“A política e a religião têm muito ‘poder’, mas carecem completamente de ‘autoridade’”. Artigo de José María Castillo

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30 Janeiro 2019

“A pura verdade é que a experiência está nos ensinando que se os políticos (e governantes em geral) não são pessoas honestas, que exercem a autoridade com plena transparência, a corrupção de uns e de outros lhes oferece meios, possibilidades e instrumentos para tomar as mais repugnantes e perversas decisões, que acabam beneficiando os de cima e destroçando, cada vez mais e mais, os mais desprotegidos”, escreve José María Castillo, teólogo espanhol, em artigo publicado por Religión Digital, 29-01-2019. A tradução é do Cepat.

Eis o artigo.

Uma das coisas mais corruptas e escandalosas que estamos vivendo e suportando é o notável predomínio que se nota naqueles que mandam (ou desejam mandar), no agitado e convulsionado mundo da política.
    
E digo que estamos suportando fatos e situações corruptas e escandalosas porque somos muitos os cidadãos que estamos cansados de aguentar políticos e governantes dos quais se nota abundantemente que aquilo que buscam e querem (a todo custo) não é resolver os problemas das pessoas, mas, ao contrário, alcançar o poder para impor suas ideias, interesses e aspirações à população indefesa.

A situação é tão deplorável que a qualquer pessoa medianamente culta ocorre suspeitar que uma importante maioria dos aspirantes a governar nem pensou em toda a sua vida que, no exercício do governo (de um país, de um povo, de uma instituição...), “poder” não é o mesmo que “autoridade”. Um governante pode ter um poder absoluto, que é o que os ditadores possuem.

Contudo, um ditador, justamente porque é totalitário no exercício de seu poder absoluto, por isso mesmo, carece da autoridade que precisa para que os cidadãos vejam nele o governante que tem as qualidades (a credibilidade, a honradez, a sinceridade, a honestidade) que são indispensáveis para que o cidadão veja, nas decisões do governante, as convicções e projetos que buscam o bem da população.

No exercício de qualquer forma de governança, sempre fundamental para que as coisas caminhem bem, é inteiramente necessário que a população veja em seus governantes não apenas o “poder” que as leis estabelecem, mas, além disso, a “autoridade” que se baseia na qualidade moral e a autenticidade fundada no direito. Poder e autoridade que geram o sentimento de “segurança” nos cidadãos. A base do bem-estar de um povo, de um país, da sociedade em geral.

O professor Ennio Cortese, em seu magistral estudo sobre Le Grandi Linee della Storia Giuridica Medievale, analisa a famosa carta que, no ano 494, o Papa Gelásio enviou ao imperador Anastácio, na qual dizia: “existem duas instâncias para reger o mundo: a autoridade sagrada dos pontífices e a potestade real” (“auctoritas pontificum et regalis potestas”). A “autoridade” é a superioridade moral; a “potestade” é o poder público de execução.

Não é possível estudar aqui a enorme documentação histórica que existe sobre este texto. Nem vamos cair na ingenuidade de apresentar todos os papas como modelos de “superioridade moral”. O que importa não é a veracidade histórica, mas, sim, o ensinamento ético.

É evidente que, deste ponto de vista, a exemplaridade moral do governante está no exercício de seu cargo, quando só pensa e atua buscando o maior bem daqueles que mais necessitam dele. Aí está o ponto capital que justifica as decisões de governo e a execução de tais decisões.

Infelizmente, a ausência do necessário equilíbrio da “autoridade” e o “poder”, no governo dos povos e nas instituições, é o que desarticulou a segurança dos cidadãos e o bem-estar na sociedade. A brutal desarticulação que estamos suportando, no devido exercício da política, é o que gerou o contaminado e fétido clima de convivência em que vivemos.

É verdade que, desde o s. XVIII, Montesquieu estabeleceu os primeiros fundamentos da separação de poderes, no exercício do Direito e da gestão política. Pensou-se que tal separação devolveria a transparência e a equidade no âmbito da mais estrita justiça, no exercício da autoridade e do poder.

Mas, a pura verdade é que a experiência está nos ensinando que se os políticos (e governantes em geral) não são pessoas honestas, que exercem a autoridade com plena transparência, a corrupção de uns e de outros lhes oferece meios, possibilidades e instrumentos para tomar as mais repugnantes e perversas decisões, que acabam beneficiando os de cima e destroçando, cada vez mais e mais, os mais desprotegidos.

Para expor algum exemplo, para encerrar, como se explica que nos grupos políticos mais religiosos é onde a corrupção se tornou mais desenfreada? Que religião é essa? E, sobretudo, como se explica tanto descaramento e tanta hipocrisia?

Estamos falando de uma política e de uma religiosidade que possuem, sem dúvida, muito “poder”, mas que carecem por completo de “autoridade” e “credibilidade”. Com gente assim, para onde vamos?

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