10 Setembro 2025
- Anualmente, mais de 750 mil pessoas morrem por suicídio no mundo. E embora por muito tempo a vida religiosa tenha sido percebida como um "espaço protegido" dessas realidades, hoje sabemos que as pessoas consagradas não estão imunes à depressão, ao esgotamento emocional, à solidão ou a crises profundas da vida.
- A Igreja é chamada a ser um lugar de escuta, cuidado e esperança, mesmo para aqueles que entregaram suas vidas a Deus e estão passando por "noites escuras" em um nível psicológico.
O artigo é de María Noel Firpo, psicóloga, publicado por Religión Digital, 10-09-2025.
Eis o artigo.
O suicídio é um fenômeno humano doloroso e complexo que nos desafia como sociedade. Todos os anos, mais de 750 mil pessoas morrem por essa causa em todo o mundo. E embora por muito tempo a vida religiosa tenha sido percebida como um "espaço protegido" dessas realidades, hoje sabemos que as pessoas consagradas não estão imunes à depressão, à exaustão emocional, à solidão ou a crises profundas da vida. A Igreja é chamada a ser um lugar de escuta, cuidado e esperança também para aqueles que entregaram suas vidas a Deus e estão passando por "noites escuras" em nível psicológico.
Falar sobre suicídio na vida consagrada não é um tabu que deve ser silenciado, mas sim uma urgência pastoral e comunitária.
Religiosos, como qualquer outro ser humano, podem apresentar sintomas que podem se tornar graves se não forem tratados a tempo. Estes incluem, entre outros: depressão e ansiedade por vários motivos, que muitas vezes são confundidos com "secura espiritual" ou "noites escuras" e têm uma etiologia psicológica à qual não é dada a devida atenção; estresse vocacional, devido à sobrecarga pastoral; exigências pessoais se tiver ideais muito altos, que podem ser interpretadas como fracassos vocacionais, percebendo-se como "não estou à altura", "isso não é para mim"; luto e trauma não processados, nas próprias biografias, como abuso, perda, experiências de rejeição, que são reativados em diferentes momentos, por exemplo, quando um irmão deixa a vida religiosa, o que sempre tem um impacto pessoal, mas geralmente, o fato não é falado, não é processado adequadamente; fatores relacionais, que se refletem em dinâmicas comunitárias conflituosas, falta de comunicação autêntica, sentimento de invisibilidade, acomodação e resignação a uma vida ou a uma decisão já tomada, que muitas vezes é vista como tarde demais para mudar.
A dimensão espiritual, se entendida como algo que "imuniza", pode se tornar uma exigência que aumenta a culpa ou a percepção de que não se é suficiente para responder ao chamado e à vida que se escolheu. E isso, além disso, afeta o relacionamento com Deus.
Embora eu saiba que cada vez mais pessoas estão abordando essas questões, o tema do suicídio continua sendo uma ferida oculta. O silêncio aumenta o estigma e deixa aqueles que vivenciam momentos de dor ainda mais sozinhos. Nomear o sofrimento, abrir espaços para conversa e escuta, e reconhecer que todo ser humano é vulnerável é o primeiro passo para uma verdadeira prevenção.
A espiritualidade cristã sempre nos oferece um horizonte. O próprio Jesus precisou de seus amigos em seus maiores momentos de dor e entrega. E ele também passou pela experiência pessoal do abandono: "Por que me abandonaste?" Reconhecer essas "noites" não negou sua fé, nem negou um Deus que sabia que jamais abandonaria nenhum de seus filhos. Mas sua experiência naquele momento foi diferente, e isso nos permite integrar a fragilidade a uma jornada de encontro e confiança.
A prevenção do suicídio na vida consagrada não é apenas nossa tarefa como profissionais de saúde mental, mas também uma missão pastoral comunitária. É importante promover uma cultura de cuidado, passando de comunidades "funcionais" para comunidades onde os vínculos afetivos, a confiança e a escuta mútua genuína sejam a prioridade. Isso requer uma sólida formação na dinâmica das relações interpessoais, incluída na formação permanente, com ferramentas básicas para detectar sinais precoces e auxiliar em possível intervenção ou encaminhamento, garantindo espaços de acompanhamento, não só espiritual, mas também psicológico, sem preconceitos. E, se necessário, formando redes externas de apoio que possam auxiliar em situações de risco. Dessa forma, integrar a fé à vulnerabilidade nos ajuda a compreender que tudo isso faz parte da condição humana redimida em Cristo.
A esperança como resposta eclesial
A vida religiosa nasce como um sinal de esperança em meio ao mundo. Mas essa esperança também precisa ser constantemente alimentada dentro da própria comunidade. O cuidado com a saúde mental não é secundário nem "mundano": é uma expressão concreta da caridade evangélica.
Neste Dia Mundial da Prevenção do Suicídio, a Igreja é chamada a olhar com amor e cuidado para as suas pessoas consagradas e, claro, para cada pessoa. Nomear o sofrimento não diminui nem questiona a fé, mas sim a torna mais evangélica.
Lembremo-nos de que a prevenção do suicídio não se trata apenas de salvar vidas, mas também de dar sentido à nossa existência. E, no cerne do Evangelho, ela se traduz em uma jornada rumo ao amor mútuo, acreditando que Deus se manifesta no irmão. O que "salva" não é evitar o sofrimento, mas descobrir que, em meio a ele, continuamos a ser amados e chamados a amar. E essa confiança é a verdadeira prevenção e a fonte mais profunda da vida.
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