22 Julho 2025
O telefone toca quando são quase 23h em Gaza. A voz do Padre Gabriel Romanelli está mais fraca do que o normal, mais cansada: mas repleta da mesma esperança e fé inabalável que, nos últimos meses, deixaram qualquer um que teve o privilégio de ouvi-la quase envergonhado diante de tamanha força. Na quinta-feira, a paróquia da Sagrada Família em Gaza foi atacada pelos israelenses.
A entrevista é de Francesca Caferri, publicada por La Repubblica, 22-07-2025.
Como está o Padre Gabriel? Como o senhor está?
Estou bem. Graças a Deus. Estou me recuperando, assim como os outros feridos, inclusive os que estão em estado grave: eles estão fora de perigo, e por isso agradecemos a Deus. Mas ainda estamos em choque.
Pode nos contar o que aconteceu?
Eu estava trabalhando no escritório e me levantei para ir tomar um mate (a bebida argentina) com o Padre Yusuf. Naquele momento, veio o choque: a porta se abriu com um estrondo. Se eu ainda estivesse sentado à minha mesa, provavelmente teria morrido. Foi um choque muito forte. Felizmente, a maioria das pessoas estava lá dentro; as crianças, graças a Deus, estavam lá dentro. Estávamos dizendo isso há dias: fiquem dentro de casa. As pessoas só saíam para usar o banheiro, lavar roupa e para quase mais nada. A cruz que foi atingida é muito grande: fragmentos voaram por todo o pátio. Todos que estavam lá fora foram atingidos. Infelizmente, três pessoas ficaram mortalmente feridas. Eu me machuquei na perna, mas consegui sair. Todos gritavam, estavam apavorados.
E então?
E então vi Souhail no chão, nosso postulante: um menino especial, bom, generoso, que me ajuda a distribuir a comunhão, a deixar as crianças brincarem e a cuidar dos idosos. Se não tivesse havido a guerra, ele já estaria no seminário. Corri até ele e vi um enorme estilhaço em suas costas: ele sangrava e chorava de dor, clamando a Deus. Coloquei minhas mãos para estancar o sangramento, então sua mãe e tia chegaram, seguramos sua cabeça e depois fomos para o hospital. Agora ele foi evacuado, está fora de perigo.
Esperava por isso? Foi avisado para ir embora?
Não. Estamos na zona vermelha, sabemos disso: mas aqui em Gaza, não existe mais outra cor. E se existe, não sabemos; nenhum lugar é seguro. Ninguém nos disse nada: já tínhamos sido atingidos, em dezembro de 2023, tiros disparados no pátio mataram duas mulheres. Depois, estilhaços, tiros por perto: mas nada comparado ao que aconteceu na quinta-feira.
Padre, não sabemos o quanto disso chegou até o senhor, mas metade do mundo está indignada com o que aconteceu. Sei que o senhor ouviu do Papa, mas há tantas pessoas com o senhor: religiosos, políticos e pessoas comuns...
Se isso ao menos ajudasse a paz. Se isso os convencesse de que continuar matando é inútil... O Patriarca Pizzaballa nos disse isso. Sua visita, a do Patriarca Teófilo e a de todos os que os acompanharam, foi um tremendo conforto. Neles, vimos Jesus; não nos sentimos abandonados. Estamos aqui há meses, no templo de Cristo: aqui rezamos todos os dias pelos mortos de todas as religiões, pelos reféns, por aqueles atingidos enquanto buscavam ajuda. Meditamos todas as manhãs. Eu faço isso, mas as crianças também: em silêncio, tanto quanto se pode chamar de silêncio, com os drones e as bombas. Ser atingido assim foi realmente um choque.
E agora?
Agora vamos seguir em frente. Há muito o que fazer aqui. Temos que proteger essas pessoas...
O senhor tem alguma coisa para comer?
Nada demais, a situação é muito difícil. O Patriarcado organizou a entrega de ajuda, mas ela ainda não chegou, e é importante dizer o seguinte: alguém escreveu que os caminhões chegaram, e isso nos coloca em risco. Como se não quiséssemos compartilhar o que temos com aqueles que vivem ao nosso redor: os caminhões não chegaram. Quando eles puderem passar em segurança, distribuiremos ajuda também para aqueles que vivem ao nosso redor. Como sempre fizemos. Em nome de Deus e da paz.