27 Novembro 2017
Não é uma viagem fácil para o Papa Francisco esta que começa na segunda-feira em Myanmar, para continuar depois em Bangladesh. O papa, que vai se encontrar com o presidente da Birmânia, Htin Kyaw, e a sua primeira-ministra de fato, Aung San Suu Kyi, também prevê um encontro, no dia 30 de novembro, com o general Min Aung Hlaing, o homem forte do país e o mais poderoso representante do Exército.
A reportagem é de Emanuele Giordana, publicada por Il Manifesto, 26-11-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Grande parte disso vai girar em torno da questão dos Rohingya, em um clima que corre o risco de ser tenso, embora Joseph Kung Za Hmung, leigo católico, fundador de uma ONG e do serviço católico de comunicação Gloria TV, disse à agência vaticana Fides que “as pessoas esperam Francisco com grande alegria e benevolência. Fiéis de todas as religiões gostam dele e o respeitam, especialmente os budistas. Não vimos até agora sinais negativos daqueles grupos extremistas que poderiam convocar manifestações, mas registramos palavras hostis nas mídias sociais, onde alguns acusam o papa de ter tomado o lado dos muçulmanos rohingya”.
Os sinais existem e, infelizmente, não apenas nas mídias sociais. No domingo passado, milhares de pessoas, incluindo monges budistas – conta a revista local Irrawaddy – manifestaram em homenagem ao Tatmadaw Admirer Group.
Tatmadaw é o Exército birmanês e – como observa o jornal – nunca, como desta vez, pessoas comuns e monges budistas se reuniram em torno daqueles que varreram os Rohingya do Estado oriental de Rakhine. O mais famoso monge ultranacionalista, Ashin Wirathu, não foi às celebrações (o Conselho Nacional do Sangha, que regula as relações entre o clero budista e o Estado, proibiu-lhe os discursos públicos), mas enviou uma mensagem para elogiar o Exército e as forças de segurança que “protegem” o Norte Rakhine, condenando a comunidade internacional por tê-lo censurado. O seu grupo, Ma Ba Tha, está oficialmente dissolvido, mas ressurgiu com outros nomes, como Buddha Dhamma Parahita Foundation.
Ottama, um monge muito conhecido e citado em uma reportagem da Associated Press, disse ao entrevistador que não entende por que o papa “vem para o meio de um conflito”, senão para favorecer os “bengaleses”, como são chamados os Rohingya no Myanmar, um termo proibido no país das mil pagodas.
Tão proibido que até mesmo o cardeal Charles Bo, à frente da frágil comunidade católica birmanesa (700 mil de um total de 51 milhões), pediu que Francisco evite essa palavra. Palavra, aliás, usada repetidamente por um papa que chamou os Rohingya de “irmãos”.
O pontífice se encontrará também com expoentes do Sangha e em um momento delicadíssimo. O Ministério dos Assuntos Religiosos e da Cultura acaba de apresentar ao Parlamento um projeto de lei contra os “discurso de ódio”, que pune indivíduos ou grupos que se façam promotores deles. Uma medida do governo que os ultranacionalistas religiosos como Wirathu olham com suspeita e que frearia uma lei, feita ad hoc durante a ditadura, que protege o budismo birmanês em chave nacionalista: a Protection of Race and Religion Law, aprovada em 2015, rotulada por muitos como discriminatória para com mulheres e muçulmanos.
A recente lua de mel entre monges e militares teria começado justamente com o primeiro êxodo forçado recente dos Rohingya em 2012. Desde então, os episódios de violência, intimidação e ódio começaram a se tornar comuns e protegidos, contradizendo uma tradição que via nos monges birmaneses uma força predominantemente progressista.
Se ela provavelmente ainda o for, também é verdade que as coisas mudaram muito, e que o “namoro” com os militares também corresponde, para muitos, a uma espécie de divórcio com a Liga pela Democracia de Suu Kyi.
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Clima tenso em Myanmar com a chegada do papa ''defensor dos muçulmanos'' - Instituto Humanitas Unisinos - IHU