05 Mai 2025
"O conclave não coroa um rei, não dá confiança a um governo, não vota em um programa: mas escolhe uma pessoa que deve dizer “eu aceito” a uma imensa responsabilidade. E aí, o que conta não é a carreira, a orientação política, mas a credibilidade cristã de cada um".
O artigo é de Alberto Melloni, professor da Universidade de Modena-Reggio Emilia e diretor da Fundação de Ciências Religiosas João XXIII, de Bolonha, publicado por Corriere della Sera, de 04-05-2025. A tradução é de Luisa Rabolini.
Os dois terços dos cardeais que elegeram papas se agregaram ao longo do tempo com base nos mais diversos critérios: fidelidade aos seus reis, alianças entre famílias, convergências ideológicas ou teológicas. Mas, recentemente (um século abundante), eles têm se orientado sobretudo com base em dois indicadores: um mais objetivo, que no léxico do conclave é chamado de “capitulação”, e outro relativo ao sujeito, que é o “curso” que o futuro papa traça com o que ele diz ser e é.
A capitulatio não é muito antiga. Sabemos de sua existência desde 1352 e ela assumiu as mais diversas formas. É chamada assim não para aludir a uma rendição, mas porque lista os ‘capitula’ dos empenhos que o futuro papa infere do colégio eleitoral e transforma em sua agenda de pontificado.
Diferentes decisões entraram e entrarão nessa lista: a correção de erros (João XXIII nomeou imediatamente cardeal Montini, privado do cargo por um complô reacionário); um julgamento sobre o que a Igreja espera (Paulo VI reabriu o Concílio que havia sido formalmente interrompido com a morte do papa); a renúncia ao uso de instrumentos, mesmo que sejam admitidos (o direito de mudar até mesmo todos os prefeitos da Cúria existe há meio século e ninguém nunca o usou); a criação de novos órgãos (Francisco constituiu um “grupo” para ajudar em seu governo ou o C9, dizendo explicitamente que era uma ideia que surgiu durante os novendiais).
Não sabemos nada sobre a capitulatio que o sucessor de Francisco adotará, exceto que existirá. A loquacidade de alguns cardeais não eleitores e de ex futuros papas expressou sonhos de vingança e paternalismos que não poderão se realizar, em respeito aos cânones e ao bom senso. Mas, em algum momento, se chegará a uma lista implícita ou explícita. E os últimos discursos - aqueles dos não italianos feitos em um italiano impecável, aqueles dos italianos com comentários em excelente inglês - escrevem algumas linhas esclarecedoras.
No entanto, os empenhos que o futuro papa absorverá dos discursos de seus coirmãos, aqueles que ele evadirá mentindo nos jantares nos numerosos “supostos agregadores” da Roma eclesiástica, aqueles que assumirá em conversas particulares, não são suficientes para convencer aqueles que mudarão seus votos no decorrer da votação, aderindo finalmente à estratosférica maioria de 2/3. Além da capitulatio, os eleitores demandam o “curso” que os candidatos querem seguir, a bússola pela qual eles se orientam, a prova de seu senso de direção. Porque o conclave não coroa um rei, não dá confiança a um governo, não vota em um programa: mas escolhe uma pessoa que deve dizer “eu aceito” a uma imensa responsabilidade. E aí, o que conta não é a carreira, a orientação política, mas a credibilidade cristã de cada um. E se a Igreja reza, não é para que Deus guie o dedo dos cardeais na página da web que cospe o melhor veneno: mas para que a brisa de um silêncio impalpável abra seus olhos, sua inteligência, seus corações. E, porque não, seus narizes.