06 Novembro 2015
Reflexões às margens do recente Sínodo... Muitas, obviamente, mas aqui uma em particular. Fiquei impressionado negativamente com a leitura de uma manchete intimidatória, como um "mãos ao alto!" ao contrário, mas com a arma apontada contra o outro: "Tirem as mãos de Paulo VI"! Estava por inteiro na página 7 do jornal Il Foglio (21-10) e trazia a assinatura de dois chamados expressamente "estudiosos joão-paulinos": aparentemente, uma nova categoria da teologia...
O comentário é do teólogo e jornalista italiano Gianni Gennari, publicado no sítio Fine Settimana, 02-11-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Os dois, Stephan Kampowski e David Crawford, exercem a sua especialidade teológica na Universidade Lateranense, na seção chamada "Instituto João Paulo II", que ao longo das últimas décadas se dedicou particularmente a uma leitura de sentido único da doutrina eclesial, às vezes mais eclesiástica do que eclesial, da relação entre a teologia moral oficial e a realidade contemporânea, muito variada e muitas vezes em direção diferente da oficialidade católica, e em termos muito difusos.
O que diz, então, aquele título? Diz que os dois, por ocasião do recente Sínodo, pensaram em evitar e esconjurar uma realidade que lhes parecia iminente, isto é, uma leitura diferente, com consequente interpretação, da norma acerca da paternidade responsável contida na Humanae vitae de Paulo VI, de 1968.
É conhecido também "lippis atqve tonsoribus" – ou seja, aos sapateiros e aos barbeiros no latim que antigamente se falava naquela universidade que justamente naqueles anos eu frequentei primeiro como aluno e depois como professor – que se trata da distinção essencial entre métodos chamados contraceptivos e métodos chamados naturais, no contexto da vida conjugal em relação à paternidade, que sempre deve ser responsável.
Também é sabido que, desde o início, essa distinção, apresentada abertamente por Paulo VI como sua convicção profunda, foi contestada de vários modos, até mesmo respeitosos, mas claros, por muitas Conferências Episcopais inteiras, por muitos teólogos católicos até mesmo de grande nome, por exemplo, Häring, Fuchs, Chiavacci, Mongillo etc., e que não teve nas décadas seguintes a adesão de grande dos casais até mesmo católicos praticantes.
Paulo VI sofreu muito com isso, com razão, e expressou esse sofrimento várias vezes, mesmo com o simples fato de que, depois daquela, ele não escreveu mais qualquer outra "encíclica", mas apenas documentos menos solenes e desafiadores... Hoje, ele é "bem-aventurado", e o sofrimento não o toca mais, enquanto na terra há muitos outros, também ligados a essa história...
É um fato que aquela norma, segundo a qual os chamados métodos naturais eram admissíveis para uma consciência cristã formada e informada de cônjuges católicos, enquanto permaneciam excluídos todos os outros "meios" que tinham o mesmo objetivo, ou seja, o de adiar a procriação no tempo ou de obter absolutamente que não ocorresse outras, nunca foi plenamente acolhida também pela grande maioria dos cônjuges católicos, até mesmo praticantes dispostos à generosidade de uma vida que tende à conversão contínua. Revelaram isso também as consultas em preparação do Sínodo, aliás, e não é nenhum segredo para ninguém.
Eis então que, depois de quase 50 anos, a mera perspectiva de que no Sínodo se pusesse em discussão esse dado, considerado de modo muito oposto por tantas partes, ou como "evangelho" da doutrina ou como expressão de uma situação a ser superada no respeito da consciência "responsável" dos cônjuges, como aliás já ensinava o Concílio na Gaudium et spes, põe em pânico muitos que se consideram "guardiões" absolutos da moral católica e que, desde então, exaltam os chamados "métodos naturais", embora em grande parte, como teólogos e clérigos, nunca os puderam experimentar...
Ao contrário, uma multidão de casais católicos os experimentaram ao longo das décadas, e com serena consciência decidiram não poder seguir a norma entendida em sentido absoluto e negativo. Além disso, é sabido que até mesmo as tantas Conferências Episcopais que, na época, manifestaram a sua discordância, depois e em geral, não desconfessaram a sua primeira reação, e a vida da Igreja seguiu em frente ou, se foi para trás em alguns lugares, seguramente não foi por causa daquela inobservância da norma contida na Humanae vitae de Paulo VI, grande papa, certamente em termos intelectuais e culturais o maior dos papas do século XX.
Então, estamos aqui de novo naquela injunção dura: "Tirem as mãos de Paulo VI!". Com esse título e com o que se lê abaixo na página inteira do Il Foglio, os autores querem dizer que se tocarem a norma da Humanae vitae, desmorona a credibilidade de toda a doutrina católica sobre matrimônio, família e sexualidade?
É isso mesmo, e é sabido – ainda a fórmula latina citada acima – que esse foi o argumento com o qual alguns, bem conhecidos desde sempre, conseguiram fazer com que o próprio Paulo VI o escolhesse, como oficialmente escolheu, dando razão a um relatório minoritário da Comissão Teológica instituída por João XXIII e por ele confirmada ao longo dos anos.
Aqui estamos de novo naquela intimação: "Tirem as mãos"! O que dizer? Tantas coisas, mas vamos por ordem. A primeira é que os dois signatários talvez não saibam ou, melhor, fingem que não sabem que o próprio Paulo VI, embora convencido em consciência – a sua, muito fina e acostumada desde sempre a raciocinar e a discernir com delicadeza e lucidez – daquilo que tinha decidido e proclamado, dissera àqueles que deviam anunciar à opinião pública internacional o texto e o significado da encíclica, ou seja, ao Pe. Ferdinando Lambruschini, professor de teologia moral da Universidade de Latrão – a mesmo onde agora, no instituto "joão-paulino" mencionado, que, na época, estava apenas no mundo do futuro, se colocam os dois "intimidadores" desse duro "tirem as mãos!" –, que a própria Humanae vitae não devia ser entendida como um texto "definitivamente" sancionado, não estava marcada, portanto, pela "infallibilitas in docendo" do bispo de Roma, aquela infalibilidade própria da Igreja como tal, Povo de Deus, Instituição e Mistério, e "apropriada" da missão de Pedro e dos seus sucessores na fórmula do Concílio Vaticano I.
O Pe. Lambruschini foi o executor desse mandato pontifício e não o escondeu a ninguém, nem mesmo aos seus alunos e àqueles que deviam estar, nos anos sucessivos, de certo modo, no seu lugar na cátedra daquela universidade. Isso lhe custou – soube-se imediatamente – uma "promoção" indesejável: por pressões curiais, ele foi promovido a arcebispo de Perugia: não inteiramente feliz com isso, confirmando-se ainda mais em uma certa melancólica certeza sobre as dificuldades da vida, até mesmo na Santa Igreja Católica Romana...
Portanto, a norma da Humanae vitae não tem o caráter da definitividade da doutrina de fé, e isso deve ser lembrado quando alguns tentam tomar como óbvia uma leitura oposta. Sobre isso, recentemente lemos – aqueles que quiseram ler, porque parece que muitos não leram, ou logo se esqueceram, talvez chamando a si mesmos com orgulho de "joão-paulinos" – que o Papa Francisco disse que "tudo depende de como se interpreta a Humanae vitae".
Assim, "tirem as mãos" de Paulo VI? Muitos podemos dizer o mesmo, até mesmo em âmbitos muito diferentes: por exemplo, sabe-se – e basta ir em rede e buscar também em muitas realidades, pessoas e ambientes que talvez hoje se digam "joão-paulinos" e que também são de casa ao Il Foglio, com contribuições pessoais repetidas e com consultorias sempre orientadas a rejeitar grande parte da herança do Vaticano II, e às vezes todo ele, para encontrar os seus rastros muito abundantes – que Paulo VI foi por um longo tempo, em 50 anos e até hoje, indicado como autor de muitas traições na Igreja Católica, começando justamente pela continuação do Concílio, causa infeliz para muitos, naquelas paragens, das crises sucessivas e até hoje.
Eles o chamaram de "Maolo VI" [em referência a Mao Tsé-Tung], depois da Populorum progressio, até mesmo muitos daqueles que hoje exaltam aquela norma discutida da Humanae vitae, que, na fase preparatória do duplo Sínodo recém-concluído, não foi acolhida por uma grande parte do povo católico.
Paulo VI soube disso imediatamente, porque a discordância foi imediata e aberta. Eis um elemento novo, talvez. Como reagiu o próprio papa às críticas e às rejeições, para ele dolorosas, que vinham de ambientes e de pessoas que ele amava e apreciava? Basta pensar em personalidades como o cardeal Sünens, que não escondeu a sua discordância, ou no Pe. Bernard Häring, o mais importante teólogo moralista católico do século passado.
Como Paulo VI reagiu, então? É interessante informar àqueles que intimam um "tirem as mãos!" a todos aqueles que não pensam como eles. Paulo VI reagiu de muitos modos, até mesmo sofridos e silenciosos, também exortando a não exagerar os contrastes.
Por exemplo, em março de 1970, falando para cerca de 2.000 casais das Équipes Notre Dame, movimento de espiritualidade conjugal que foi a Roma para encontrá-lo – e, se pode servir, também estava presente este que escreve – ele exortou a não se enrijecer na circunstância, mas a caminhar em frente na busca da santidade aberta também aos "casais" cristãos. Aliás, foi a primeira vez que, em um texto pontifício, não se fala apenas de família, mas explicitamente de "casal cristão" (couple chrétienne).
Não é suficiente: imediatamente, depois da publicação da encíclica no fim de julho, nas audiências posteriores, o papa voltou várias vezes a falar da Humanae vitae, questionada por muitas partes, até mesmo por episcopados inteiros. E falou a respeito também assim, no Ângelus do dia 11 de agosto de 1968, menos de duas semanas depois da publicação da Humanae vitae. Transcrevo do manuscrito publicado no livro Paolo VI. L’amore è bellissima cosa, Ed. Vivere In, editada por Leonardo Sapienza (p. 55-57): "Outra intenção está no nosso coração nestes dias. Vocês conhecem os comentários à nossa última encíclica Humanae vitae em defesa da transcendência e da dignidade do amor, da liberdade e da responsabilidade dos esposos, e da integridade da família: muitíssimos comentários são nobilíssimos e favoráveis, outros não. Peçamos ao Senhor que conforte o nosso magistério com a Sua autoridade, com a Sua serenidade e com a Sua bondade. Sejam bem-aventurados todos aqueles que o acolhem, e também o sejam aqueles que se opõem a ele, para que a sua consciência seja iluminada e guiada pela retidão doutrinal e moral, verdadeira e superior: convidamo-los a refletir sobre um tema de importância tão vital".
Pergunta: se, no caso específico da norma oficial, se tratasse de matéria definitiva e, portanto, de doutrina de fé e moral, aquela em que se aplica o "in eodem sensu, in eadem sententia" da Revelação-Tradição que assinala aos católicos o que deve ser tido como certo, Paulo VI poderia ter "abençoado" até mesmo aqueles que eram contra ela? E, então, "tirem as mãos de Paulo VI" também pode ser dito se pensamos, sobre o Sínodo antes e depois, e portanto também agora, de modo diferente dos dois benevolentes "joão-paulinos" abençoados pelo Il Foglio.
Cuidado, portanto, para não aplicar fáceis acusações àqueles que, ontem e hoje – antes e depois do Sínodo recém-concluído no sinal do "caminhar juntos" que deve continuar à luz do Espírito Santo, verdadeiro artífice do evento, como afirmou Francisco na homilia conclusiva –, pensavam e pensam de modo diferente sobre o tema de fundo da relação entre amor conjugal e procriação responsável.
Afinal, como já dito acima, também recentemente Francisco observou com serena consciência que "tudo depende de como se interpreta a Humanae vitae". Sinal de que a norma pode ser entendida e apreciada também de modo diferente por certos "joão-paulinos", que, portanto, não podem se apropriar do magistério papal e acusar de libertinismo e de relativismo, de cedimento ao mundo e à imoralidade aqueles que têm convicções doutrinais e também de consciência responsável diferentes das deles. Essa é a questão.
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Depois do Sínodo: a Humanae vitae entre Paulo VI e Francisco. Artigo de Gianni Gennari - Instituto Humanitas Unisinos - IHU