10 Outubro 2025
O Papa observou que na era atual continua a "ditadura de uma economia que mata", na qual os lucros de alguns "crescem exponencialmente", enquanto os da maioria se tornam escassos.
A reportagem é de Elena Llorente, publicada por Página|12, 10-10-2025.
Em um momento de grande tensão no mundo devido a conflitos como o Israel-Hamas e o Ucrânia-Rússia, mas não só isso, além de milhões de pessoas sofrendo e morrendo de fome no mundo, o Vaticano divulgou nesta quinta-feira a primeira Exortação Apostólica do Papa Leão XIV, intitulada “Dilexi te” (Eu vos amei), na qual ele destacou a importância do amor e do respeito aos pobres e sua importância para a Igreja.
O texto da exortação de Leão XIV, em seus 121 pontos, faz referência a graves problemas atuais, como a pobreza crescente, uma economia mortífera, a falta de equidade entre a população e as injustiças contra as mulheres e os migrantes.
O Papa Leão XIV assinou a Exortação em 4 de outubro, dia da festa de São Francisco, sem dúvida para dar-lhe maior importância, já que São Francisco é considerado o santo dos pobres.
O Pontífice "segue os passos de seus antecessores", enfatizou o Vaticano. João XXIII, com seu apelo aos países ricos em sua encíclica Mater et Magistra, de 1961, para que não permanecessem indiferentes aos países oprimidos pela fome e pela pobreza; e Paulo VI, com sua encíclica Populorum Progressio, de 1967, e seu discurso à ONU "como defensor dos pobres". Ambos os papas mudaram profundamente a Igreja após o Concílio Vaticano II (1962-1965), incluindo a celebração de missas em línguas locais em vez do latim e o surgimento da Teologia da Libertação, nascida na América Latina, entre outras coisas.
Por sua vez, João Paulo II consolidou doutrinariamente, segundo o Vaticano, "a relação preferencial da Igreja com os pobres". Bento XVI e sua encíclica Caritas in Veritate ofereceram uma interpretação "marcadamente política" das crises do terceiro milênio. Por fim, Francisco fez do "cuidado com os pobres e com os pobres" um dos conceitos fundamentais de seu pontificado.
América Latina presente
Um detalhe muito importante para os latino-americanos foi que Leão XIV mencionou no texto a "opção preferencial" pelos pobres nascidos na América Latina, o que, segundo o Papa, não significa "exclusividade ou discriminação em relação a outros grupos", mas sim "ação de Deus que se compadece da pobreza e da fraqueza de toda a humanidade".
O Pontífice também analisou os "rostos" da pobreza. A pobreza "daqueles que não têm meios materiais de subsistência", "daqueles que são socialmente marginalizados e carecem de instrumentos para expressar sua dignidade e capacidades", a pobreza "moral", "espiritual" e "cultural"; a pobreza "daqueles que não têm direitos, nem espaço, nem liberdade". E, diante desse panorama, considera "insuficiente" o compromisso de eliminar as causas estruturais da pobreza em sociedades marcadas "por inúmeras desigualdades", pelo surgimento de novas formas de pobreza "mais sutis e perigosas" e por normas econômicas que aumentaram a riqueza "mas sem equidade".
A economia que mata e as mulheres
No entanto, o caminho é longo, principalmente numa era em que continua vigente a "ditadura de uma economia que mata", em que os lucros de uns poucos "crescem exponencialmente", enquanto os da maioria estão "cada vez mais distantes do bem-estar dessa minoria feliz" e em que se disseminam "ideologias que defendem a autonomia absoluta dos mercados e a especulação financeira" , escreveu.
"Quando dizem que o mundo moderno reduziu a pobreza, o fazem medindo-a com critérios de outras épocas, não comparáveis à realidade atual", enfatizou Leão XIV, que também destacou o fato de a ONU ter feito da "erradicação da pobreza um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio".
O Pontífice também se referiu à situação atual, marcada por milhares de pessoas que morrem todos os dias "por causas relacionadas à desnutrição". "Duplamente pobres", acrescentou, são "as mulheres que sofrem situações de exclusão, abuso e violência, porque muitas vezes têm menos oportunidades de defender seus direitos".
E condenou os “critérios pseudocientíficos” segundo os quais será o “mercado livre” que levará à “solução” do problema da pobreza,
Ele se lembrou dos cartoneros
Entre os pobres, "há alguns que não querem trabalhar", lembrou o Papa, mas há muitos homens e mulheres que recolhem papelão da manhã à noite apenas para "sobreviver" e nunca para "melhorar verdadeiramente" suas vidas.
"Não podemos dizer", acrescentou, "que a maioria das pessoas pobres é pobre porque não conquistou 'méritos', segundo aquela falsa visão da meritocracia, na qual parece que só tem mérito quem teve sucesso na vida", isto é, quem sabe ganhar mais dinheiro do que as outras pessoas.
Os pobres devem, em todos os sentidos, estar no centro das atenções da Igreja, segundo Leão XIV. Se uma comunidade eclesial não cooperar "na inclusão de todos", advertiu, "ela também correrá o risco de dissolução, mesmo que fale sobre questões sociais ou critique governos".
Os migrantes
Infelizmente, disse o Papa, as notícias sobre migrantes são cada vez mais "notícias irrelevantes e marginais" na imprensa. E por isso, ele insistiu no papel da Igreja em ajudar todos aqueles que são forçados a deixar seus países. A Igreja, como mãe, caminha com aqueles que viajam. Onde o mundo vê ameaças, ela vê crianças. Onde muros são construídos, ela constrói pontes, criando, por exemplo, centros de acolhimento para acolhê-los. Nesse sentido, Leão XIV lembrou as quatro palavras que o Papa Francisco sempre enfatizou em relação aos migrantes: "Acolher, proteger, promover, integrar". E nas páginas finais do documento, ele apelou a todo o povo de Deus para que "se faça ouvir, para que expresse uma voz que desperte, que denuncie, que se exponha, mesmo ao custo de parecer estúpido".
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