O padre dos desesperados de Lampedusa: “Aqui a Europa trai a si mesma”

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31 Mai 2016

Fala o padre Mimmo Zambito: devemos garantir o direito à vida. Não esqueçamos as gratas admoestações do Papa Francisco

A fonte da imagem é www.ilmattino.it

Lampedusa não pode continuar a ser o cemitério do mar siciliano. Estas vidas despedaçadas representam uma tragédia ilimitada. Eu pensava ter visto o inferno quando comecei a trabalhar na paróquia, no dia 7 de outubro de 2013, quatro dias após os 367 afogados, e no entanto assistimos agora a outra tragédia. Paradoxal, quando se pensa que o sonho dos migrantes não é Lampedusa, nem a Sicília, mas a Europa”, afirma Mimmo Zambito, padre de Lampedusa, Itália.

A entrevista é publicada por La Stampa, 30-05-2016. A tradução é de Benno Dischinger.

Eis a entrevista.

Mimmo Zambito, como pároco o senhor ajuda os náufragos como pode, acolhendo-os na igreja com um prato de arroz ou com a comodidade dos colchões, mas de que modo deveria intervir a União europeia?

Desenvolvendo a tarefa para a qual nasceu, após dois conflitos mundiais e, em defesa dos direitos de democracia e liberdade contra a opressão dos povos. E, ao invés desatende este dever e fecha os olhos sobre tantas mortes inocentes. Parece que a Europa esteja sepultando centenas de vidas no mar, mas na realidade está sepultando a si própria.

Com que instrumentos se poderia refrear a hecatombe no mar?

Frear a chegada destes sírios, ganenses, sudaneses, nigerianos, é impossível. O problema é enfrentado de muitos modos, através de uma colaboração política, comercial e financeira entre os vários governos. Se deve compreender que estamos ante uma emergência coletiva. A Itália, a Grécia e a Espanha são inevitavelmente o ponto de chegada para quem foge da guerra e da pobreza. Faz muito bem o nosso governo ao insistir em estratégias coordenadas, pena que os países ajam de maneira descoordenada e esparsa.

E, no entanto, ao longo desta ilha se continua morrendo.

Vinte quilômetros quadrados são demasiado pouco para que se pense que possam ser a resposta à emergência de prófugos. Mas, também é verdade que tudo inicia e termina em Lampedusa.

Em que sentido?

É a encruzilhada de esperança e de morte. Pense na pequena Favour que agora tantos querem adotar, para ela abre-se um capítulo de amor e de paz. Mas, por trás de Favour está o drama de sua mãe morta por combustões químicas enquanto procurava atingir o sonho de uma vida nova. Não esqueçamos a admoestação do Papa Francisco. Veio aqui para encontra-los, talvez deveriam fazer outro tanto as cúpulas políticas europeias”.

Que coisa a Europa deveria oferecer a quem arrisca a vida nas travessias sobre os botes infláveis?

90% daquela gente corre o risco de morrer. Temos o dever de garantir o direito à vida, ao estudo, a melhores condições para as mulheres. Devemos oferecer o direito à infância, pondo fim à tragédia dos meninos-soldados. E, ao invés, frequentemente assistimos a um terrorismo psicológico que confunde os prófugos com os militantes do Isis, gerando medo e ódio diante deles.

De que modo se poderia desbloquear o curto circuito europeu?

Sou um simples pároco e um simples cidadão, não me cabe encontrar a resposta. Mas, me ponho uma pergunta: será que a impossibilidade dos governos europeus incidindo sobre a Líbia, da qual partem prevalentemente os botes infláveis, não tenha talvez a ver com o fato de que no terreno líbico estejam as principais reservas petrolíferas da África?