17 Novembro 2025
A COP30 entra em sua semana final em Belém com a chegada dos ministros para as negociações mais difíceis.
A reportagem é de Manuel Planelles, publicada por El País, 17-11-2025.
A cidade amazônica de Belém entra na reta final da COP30, a cúpula anual do clima realizada sob os auspícios da ONU, que começa nesta segunda-feira. A partir de agora, ministros de alguns dos quase 200 países que normalmente participam dessas negociações começarão a liderar as discussões nesta cidade brasileira. Entre segunda e terça-feira, representantes de cerca de 150 países, em sua maioria ministros, devem discursar na sessão plenária da conferência.
A cúpula começou em 10 de novembro e, em princípio, deveria terminar no dia 21, embora o encerramento dessas reuniões seja sempre atrasado por horas ou dias devido à complexidade das negociações. A cúpula deste ano deve servir como um barômetro da luta internacional contra as mudanças climáticas em um contexto de extremo questionamento do multilateralismo. Estes são alguns dos pontos-chave da conferência.
O momento mais difícil
A Cúpula de Belém é a trigésima COP realizada desde a adoção da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, em 1992. Desse arcabouço geral surgiram, primeiro em 1997, o Protocolo de Quioto e, posteriormente, o Acordo de Paris, que este ano comemora seu décimo aniversário desde sua assinatura na COP realizada na capital francesa em 2015.
Mas a cúpula deste ano acontece no pior momento possível para a luta internacional contra as mudanças climáticas em pelo menos uma década. A ascensão de governos ultraconservadores, muitos dos quais alinhados com a negação das mudanças climáticas, está impactando as políticas climáticas e ambientais. Liderando essa onda está o governo Trump, que não participa da cúpula de Belém e retirou os Estados Unidos do Acordo de Paris, uma medida que entrará em vigor em janeiro. Além disso, em diversos fóruns internacionais, o governo está adotando posturas ameaçadoras em relação a países que buscam avançar com medidas contra as mudanças climáticas. Prova dessa conjuntura crítica é a baixa participação de chefes de Estado na minicúpula realizada há uma semana, no início da COP30, organizada pelo governo brasileiro.
Planos nacionais para o clima
O Acordo de Paris visa reduzir as emissões de gases de efeito estufa causadas pela atividade humana, de modo que as mudanças climáticas resultantes permaneçam dentro de limites seguros. Especificamente, a meta era limitar o aquecimento a no máximo 2 graus Celsius acima dos níveis pré-industriais e, idealmente, a 1,5 graus.
Para atingir esse objetivo, o acordo estipula que todos os países que o ratificaram, quase 200, devem apresentar planos para reduzir suas emissões, conhecidos pela sigla NDC.
A primeira rodada desses planos, que contém os compromissos até 2030, não colocou os países no caminho certo para manter o aquecimento abaixo de 1,5 ou 2 graus Celsius. A segunda rodada concentra-se em metas de redução de emissões até 2035. E também não corrige a situação.
Muito longe da meta de 1,5 graus
Este segundo lote de NDCs deveria ter sido submetido em fevereiro de 2025. Mas praticamente nenhum país o fez. No final, apenas 114 países — 60% dos que ratificaram o Acordo de Paris — as submeteram à ONU, muitos deles depois do início da COP30. De acordo com os cálculos da ONU, a soma das NDCs (se de fato cumpridas) levaria a uma redução de 12% nas emissões até 2035, em comparação com os níveis de 2019. Para atingir a meta de 1,5 grau, essa redução precisaria ser de 55%, quatro vezes e meia maior do que o previsto nesses planos nacionais. Para a meta de 2 graus, a redução até 2035 precisaria ser de 35%, três vezes maior do que o estipulado nas NDCs submetidas pelos governos.
Os cálculos da ONU sugerem que, se as últimas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) forem cumpridas, o aquecimento poderá ser limitado a cerca de 2,5 graus, mas esta é uma estimativa repleta de incertezas.
Tudo isso poderia acontecer com promessas nacionais, mas o que de fato ocorreu nas últimas décadas é que as emissões aumentaram quase todos os anos. As emissões do principal gás de efeito estufa, o dióxido de carbono, voltarão a subir em 2025, segundo os especialistas que compilam o Orçamento Global de Carbono. Aliás, os cientistas acreditam que o limite de 1,5 grau será consistentemente ultrapassado na próxima década. A única possibilidade restante seria tornar essa ultrapassagem temporária e, em seguida, alcançar uma redução por meio da eliminação de outros gases de efeito estufa, como o metano, e das técnicas incertas de captura e armazenamento de dióxido de carbono da atmosfera. De qualquer forma, cada décimo de grau de aquecimento evitado reduzirá os impactos dessa crise.
O que pode sair de Belém?
Durante essas três décadas de negociações e cúpulas, o foco tem sido nas emissões de gases de efeito estufa, mas não nos principais culpados: petróleo, gás e carvão. Muitos dos países envolvidos nas negociações são grandes exportadores desses combustíveis e são justamente eles que defendem que as medidas devem se concentrar nos próprios gases, em vez de restringir o consumo dos combustíveis que causam as emissões.
Na cúpula climática de Dubai, em 2023, houve uma menção direta aos combustíveis fósseis pela primeira vez nas observações finais, com um apelo para uma transição para longe do petróleo, gás e carvão. No entanto, no ano seguinte, na cúpula de Baku, nenhuma referência a esses combustíveis foi feita.
Na minicúpula de líderes que antecedeu a COP25, o presidente brasileiro e anfitrião da conferência, Luiz Inácio Lula da Silva, expressou a necessidade de um roteiro, entre outras coisas, para “superar a dependência de combustíveis fósseis”. Esse apelo foi acolhido por diversos países, incluindo Reino Unido, Alemanha, França e Colômbia, que pressionam para que o tema seja incluído nas discussões em Belém, algo que não constava da agenda oficial.
Esse roteiro tem sido o foco de alguns debates durante a primeira semana da cúpula. Em uma COP sem um foco claro — a anterior, por exemplo, foi inteiramente dedicada ao financiamento climático de países ricos para aqueles com menos recursos — ele pode se tornar o principal campo de batalha. É importante lembrar que as decisões nessas conferências são tomadas por consenso entre todos os negociadores, o que significa que os debates podem se arrastar indefinidamente.
Os protestos e a democracia estão de volta
As palavras de Lula, defendendo um caminho para longe dos combustíveis fósseis, contrastam fortemente com as do presidente do Azerbaijão, Ilham Aliyev, proferidas exatamente um ano antes, na abertura da COP29 em Baku. O anfitrião descreveu os combustíveis fósseis, dos quais seu país depende em grande parte, como "uma dádiva de Deus". A presidência de cada cúpula desempenha um papel crucial na definição das negociações e dos temas que ganham destaque. E, em Baku, não houve menção à necessidade de se afastar dos principais contribuintes para o problema.
A sede de cada conferência alterna anualmente entre diferentes regiões do mundo. Os países de cada região precisam concordar com o local. Isso significou que as três conferências anteriores a Belém foram realizadas em países não democráticos, como Egito, Emirados Árabes Unidos e Azerbaijão. Agora, a conferência retornou a uma democracia, o Brasil, e isso teve uma consequência imediata: ativistas puderam voltar a se manifestar livremente nas ruas da cidade anfitriã para exigir ações contra as mudanças climáticas, após um hiato de três anos. A grande marcha, que reuniu milhares de pessoas, aconteceu neste sábado e foi liderada por representantes de comunidades indígenas.
Na cúpula de Belém, outro dilema precisa ser resolvido, que novamente gira em torno do debate entre autoritarismo e democracia: onde será realizada a COP31? Turquia e Austrália disputam a sede, mas ainda não há acordo.
Desinformação e negacionismo
A ascensão da extrema-direita, que está moldando a luta internacional contra as mudanças climáticas e alimentando o autoritarismo, está intimamente ligada, em muitos casos, à negação das mudanças climáticas. Essa negação, que ganha força apesar de as evidências científicas das mudanças climáticas serem mais robustas do que nunca e os efeitos do aquecimento global serem mais pronunciados do que nunca, está ela própria ligada à desinformação.
Os alertas contra o negacionismo e a desinformação também foram proeminentes nos discursos de Lula nesta conferência. E na semana passada, Brasil, Canadá, Chile, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Espanha, Suécia e Uruguai aderiram a uma declaração, também patrocinada pela ONU e Unesco, alertando para o “crescente impacto da desinformação, da informação errônea, do negacionismo, dos ataques deliberados contra jornalistas, defensores, cientistas, pesquisadores e outras vozes públicas ambientais, e outras táticas usadas para minar a integridade das informações sobre mudanças climáticas”. Os signatários se comprometeram a financiar projetos que combatam essas práticas e a pedir às empresas de tecnologia que “avaliem” se o design de seus algoritmos contribui “para minar a integridade do ecossistema de informações climáticas”.
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