Dez lições que aprendi de Hans Küng

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26 Janeiro 2011

Hans Küng dedicou mais de 50 anos ao trabalho teológico em diálogo crítico com os saberes de nosso tempo. O doutorado honoris causa que a UNED lhe concederá no dia 27 de janeiro é mais do que merecido. Muitas foram as lições que aprendi dele como mestre, colega e amigo.

O artigo é de Juan José Tamayo e está publicado no jornal espanhol Diario Vasco, 26-01-2011. A tradução é do Cepat.

Eis aqui algumas.

1. Deus. Küng coloca o problema de Deus seguindo os passos do pensamento moderno europeu através de alguns de seus principais filósofos e sistemas de pensamento. Em diálogo com eles e atento às suas críticas, responde com três "sim" à pergunta pela existência de Deus: sim à realidade como alternativa ao niilismo, sim a Deus como alternativa ao ateísmo, sim ao Deus cristão, que se revela em Jesus de Nazaré. Analisa também as concepções de Deus nas religiões não cristãs, o judaísmo, o islamismo, o hinduísmo, incluindo a ideia de Deus nas religiões chinesas e a religiosidade não-teísta do budismo.

2. Jesus de Nazaré. A cristologia de Küng é uma das mais inovadoras e melhor fundadas nas últimas décadas, que contribuiu para recuperar o Jesus histórico e para reformular e interpretar a doutrina sobre Jesus de Nazaré em perspectiva histórica e no contexto dos novos climas culturais. À pergunta pela verdadeira imagem de Cristo responde que o Cristo real, que não é um mito, mas um personagem, cujo contexto sociocultural, mensagem, conflitos com as autoridades políticas e religiosas, morte e nova vida analisa com rigor exegético.

3. A Igreja. Küng se pergunta se a Igreja pode apelar razoavelmente a Jesus e se está fundada no Evangelho. A partir daí elabora uma eclesiologia crítica que parte da Igreja real encarnada no mundo, e não de uma Igreja ideal que se encontra nas abstratas esferas celestes da teoria teológica e destaca sua índole carismática como parte de sua estrutura fundamental. A Igreja não se encontra no mesmo nível que o Reino de Deus, mas está ao seu serviço.

4. O diálogo ecumênico. O teólogo suíço vai em busca das convergências entre catolicismo e protestantismo. E o faz falando como católico diante do espelho do Evangelho, desejando que os irmãos protestantes se tornem mais evangélicos, e assim se reencontrar não em torno da figura do papa, mas em torno do Evangelho. Após ler sua tese de doutoramento, Barth só pode se perguntar se todas as guerras de religião, as lutas teológicas e as divisões não teriam sido um imenso erro. Tinha razão!

5. A unidade das igrejas cristãs. As igrejas cristãs não devem se fechar no estreito círculo de sua própria confissão, caindo em um confessionalismo excludente. Deverão se abrir ao ecumenismo em todos os terrenos. A unidade dos diferentes cristianismos não se consegue com o retorno de uma igreja a outra, e menos ainda com a submissão ou rendição de todas a uma. Consegue-se através da mútua aceitação e da conversão de todas a Jesus de Nazaré e à sua mensagem libertadora. Os acordos doutrinais devem vir acompanhados de práticas ecumênicas.

6. As mulheres como sujeitos morais, eclesiais e teológicos. As igrejas cristãs não podem seguir presas em concepções teológicas que inferiorizam ou consideram menores de idade as mulheres, nem nos modelos organizativos hierárquico-patriarcais, que as excluem do exercício dos ministérios e das funções de direção. Devem ser reconhecidas como sujeitos morais, eclesiais e teológicos e, enquanto tais, com o protagonismo que tiveram no movimento de Jesus e no cristianismo primitivo.

7. O diálogo inter-religioso. Nenhuma religião pode reivindicar o monopólio da verdade, nem da ética, nem da libertação. Por sua vez, toda religião tem uma verdade originária que, além de verdade teórica e reto conhecimento, se torna verdade na práxis, o reto comportamento e a atitude ética. As religiões podem proporcionar um horizonte global de sentido, inclusive diante da dor, da culpa, e do sem sentido, dar um sentido último à vida frente à morte, garantir valores supremos e motivações profundas e impulsionar manifestações contra as situações injustas. Nesse horizonte se situa a necessidade do diálogo inter-religioso.

8. O projeto de ética mundial. Küng é pioneiro na proposta de uma ética mundial na era da globalização, na qual hão de convergir as religiões e as ideologias seculares, em torno das seguintes tarefas: defesa da vida, trabalho pela paz, proteção do meio ambiente, cultura da não violência, da solidariedade, da tolerância, de uma vida veraz, da igualdade e da colaboração entre homens e mulheres. Propõe uma ética mundial para a economia e a política, que critica as situações realmente existentes, apresenta alternativas construtivas e racionalmente realizáveis, assim como impulsos para a sua realização. Nesta ética hão de convergir as religiões e as ideologias seculares.

9. Renúncia a servir ao sistema romano. Küng nunca se viu tentado a entrar no serviço do sistema romano. Se o tivesse feito, como o fizeram outros colegas seus, teria que ter dito sim e amém a muitas coisas contrárias à sua consciência e teria vendido sua alma pelo poder da Igreja.

10. Liberdade, verdade e veracidade. Que orientações segue hoje a vida de Küng? Ele mesmo responde: "Continuo resistindo em aras da verdade, tendo a liberdade em alta estima, avançando na pesquisa e lutando por uma Igreja que não se considere a si mesma infalível".

 

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