08 Julho 2025
Ele é filho de Graciela Romero e Raúl Metz, que continuam desaparecidos. O homem de 48 anos já se reencontrou com sua irmã Adriana, que o procurava há décadas.
A reportagem é de Luciana Bertoia, publicada por Página12, 08-07-2025.
Estela de Carlotto entrou no palco da Casa da Identidade de braços dados com Adriana Metz. A menina não conseguia parar de sorrir e esfregar os braços, como se precisasse se certificar de que não estava sonhando. Ela havia encontrado seu irmão, nascido em um campo de concentração em Bahía Blanca, após décadas de busca. A presidente das Avós da Praça de Maio disse que a descoberta do 140º Neto era um bálsamo para continuar, apesar das circunstâncias impostas por um governo que busca destruir as políticas de Memória, Verdade e Justiça. "Mais uma vez, a verdade devastadora prevalece sobre o esquecimento, e a identidade floresce. Ainda faltam 300 netos apropriados durante o terrorismo de Estado para serem encontrados. Continuemos sendo aquele país que iluminou o mundo no caminho da memória. Lutemos para que a verdade não se apague", instou Carlotto.
O auditório da Casa da Identidade, localizado no espaço memorial que funciona no antigo centro clandestino da Escola de Mecânica da Marinha (ESMA), estava lotado. Lorena Battistiol Colayago, procurando seu irmão ou irmã, distribuía pirulitos com mensagens: "irmãos devem ser unidos", "demora para chegar" e "viva as avós".
Os netos que chegaram cedo para a reunião começaram a agarrá-los. Entre eles estavam Victoria Montenegro, Guillermo Pérez Roisinblit, Andrés La Blunda, Guillermo Amarilla Molfino, Pedro Nadal García, Belén Altamiranda Taranto e Horacio Pietragalla Corti, entre outros. Quando a conferência de imprensa começou, todos se reuniram em torno de Estela de Carlotto, Adriana Metz e Manuel Gonçalves Granada.
"São os netos que nos ajudam a seguir em frente", cumprimentou-as a presidente das Avós. "Na minha idade. Estou muito velha. Noventa e poucos anos", disse Estela, provocando risos e aplausos.
À sua direita estava Adriana, que não conseguia parar de sorrir. "Sempre sensível, inquieta e alegre, com sua habilidade de tecelã, Adriana construiu uma rede que a abriga e que hoje também abraça seu irmão", comemorou a presidente das Abuelas.
Adriana Metz procura o irmão desde que se lembra. São filhos de Graciela Alicia Romero e Raúl Eugenio Metz, sequestrados em dezembro de 1976 em Cutral-Có, província de Neuquén.
Graciela — ou "Peti", como era chamada por sua família e amigos — nasceu em 21-08-1952. Estudou economia até se casar com Raúl. Ele nasceu em 24 de agosto de 1953, em Bahía Blanca. Ela tinha um irmão gêmeo, por isso ele ganhou o apelido de "Melli". Ambos os irmãos eram politicamente ativos e foram presos durante a Revolução Argentina na prisão de Bahía Blanca e na penitenciária de Devoto. Naquela época, Raúl conheceu Graciela. Ambos se filiaram ao Partido Revolucionário dos Trabalhadores (PRT).
Raúl trabalhava na ferrovia, assim como seu pai e seu irmão. Após ser sequestrado, foi para Cutral-Có em busca de fortuna. Conseguiu emprego em uma construtora, seguido por Graciela e Adriana, que nasceu em outubro de 1975. Em 16-12-1977, uma força-tarefa composta pelo Exército e pela polícia de Neuquén invadiu a casa onde o casal morava com a filha de um ano. Levaram Raúl e Graciela, que estava grávida de cinco meses.
Os repressores deixaram Adriana com um vizinho. "Aqui, crie-a como se fosse sua. Não abra a boca", aconselharam. O homem, por outro lado, contatou a família. Os avós Oscar e Elsa foram procurá-la em Neuquén e a trouxeram para Bahía Blanca para crescer com eles.
Raúl e Graciela foram inicialmente mantidos em cativeiro em La Escuelita, em Neuquén, e posteriormente transferidos para La Escuelita, em Bahía Blanca. Seu rastro desapareceu em janeiro de 1977, de acordo com os julgamentos realizados durante a repressão no Quinto Corpo do Exército.
Dois meses antes de Graciela dar à luz, um médico a examinou no campo de concentração e disse aos repressores que a deixassem andar. Em abril de 1977, houve uma comoção em La Escuelita: o parto de Graciela se aproximava. Por isso, nenhum médico foi chamado para atendê-la.
Graciela conseguiu ficar com o filho por alguns dias. Em certa ocasião, Graciela encontrou outra mulher sequestrada, Alicia Partnoy, em um banheiro e pôde lhe contar que havia dado à luz um menino. Alicia soube que um dos interrogadores havia levado a criança.
Em 4 de dezembro de 1981, Alicia — que havia conseguido sobreviver e se exilar nos Estados Unidos — enviou uma carta manuscrita à casa dos avós de Metz para contar que seu neto havia nascido em 17-04-1977. Oscar leu o bilhete em voz alta. Sem que ele soubesse, Adriana também ouviu. Foi assim que ela soube que seu irmão havia nascido.
A informação chegou por meio de uma denúncia anônima. As Avós investigaram e repassaram as informações à Comissão Nacional pelo Direito à Identidade (Conadi). A Promotoria Especializada em Casos de Apropriação de Crianças e Adolescentes em Situações de Terrorismo de Estado (UFICANTE) também interveio.
Em abril, a CONADI contatou o homem de 48 anos, criado como filho único por dois civis. Ele concordou em ser testado no Banco Nacional de Dados Genéticos (BNDG) para verificar se era filho de indivíduos detidos e desaparecidos. O procedimento foi realizado apesar do fato de que tanto a CONADI quanto o BNDG estão sendo desmantelados pelo governo de Javier Milei.
Na sexta-feira, a Conadi informou o BNDG sobre os resultados do teste. No mesmo dia, Manuel Gonçalves Granada — neto, secretário das Abuelas (Avós) e membro da Conadi — ligou para o Nieto 140 para dar a notícia. Conversaram por uma hora e meia.
Só no dia seguinte Gonçalves foi encontrar Adriana para dar a notícia. Ela ria e chorava. Flutuava no ar como uma libélula. Foi assim que ela se descreveu na coletiva de imprensa.
"Agradecemos às Avós por nos ensinarem que a busca é coletiva e que devemos continuar pelos 300 netos que todos nós sentimos falta." Antes de deixar o auditório, Estela pediu a revogação do Decreto 351/2025, por meio do qual Milei retirou a autonomia e a autossuficiência do BNDG.
Daniel Santucho Navajas estava dando uma palestra em uma escola em Mármol quando recebeu a notícia de que Nieto 140 havia aparecido. Ele não hesitou. Pegou o trem, o metrô e o trem, até a antiga ESMA, onde se encontrou com seu irmão Miguel Santucho — que havia experimentado a mesma alegria que Adriana quase dois anos antes.
Ramón Inama visitou a Casa da Identidade com sua irmã Paula, neta de 139 anos, que restaurou sua identidade em janeiro. Victoria Montenegro andava de um lado para o outro. "Em tempos em que muitas pessoas querem desistir da luta, as Avós nos mostram que, com organização e conscientização, tudo é possível — até mesmo trazer um homem de 48 anos de volta à vida", disse ela.
“Adriana é uma pessoa incrível que dedicou a vida à busca pelo irmão, e o encontrou. Mas ele não encontrou apenas uma irmã; ele encontrou a melhor que poderia ter. Uma mulher cheia de amor, esperança, perseverança e uma força que o move”, disse Guillermo Pérez Roisinblit, emocionado.
O neto 140 não estava presente na coletiva de imprensa. Mas, logo depois, foi encontrar a irmã. Outras Abuelas presentes na reunião desataram a chorar. "Ainda estou com ele", respondeu Adriana rapidamente pelo WhatsApp por volta das nove da noite. Muita história para contar. E muito amor para curar tanto sofrimento.