedimentos de deportação, esses indivíduos podem ser detidos por um período máximo de três meses, de acordo com o pacto. Após esse período, aqueles que não forem devolvidos serão libertados e ficarão sujeitos à legislação atualmente em vigor.
Em relação ao asilo, o pacto visa agilizar o processamento dos pedidos e, consequentemente, o retorno daqueles que não recebem proteção internacional. Para atingir esse objetivo, estabelece um procedimento acelerado, reduzindo os prazos de processamento, o que, na prática, limita as salvaguardas na análise dos pedidos de asilo. A meta é que esses pedidos sejam resolvidos "o mais rápido possível", em um prazo máximo de três meses.
Um dos principais fatores para determinar quais pedidos serão processados pela via expressa e quais pela via padrão será o país de origem do requerente. A UE criará uma lista comum de "países de origem seguros", uma iniciativa bastante controversa devido à arbitrariedade dos critérios de seleção. Ela também permite que cada Estado-membro mantenha sua própria lista. A lista ainda não é definitiva, mas a proposta da Comissão Europeia inclui países como Marrocos e Turquia. E o Conselho aprovou essa lista.
Além dos cidadãos desses países, os Estados também terão que agilizar os pedidos de nacionais cuja nacionalidade represente menos de 20% do total de pedidos de asilo na UE. Isso também se aplica a requerentes que representem uma ameaça à "segurança e à ordem pública", àqueles com evidências de fraude, a um relato "pouco convincente" dos fatos ou àqueles que se registraram tardiamente após sua chegada à UE. O direito ao asilo é, portanto, limitado por diversos fatores, uma situação que preocupa as organizações especializadas em proteção internacional.
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