16º Domingo do tempo Comum – Ano C – A hospitalidade que possibilita o encontro com o Senhor

15 Julho 2022

 

"A escuta da Palavra de Deus é a atitude prioritária a toda preocupação temporal. É um “escolher a melhor parte” (v. 42 b) para crescer no discernimento e engajamento no movimento de Jesus. Pela escuta e acolhida da palavra de Jesus, integramos as dimensões da nossa vida e unificamos nosso espírito no espírito de Cristo. Libertamo-nos das preocupações excessivas e de tantas distrações e necessidades que criamos, que muitas vezes nos distanciam de quem somos de verdade e da missão à qual nos envia."


A reflexão é de Maria Josete Rech, iens, religiosa da Congregação das Irmãs Escolares de Nossa Senhora - IENS. Ela possui graduação em Teologia (1995), mestrado em Teologia Bíblica (2016) pela Pontifícia Universidade do Rio Grande do Sul - PUCRS e especialização em assessoria bíblica (2011) pela Escola Superior de Teologia - EST, São Leopoldo. Atualmente atua como agente de pastoral em Santo Antônio da Patrulha, na Diocese de Osório, RS.

 

 

Leituras do dia

 

1ª Leitura: Gn 18, 1-10ª
Salmo 14(15)
2ª Leitura: Cl 1,24-28
Evangelho: Lucas 10,38-42

 

A primeira leitura (Gn 18,1-10) apresenta com o relato de que Abraão e Sara hospedam três “homens mensageiros” junto ao carvalho de Mambré. Abraão está sentado à porta da tenda e ao erguer os olhos avistou três “homens”, e rezou: “Meu Senhor, eu te peço, se encontrei graça a teus olhos, não passes junto de teu servo sem deter.” Abraão vê neles a Presença de Deus. Ele e Sara prepararam e ofereceram alimentos e água para lavarem os pés. Abraão fica com eles enquanto comem, sob a árvore. Depois que eles já estavam servidos, perguntaram a Abraão: “Onde está Sara, tua mulher?” Abraão diz: “Está na tenda.” E um hóspede anuncia que “Sara terá um filho.” Sara, que está dentro da tende, escuta a conversa. E assim Deus vai realizando sua promessa com Abraão e Sara. A confiança na presença Deus, a hospitalidade e a acolhida as mensagens de Deus geram esperança e vida para toda a humanidade. Peçamos a graça de perscrutar, reconhecer e acolher a Presença de Deus entre nós, em nossas histórias de vida e fé, em nosso peregrinar por este mundo.

 

O salmo 14/15, em resposta a essa leitura, reza perguntando: “Senhor, quem morará em vossa casa?” E afirma que, para morar na casa de Deus, é preciso caminhar na sua presença, praticar a justiça fielmente e em nada prejudicar seu irmão ou sua irmã.

 

Na segunda leitura (Cl 1,24-28) São Paulo testemunha sua morada em Deus. Ele mesmo se tornou “ministro por encargo divino, para levar o anúncio da Palavra de Deus” (v.25). E se alegra por ser mediador de Palavra de Deus, em solidariedade com o Corpo vivo de Cristo - a Igreja, onde Deus torna conhecida a riqueza da glória do “mistério escondido” (v.26), que é Cristo. Paulo, junto com sua equipe missionária, instrui a todas as comunidades cristãs com toda a sabedoria de Cristo, para que todos que professam a fé em Cristo, sejamos perfeitas(os) e justas(os). Paulo nos desafia, hoje, a enfrentar as tribulações com coragem e muita sabedoria no espírito de Jesus Cristo.

 

No Evangelho (Lucas 10,38-42), encontramos Marta e Maria que hospedam Jesus em sua casa, em Betânia. No Evangelho de Lucas encontramos Jesus dando grande atenção às mulheres (Lc 7,36-50;8,1-3; 10, 38-42; 13,10-17; 15,8-10). Marta e Maria são duas mulheres entre elas. Mas, quem são elas? São duas irmãs e Irmãs também de Lázaro, fiéis discípulas de Jesus. Segundo a narrativa, moravam em Betânia, num lugarejo próximo de Jerusalém, onde Jesus se hospedava em suas idas e vindas a Jerusalém, como podemos observar e constatar nos relatos dos quatro evangelistas (cf Mt 21,17; 26,6; Mc 11,1.11.12; Lc 19,29; 24,50; Jo11,1.18; 12,1.9). Betânia, portanto, era a casa da acolhida e da partilha.

 

A narrativa nos diz que “Jesus estando em viagem entrou num povoado e Marta o recebeu em sua casa”. Marta, portanto, é a dona da casa. Nesta casa, onde encontramos Marta, Maria e Lázaro, aponta para uma possível comunidade cristã entre outras, e predominantemente de mulheres ativas no seguimento de Jesus. Marta e Maria são mulheres referentes e que marcaram presença significativa na vida de Jesus e na missão da comunidade cristã no mundo.

 

Marta e Maria aparecem juntas, tanto em Lc 10, 38-42 como em Jo 11,1-43 no relato da “ressurreição de Lázaro”. Comparando estes relatos, encontramos atitudes significativas de Marta e Maria. Conforme a narrativa de Lucas, Marta é a que recebeu Jesus em sua casa e é a que está ocupada com muito serviços ( v. 38), e Maria é a que estava sentada aos pés de Jesus, escutando sua palavra (v. 39). E na narrativa em Joanina, Maria está em casa sentado (v.20b), junto aos judeus que foram consolá-la (V.31), e Marta é a que saiu ao encontro de Jesus ( v.20 a) e, no diálogo com Jesus sobre a morte Lázaro e a ressurreição, faz a sua profissão de fé: “Eu creio que tu és o Cristo, o Filho de Deus.”( v. 27) e a que vai anunciar a Maria: “o Mestre está aí e te chama”(v. 28). E diz o relato que Maria ao ouvir isso levantou-se depressa e foi ao encontro de Jesus (v.29).

 

Olhando para estes gestos e palavras de Marta e Maria percebemos que cada uma delas possui jeito próprio de ser e agir, mas agem numa relação de interdependência no crescimento de seguimento a Jesus, numa atitude de respeito aos movimentos pessoais internos e comunitário, externos na vivência da fé em Cristo. Marta e Maria são mulheres protagonistas da fé cristã. Elas nos interpelam no caminho do discipulado de Jesus Cristo, e chamam para um processo de comunidade eclesial sinodal.

 

É importante olharmos para Marta e Maria tanto na perspectiva pessoal como na dimensão comunitária. Lucas relata que Marta “estava ocupada por muitos serviços, e parando, disse a Jesus: Senhor, a ti não importa que minha irmã me deixe assim sozinha a fazer o serviço? Dize-lhe, pois, que me ajude" (Lc 10,40). Vejamos como Marta confia em Jesus e faz seu pedido de ajuda. Na sua fala, manifesta uma relação de amizade sincera e honesta com Jesus. Pede para que Jesus perceba suas necessidades e envie sua irmã Maria para ajudá-la (v.40). Marta estava se sentindo sozinha na missão. Algo precisa mudar! Quem de nós já não se sentiu assim como Marta, diante dos múltiplos serviços e necessidades?

 

Qual foi a resposta de Jesus? Jesus escuta Marta, a acolhe e responde com muita ternura e diz: “Marta, Marta tu te inquietas e te agitas por muitas coisas; no entanto, pouca coisa é necessária, até mesmo uma só.” Jesus parece espelhar pra Marta o que está se passando no seu interior, com suas emoções e sentimentos. Jesus sabe das situações limitantes, tanto a nível pessoal e da vivência comunitária frente a missão. Por isso Jesus a chama duas vezes pelo nome, “Marta, Marta”, confiando a capacidade de ir além, ao essencial da missão, isto é, de estar com Jesus, escutando sua Palavra e anunciando pela vida.

 

A escuta da Palavra de Deus é a atitude prioritária a toda preocupação temporal. É um “escolher a melhor parte” (v. 42 b) para crescer no discernimento e engajamento no movimento de Jesus. Pela escuta e acolhida da palavra de Jesus, integramos as dimensões da nossa vida e unificamos nosso espírito no espírito de Cristo. Libertamo-nos das preocupações excessivas e de tantas distrações e necessidades que criamos, que muitas vezes nos distanciam de quem somos de verdade e da missão à qual nos envia.

 

Enfim, as atitudes de Marta e Maria nos interpelam à vivência de nossa identidade cristã. Suas atitudes são inseparáveis e fundamentais para a realização da missão de Jesus. São dimensões da vida e da fé que andam juntas de mãos dadas. Marta e Maria nos desafiam a evoluir neste movimento interdependente e ascendentes de um se sentar e escutar Jesus e de um sair ao encontro do outro; um hospedar Jesus em nossa casa e um valorizar relações comunitárias fraternas; um orar e um trabalhar com esperança e fé. E somente assim vamos sendo e nos transformando em pessoas íntegras e verdadeiras testemunhas da fé cristã no mundo hoje.

 

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