31 Julho 2025
"Estamos, ou já deveríamos estar, em tempos de transparência sinodal, mas creio que ainda nos falta muito. Talvez seja porque poucas pessoas conseguem acreditar que existam instituições tão corruptas como esta – e não é a única – devido à corrupção dos seus membros", escreve Cristina Inogés Sanz, em artigo publicado por 7margens.
Cristina Inogés Sanz é teóloga e foi membro do Sínodo dos Bispos sobre a Sinodalidade por nomeação do Papa Francisco, depois de ter integrado a comissão metodológica de preparação. Autora do livro A Sinfonia Feminina (Incompleta) de Thomas Merton (Paulinas Editora).
É muito estranha a cultura que não tem lendas de donzelas raptadas por dragões ou monstros das quais não se sabe mais nada, ou lendas de donzelas que eram entregues em cerimônias carregadas de rituais, como tributo, e cujas famílias viviam isso como uma honra. Eram representações festivas, tanto religiosas como profanas. É claro que nunca mais se soube nada das donzelas. Tudo isto vemos e estudamos agora dentro da Antropologia Cultural e todas as culturas sentem grande satisfação ao recuperar parte da sua história. Se tradicionalmente as protagonistas dos raptos e tributos eram donzelas e, apesar de acreditarmos que isso era algo do passado, no século XXI continuamos com donzelas – e também donzéis – em perigo!
De vez em quando lemos notícias sobre um movimento, fraternidade ou grupo intervencionado pelo Vaticano. Em algumas ocasiões, também encontramos o nome do ou dos comissários enviados para ouvir e inspecionar. Mas são notícias isoladas, sobre as quais não temos mais informações. No entanto, graças a essas notícias, sabemos de alguns casos que nos dão arrepios e nos colocam diante da realidade.
Estamos, ou já deveríamos estar, em tempos de transparência sinodal, mas creio que ainda nos falta muito. Talvez seja porque poucas pessoas conseguem acreditar que existam instituições tão corruptas como esta – e não é a única – devido à corrupção dos seus membros.
Mas, ao saber o que algumas delas escondem, comecei a pensar e a questionar-me se não haverá alguma lista de todas as instituições intervencionadas pela Santa Sé e a causa. Suponho que haja alguma e que esteja em alguns dicastérios, mas por que não torná-la pública? Pelo menos enviá-la aos bispos para que estejam cientes do que pode chegar às suas dioceses. Mas, para ser sincera, por que não a todo o povo de Deus, que deveria saber?
E por que deveria saber? Porque desse modo todos saberíamos sobre quais instituições devemos ter certas precauções e, acima de tudo, para que algumas donzelas e donzéis não fossem enganados ao encontrar o monstro, como se fosse uma lenda atual.
Esses jovens de ambos os sexos só ouvem os cantos das sereias e, quando poderiam reagir, já é tarde, porque o processo de manipulação começa quando são captados e a "colonização emocional" começa desde o primeiro dia e a primeira noite que passam entre as suas paredes.
Deixar nas mãos dos bispos a decisão de permitir ou não que esses monstros modernos se instalem em suas dioceses, não é em si mesmo arbitrário? A realidade mostra que muito poucos pedem relatórios além daqueles fornecidos pela própria instituição que bate à sua porta e, evidentemente, eles não vão dizer que estão sob intervenção. Alguns bispos querem bons números nas suas dioceses para apresentar relatórios excelentes em Roma – mas a que preço? São preferíveis esses grupos sectários cujas barbaridades chegam a ser conhecidas, quando alguns dos seus membros conseguem denunciar os abusos sofridos (isso se conseguirem escapar)? Claro, esses grupos, por princípio, não vão causar problemas para que o seu modo de vida não venha à tona e são muito diferentes da vida religiosa saudável que, com a sua dimensão profética, pode ser mais incômoda…
É verdade que, em algumas dessas dioceses onde são admitidos, pode haver uma equipe que acompanha esses grupos sem que se saiba (novamente a falta de transparência!) e que só o dizem se algo acontecer, para que se veja que foram tomadas as medidas adequadas para evitar alguns males. Geralmente, se existe essa equipa de acompanhamento, é devido a indicações de instâncias superiores.
Há famílias que entregam as suas filhas e filhos a esses monstros, em cerimônias também muito ritualistas, cheias de (falsa) beleza, que, por vezes, são presididas pelo próprio bispo. Mas, na verdade, as famílias não sabem que estão a entregar esses filhos e filhas no altar profano de um sacrifício que só servirá para que se tornem vítimas de abusos de todo o tipo e acabem por ser pessoas totalmente destruídas.
Não são grupos, fraternidades ou movimentos perseguidos por serem fiéis à tradição e serem autênticos discípulos do Senhor, que é o seu argumento para se defenderem apresentando-se como vítimas. São monstros a quem foi permitido existir, embora, por vezes, nas suas próprias constituições esteja o seu programa para delinquir. Porque não podemos esquecer que todo o abuso, seja ele qual for, é espiritual e é um crime.
É tempo de transparência, que devemos exigir para o bem de todos. Acima de tudo, porque já não vivemos em tempos de monstros a quem entregar donzelas e donzéis. Porque, caso contrário, teremos de começar a exigir mais responsabilidades.