26 Setembro 2025
"Eliminar o ódio dentro de nós mesmos, mantendo o conflito, mas não odiando, significa permanecermos saudáveis. Antes mesmo da benevolência para com os outros, é um grande gesto de cuidado para consigo mesmos. Libertar-nos do ódio, mantendo o conflito, mas abolindo a vontade aniquiladora, é o que nossas mentes e nossas sociedades precisam para voltar a produzir uma política como real serviço ao bem comum", escreve Vito Mancuso, ex-professor da Universidade San Raffaele, de Milão, e da Universidade de Pádua, em artigo publicada por La Stampa, 15-09-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Eis o artigo.
Ódio: essa parece ser a própria condição do coração e da mente da política mundial e nacional, e uma vez que a política é, para o bem ou para o mal, o teste decisivo da condição da sociedade, a conclusão desanimadora a ser tirada é que estamos destinados a afundar cada vez mais em um mar de ódio, de ressentimento, de agressividade, de violência. Infelizmente, ódio gera ódio. O assassinato do jovem político estadunidense Charlie Kirk pelo jovem estudante Tyler Robinson parece ter realmente cumprido o que a Bíblia afirma: “Porque semeiam ventos e colherão tempestades” (Oséias 8,7). Também pode acontecer, no entanto, que não se tenha semeado ventos e, ainda assim, se colha tempestades: Gandhi, os dois Kennedys, Martin Luther King, Aldo Moro, são alguns exemplos trágicos. O ódio, portanto, parece ser uma paixão destrutiva que permeia a história desde sempre: Caim mata Abel, Rômulo mata Remo, Sócrates é morto pelos democratas, Jesus pelos teocratas, guerras sem fim, pulsões atávicas de vingança: e o século XX, definido como o "século do genocídio", replica-se sangrentamente em nossos dias.
Mas qual o papel do ódio na estrutura do mundo? É estrutural, é natural? Ou apareceu posteriormente e é antinatural? Qual é a relação do ódio com a lógica da vida no mundo? Creio que minha resposta vai contracorrente, porque, ao contrário da maioria, acredito que o ódio não é natural, mas constitui uma patologia, e que, portanto, sua dissolução constitui um retorno à fisiologia, uma cura.
De que o ódio constitui uma patologia? Daquela condição estrutural que Heráclito chamava de polemos, quando escrevia que "o conflito (polemos) é o pai de todas as coisas e o rei de tudo". Ele acrescentava a essa famosa afirmação a consciência complementar da harmonia, que para o antigo filósofo era ainda mais fundamental: "De elementos discordantes surge a mais bela harmonia".
Heráclito (junto com Empédocles) foi o primeiro no Ocidente a enfatizar a condição conflituosa que é estruturalmente inerente ao ser e que, longe de levar ao nada, produz a harmonia da qual se geram as entidades, a vida, a inteligência e a cultura.
Por que, então, o ódio predomina tanto na vida política e social de nossos dias? Minha resposta é: porque a maioria de nós está espiritualmente doente, e está nessa condição porque as nossas sociedades, por sua vez, estão espiritualmente doentes pois perderam toda referência ética e de valores que pode se impor aos indivíduos e orientar suas ações.
Heráclito via claramente, e hoje a ciência confirma a sua visão: o conflito existe na natureza já a partir da condição da matéria; os astrofísicos falam significativamente de galáxias canibais e buracos negros vorazes. Se passarmos então para a biologia, a situação se torna ainda mais perturbadora porque entra em cena o sangue, o elemento da vida e, ao mesmo tempo, da morte. Mas atenção: nas estrelas, quasares, buracos negros, assim como nos animais que lutam por suas vidas alimentando-se da vida alheia, não há ódio. O leão não odeia a gazela, a gazela não odeia a grama. No mundo natural, não há ódio, porque o ódio é uma patologia da mente evoluída; mais precisamente, da mente humana lutando com o conflito que é estruturalmente inerente ao ser e que ela não consegue dominar, mas se torna sua vítima.
A mente que domina o conflito luta contra seu adversário, mas não o odeia; a mente dominada pelo conflito, no entanto, o odeia. No primeiro caso, queremos derrotar o adversário, mas não o aniquilar, e isso ocorre porque se sente que o adversário é, olhando bem, parte de nós, no sentido de que, sem ele, nossa própria identidade não seria o que é: assim como a esquerda não existiria sem a direita, os ateus sem os crentes, a Juventus sem a Inter. O ódio, por outro lado, busca a aniquilação. E em sua fúria ofuscante que o torna ignorante, não consegue compreender que a aniquilação do inimigo também implicaria o desaparecimento de sua própria identidade, que sem o inimigo não teria mais o polo oposto em base ao qual se definir.
O ódio é uma doença, uma patologia do espírito: não por acaso judaísmo, cristianismo e islamismo acreditem que Satanás (chamado de Iblis no Alcorão) é um anjo caído, e o anjo é puro espírito.
Quando a liberdade adoece, ela coloca a consciência e a criatividade não mais a serviço da responsabilidade, mas de seu oposto, que é a destruição. Isso resulta na maldade, isto é, a lúcida vontade de fazer o mal. Essa vontade maligna pode ser dirigida contra uma pessoa, um grupo, um povo, uma instituição, ou pode ser dirigida de modo mais geral ao mundo e conduzida pelo mero prazer do mal, pelo prazer sádico e perverso de infligir sofrimento e morte.
O ódio não é normalmente considerado uma patologia; pelo contrário, é contraposto ao amor como uma força de poder igual e oposto. Além disso, acredita-se até que o ódio nos ajuda a compreender melhor que o amor porque possui uma sua clareza invejável. Não subestimo o poder do ódio, mas contesto ser realmente inteligente. De fato, acredito que o ódio sabe ver apenas a si mesmo e não o outro em sua efetiva realidade; mesmo quando vê o outro, quem odeia, na verdade, vê apenas seu próprio preconceito, o que o impede de reconhecer o bem no outro. O ódio vê, mas não com aquele olhar reto que faz o olhar pousar no outro e compreendê-lo pelo que ele realmente é; não, o olho vê com um olhar distorcido pela energia negativa que o faz desejar a destruição.
A verdadeira compreensão requer, ao contrário, retidão, em primeiro lugar no sentido de um olhar correto, de "reta visão", como afirma a primeira disposição do caminho óctuplo ensinado pelo Buda. A partir daí, se gera a abertura mental e do coração, isto é, a empatia. O ódio, portanto, não é inteligente, mas estupidamente circunscrito.
Resta uma última questão: o ódio é forte? Claro, o ódio é forte, às vezes muito forte. Mas o câncer também é; as células cancerosas podem ser muito mais vitais do que as células saudáveis; elas são muito famintas, violentas e agressivas. Mas qual é o resultado? A morte do organismo e, portanto, também a sua própria, ou seja, a impotência máxima. Isso se explica pelo fato de que o ser é governado pela lógica do sistema, isto é, da relação harmoniosa, e que o que se conforma a essa lógica permite que a vida floresça, enquanto o que não se conforma, a faz murchar, introduzindo a morte.
Portanto, não se trata necessariamente de sermos bons em escolher rejeitar o ódio. Trata-se simplesmente de sermos inteligentes: de compreender a lógica que nos trouxe à existência e de nos conformarmos a ela (como um capitão de veleiro que entende o jogo dos ventos e norteia seu barco de acordo com isso). Por essa razão, eliminar o ódio dentro de nós mesmos, mantendo o conflito, mas não odiando, significa permanecermos saudáveis. Antes mesmo da benevolência para com os outros, é um grande gesto de cuidado para consigo mesmos. Libertar-nos do ódio, mantendo o conflito, mas abolindo a vontade aniquiladora, é o que nossas mentes e nossas sociedades precisam para voltar a produzir uma política como real serviço ao bem comum. E o quanto nosso mundo precisa desse renascimento nem é preciso dizer.
Leia mais
- O ódio que comanda o mundo. Artigo de Massimo Recalcati
- Conflitos. Artigo de Flavio Lazzarin
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