30 Junho 2017
“Os seminaristas deveriam aprender o que não aprendem nem na família, nem com os amigos, nem na escola: é muito melhor e mais saudável para a mente e para o coração esculpir momentos de verdadeira meditação, para perceber a poderosa, mas silenciosa, presença de Deus, antes de ficar demasiadamente marcado pelas milhares de impressões cotidianas.”
A opinião é do teólogo e psicólogo jesuíta Hans Zollner, diretor do Centro para a Proteção dos Menores da Pontifícia Universidade Gregoriana, em artigo publicado por Servizio Informazione Religiosa (SIR), 28-06-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Estávamos no fim de uma oficina com os seminaristas de uma das cerca de 150 casas de formação para seminaristas e clérigos de todo o mundo que estudam em Roma. Estávamos falando do que eles esperavam depois da ordenação sacerdotal. Discutia-se muito sobre questões administrativas e organizacionais e as muitas reuniões de que deveriam participar.
Em certo ponto, um dos presentes disse aquilo que muitos pensavam: “Queremos ser pastores de almas!”. Essa frase ficou impressa em mim. Nela, sintetiza-se o que acontece comigo há quase 15 anos, desde que me ocupo, em Roma, da formação dos futuros pastores. A maioria daqueles que se decidem por uma vocação religiosa têm uma motivação realmente espiritual e muita boa vontade, assim como as gerações antes deles. O que muda é, de vez em quando, o momento e, portanto, o pressuposto com que pessoas jovens – e hoje, muitas vezes, não mais tão jovens – entram em um seminário e fazem a sua formação.
É opinião generalizada que, na última década, as condições da sociedade e as da vida de cada um mudaram radicalmente. Portanto, a fé, a oração e o agir cristão devem “crescer juntos”. A imagem que temos de Deus não pode permanecer a mesma se o nosso conhecimento do mundo empírico evoluiu. Assim como nós imaginamos Deus e rezamos a Ele de modo diferente, dependendo se temos cinco, 15 ou 50 anos, os eventos da história e da sociedade também não podem passar sem deixar vestígios na teologia, na espiritualidade e também na formação ao sacerdócio.
Os elementos centrais da formação ao sacerdócio hoje deveriam levar em consideração algumas dessas mudanças epocais: os ritmos de vida cada vez mais elevados, isolamento e a falta de orientação.
Deus não deve ser inventado, mas sim encontrado. É possível buscar a Deus somente de modo intenso e pessoal. O fluxo contínuo de informações através da internet e a comunicação contínua através das mídias sociais tornam necessário que aqueles que querem buscar a Deus tomem tempo para rezar em silêncio, para reelaborar conscientemente as impressões e para buscar e encontrar a Deus em tudo isso.
Os seminaristas deveriam aprender o que não aprendem nem na família, nem com os amigos, nem na escola: é muito melhor e mais saudável para a mente e para o coração esculpir momentos de verdadeira meditação, para perceber a poderosa, mas silenciosa, presença de Deus, antes de ficar demasiadamente marcado pelas milhares de impressões cotidianas.
Também na Itália as crianças crescem cada vez mais raramente em famílias com muitos filhos e em contato com famílias numerosas. E, assim, não aprendem mais automaticamente que, em um grupo, o “eu” não pode estar sempre no centro das atenções, que é preciso equilíbrio entre o dar e o receber, que não se pode sempre escolher as pessoas com quem se vive e se trabalha. Nesse sentido, na formação dos sacerdotes, é preciso pôr a ênfase no fato de que eles, com autenticidade e sinceridade, embora na consciência dos seus pontos fortes e limitações, são chamados a ir ao encontro das pessoas com sinceridade, a viver e a trabalhar junto com elas.
Por fim, deve-se praticar o “discernimento espiritual”, que ajuda os sacerdotes a encontrar um caminho e a ser um exemplo na desorientação e na arbitrariedade gerais, ajudando os cristãos a não cair na resignação e no encastelamento sobre si mesmos, nem na euforia em relação a qualquer moda ou novidade.
Naturalmente, acima de tudo, é a graça que nos torna instrumentos do agir de Deus no mundo. De acordo com o bem conhecido pensamento de Tomás de Aquino, a graça aperfeiçoa o que foi criado na natureza. Quando nós nos orientamos a Jesus e à sua mensagem e tentamos voltar ao coração do Evangelho, encontramos pessoas de boa vontade abertas e prontas para conhecer mais a fé no Deus uno e trino.
Os sacerdotes não devem ser impecáveis e absolutamente perfeitos. Os primeiros discípulos de Jesus e as primeiras comunidades cristãs já nos ensinam que devemos, sempre e novamente, nos esforçar para viver de modo credível. Se os candidatos ao sacerdócio se colocam, sempre e a cada vez, com honestidade e paciência, diante desse desafio, podemos tranquilamente ter confiança no fato de que o Senhor da Igreja e da história fará a Sua parte, para que os sacerdotes, também hoje, deem frutos n’Ele.
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Preparar os jovens para o sacerdócio: novos cenários, novos desafios. Artigo de Hans Zollner - Instituto Humanitas Unisinos - IHU