13 Novembro 2025
O presidente solicitou assistência técnica para construir e administrar novas prisões inspiradas no modelo salvadorenho.
A reportagem é publicada por Página|12, 12-11-2025.
O governo salvadorenho ofereceu ajuda à Bolívia na terça-feira para lidar com a crise carcerária no país andino. A oferta surgiu após um pedido do recém-eleito presidente da Bolívia, Rodrigo Paz Pereira, ao seu homólogo salvadorenho, Nayib Bukele, como parte dos esforços do novo governo para reformar o sistema prisional superlotado.
“Estamos prontos para acompanhar o presidente Rodrigo Paz nesta nova era, com uma relação de amizade, colaboração e apoio mútuo”, disse o vice-presidente salvadorenho Félix Ulloa, em entrevista ao jornal El Deber, em La Paz, onde participou da cerimônia de posse do presidente boliviano.
Segundo Paz, ele teve uma conversa telefônica com Bukele na semana passada, na qual pediu ajuda direta na construção e administração de prisões. "Eu disse a ele: 'Me ajude com as prisões, porque vamos precisar de muitas aqui'", relatou o presidente.
O pedido de ajuda surge em meio a uma crise estrutural no sistema prisional boliviano. Segundo dados oficiais, o país tem mais de 32 mil detentos, embora sua infraestrutura tenha capacidade para menos da metade desse número. Nos primeiros meses de 2025, pelo menos sete presos morreram em incidentes violentos, alguns envolvendo policiais.
A oferta de “uma mão amiga”, como Ulloa a descreveu, se materializará em programas de cooperação técnica e na troca de experiências em segurança e gestão penitenciária. Segundo o vice-presidente, ambos os governos estão considerando a criação de uma Câmara de Comércio conjunta, embora as questões de segurança permaneçam no centro da agenda bilateral. “A abertura da Bolívia para regiões como a América Central representa um ponto de virada”, enfatizou Ulloa.
“A Bolívia atravessa um momento crítico e soluções a curto prazo precisam ser encontradas para evitar mais mortes”, alertou Franz Laura, ex-diretor do Sistema Penitenciário. O funcionário enfatizou que “a superlotação, a falta de infraestrutura e a corrupção geram violência constante entre os detentos” e pediu uma “revisão urgente” dos protocolos de segurança nas prisões andinas.
O governo Bukele ganhou notoriedade por sua política de "tolerância zero" contra gangues, que inclui a construção de megaprisões e levou à implementação de um estado de emergência, em vigor desde 2022. A estratégia tem sido questionada por organizações de direitos humanos devido a alegações de tortura e detenções arbitrárias, e a população carcerária no país caribenho aumentou drasticamente nos últimos anos, embora El Salvador afirme ter reduzido drasticamente os homicídios.
O interesse da Bolívia em replicar alguns aspectos do modelo salvadorenho coincide com a mudança política e diplomática promovida por Paz, que, paralelamente, anunciou a normalização das relações com os Estados Unidos e a possibilidade de retomar a cooperação com a DEA após um hiato de 16 anos. "Não temos motivos para nos isolarmos ou estigmatizar a cooperação", afirmou o novo Ministro do Governo de Paz, Marco Antonio Oviedo.
Washington, por sua vez, expressou sua disposição em “ajudar o novo governo democrático da Bolívia” em questões econômicas e de segurança, segundo o Subsecretário de Estado Christopher Landau, que falou durante sua estadia em La Paz para a posse presidencial. “O socialismo do século XXI está morto na Bolívia, e acho que isso é um bom presságio para o resto da região”, afirmou o representante americano.
Leia mais
- A direita moderada de Rodrigo Paz vence a presidência na Bolívia após duas décadas de domínio da esquerda
- Bolívia: o fim do ciclo “nacional-popular”. Artigo de José Luis Exeni Rodriguez
- Megaprisão e imigrantes: o pesadelo Bukele-Trump
- Os tristes recordes de El Salvador, o país mais seguro da América
- El Salvador: a truculência popular de Nayib Bukele
- 'Tolerância zero': presidente de El Salvador se alia a Trump e decide acatar deportações dos EUA
- Lucros de Bukele em Guantánamo: US$ 20.000 por prisioneiro por ano e o favor de Trump
- El Salvador de Bukele: do autoritarismo cool ao partido único