05 Junho 2025
“Só há uma saída: permitir a entrada de jornalistas internacionais independentes em Gaza. Já”, pois esta “já não é apenas uma crise humanitária, é uma crise de credibilidade” – escreve em editorial de dia 3 de junho o Jewish News, o mais importante jornal judeu britânico. “Deixem as câmaras entrar em Gaza, já” é o título da tomada de posição do jornal.
A reportagem é de Jorge Wemans, publicada por 7Margens, 03-06-2025.
No Jewish News os editoriais são relativamente raros – menos de uma vez por mês – e desde o massacre de 7 de outubro de 2023 nunca avançaram qualquer crítica em relação ao Governo ou ao exército israelense. O editorial de 3 de junho marca um primeiro distanciamento crítico, ainda que ténue.
A razão desta posição fundamenta-se no facto do “Hamas ter afirmado esta semana que pelo menos 27 pessoas foram mortas e 90 feridas” pelo exército israelense “enquanto aguardavam ajuda supervisionada pela nova Fundação Humanitária de Gaza (GHF), aprovada por Israel”. A GHF foi apresentada pelo Estado de Israel como sendo um instrumento para operacionalizar um novo modelo de distribuição de ajuda alimentar em Gaza. Mas é acusada por vários países ocidentais e observadores independentes de ter como objetivo ajudar Israel a atingir os seus objetivos militares, contornando a ONU e excluindo os palestinianos.
A nova Fundação Humanitária de Gaza é apoiada pelos EUA e iniciou as suas operações de distribuição de alimentos na segunda-feira, dia 26 de maio. Mais de meia centena de palestinos foram mortos pelo exército israelense e centenas feridos durante três operações de distribuição de alimentos, de acordo com informações veiculadas pelo Ministério da Saúde de Gaza, dirigido pelo Hamas.
Para o jornal judeu, “a GHF deveria marcar um ponto de viragem, deveria impedir que a ajuda fosse desviada pelos terroristas e garantir que os civis recebessem suprimentos vitais”, no entanto “sem olhos e ouvidos no local, a própria narrativa que Israel espera dilatar está a afundar-se sob o peso de alegações impossíveis de verificar e imagens horríveis de caos e carnificina”.
Daí que, perante a impossibilidade de obter uma visão dos acontecimentos a partir de fontes independentes e imparciais, o Jewish News defenda que: “Autorizar a entrada de jornalistas em Gaza permitiria a verificação dos factos, fornecendo uma imagem mais clara da situação no local. Também permitiria obter relatos precisos sobre a eficácia e a segurança do novo sistema de distribuição de ajuda, como ele está a ser útil por aqueles que mais precisam e se está, ou não, a ser manipulado.”
Recorrendo à figura de um célebre repórter e editor da BBC para o Oriente Médio, o jornal acrescenta: “Queremos ver Jeremy Bowen na BBC, relatando no local os moradores de Gaza a receberem a ajuda organizada por Israel. A sua presença, juntamente com a de repórteres de guerra de todo o espectro, trará uma certificação séria [de como as coisas se passam]. Transparência não é uma ameaça, é uma tábua de salvação, um separador de águas.”
O editorial não aceita a permanente desculpa israelense sobre a inexistência de condições de segurança para os jornalistas trabalharem: “Preocupações com a segurança? Os correspondentes de guerra não são estranhos ao perigo.” E termina afirmando: “Que razão racional pode haver para negar isso [a entrada de correspondentes internacionais]? Se Israel quer que o mundo veja a verdade, deve deixá-los vê-la”.
De acordo com várias investigações, desde 7 de outubro de 2023, o exército israelense matou em Gaza mais 230 jornalistas e profissionais de mídia. Estes números superam em muito o total de jornalistas que morreram durante toda a Segunda Guerra Mundial. O ataque sistemático e mortal a jornalistas em Gaza está descrito e documentado, por exemplo, no The Reporting Graveyard, um relatório do jornalista Nick Turse para o projeto “Costs of War” no Watson Institute for International and Public Affairs da Universidade de Brown (EUA).