Com esmola, oração e jejum conseguimos fazer funcionar o grande teatro da religião. Artigo de José María Castillo

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19 Junho 2020

“Se Deus está no escondido, escuta o escondido e percebe o escondido, porque ‘se fez como um simples homem’ (Filipenses 2, 7), ‘Palavra’ que ‘se fez carne’ (João 1, 14), o ‘Deus kenótico’, esvaziado de si mesmo (Filipenses 2, 5-7), escravo de todos (Mateus 20, 28), se assim é, não aponta para um ‘cristianismo laico’ em uma ‘sociedade laica’? ”, escreve José María Castillo, teólogo espanhol, em artigo publicado por Religión Digital, 18-06-2020. A tradução é de Wagner Fernandes de Azevedo.

 

Eis o artigo.


Umas das coisas que a pandemia do coronavírus nos deixou mais evidente foi que gostamos da teatralidade sagrada, a qual usamos para dizer por toda a vida que temos crenças religiosas. Porque é um fato latente que organizamos nossa religiosidade de forma que, sem nos darmos conta do que fazemos, na realidade praticamos o amor ao próximo (a esmola), a relação com Deus (a oração) e a austeridade de vida (o jejum) de forma que, com esses argumentos e seus atores, conseguimos que funcionasse o grande teatro da religião.

Não estou atacando o fato religioso. O que estou dizendo é que deformamos esse fato até tal ponto, que o convertemos em teatro. Assim, nem mais nem menos, diz o Evangelho: ao que dão esmola, aos que rezam e aos que jejuam, Jesus lhes diz que são “hipócritas”, se fazem essas supostas bondades para “chamar a atenção” (Mateus 6, 1-6; 16-18).

Tenha-se em conta que o termo grego “hypokrités” designa literalmente ao que é um “ator teatral”. De forma que os “hypokritai”, aos quais Jesus refere-se, são pessoas que “não buscam a honra de Deus”, mas sim que na realidade o que pretendem é alcançar “sua própria honra” (H. Giesen). E de sobra, sabemos que as práticas religiosas são atuações adequadas para que quem as pratique seja considerado como pessoa generosa, piedosa e exemplar.

Por desgraça, esse tipo de pessoas se abundam nos ambientes religiosos. Concretamente, em quase todos os ambientes da Igreja. Nesta Igreja que lê e diz crer no Evangelho, justamente no texto que afirma “Deus vê o escondido”, que “Deus está escondido”, que “Deus percebe o escondido” (Mateus 6, 4; 6; 18).

Se Deus está no escondido, escuta o escondido e percebe o escondido, porque “se fez como um simples homem” (Filipenses 2, 7), “Palavra” que “se fez carne” (João 1, 14), o “Deus kenótico”, esvaziado de si mesmo (Filipenses 2, 5-7), escravo de todos (Mateus 20, 28), se assim é, não aponta para um “cristianismo laico” em uma “sociedade laica”?

Se tudo isso é o que cremos, por que o reitor da universidade católica de Murcia alcança a mão ao demônio que nos ameaça? Ou, o que pretende o cardeal de Valencia ao prevenir dos extravagantes e perigos machistas que pode causar a vacina do vírus? (Nota: o autor refere-se às declarações do cardeal criticando uma possível vacina contra o coronavírus. Reportagem disponível neste link, em espanhol). As catedrais vazias, as paróquias fechadas, romarias suspensas, tantas práticas religiosas abandonadas, seminários e conventos sem que ninguém entre... tudo isso, que nos parece uma ruína e um fracasso, não é, na verdade, o sacode e o clamor, que tanto necessitava a Igreja, para cair em si e tomar consciência de que chegou a hora de levar o Evangelho a sério?

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Com esmola, oração e jejum conseguimos fazer funcionar o grande teatro da religião. Artigo de José María Castillo - Instituto Humanitas Unisinos - IHU