01 Junho 2012
A adequação da igreja, em seu aspecto arquitetônico, é sobretudo um evento eclesial, que pode representar uma ocasião de crescimento pastoral e de renovação da comunicação e da comunhão eclesial.
A opinião é do monge italiano Enzo Bianchi, prior da Comunidade de Bose, em artigo para o jornal Avvenire, dos bispos italianos, 31-05-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
A adequação litúrgica das igrejas à reforma da liturgia desejada pelo Concílio Vaticano II tornou-se hoje um tema de grande atualidade, muito mais do que nas décadas passadas. De fato, lentamente, mas também de modo extenso, compreendeu-se que, nessa operação, está em jogo a identidade do culto cristão e que não é possível que uma certa transformação dos espaços e dos polos litúrgicos não leve em conta, além dos oportunos critérios artísticos, alguns elementos irrenunciáveis na tradição cristã e católica.
O surgimento de ásperas polêmicas em torno dessas transformações, além disso, mostra a qualidade muitas vezes de pouca comunhão com que as Igrejas locais abordam esses processos de mudança, mas também a fraca recepção da reforma litúrgica: assim, de um lado, assiste-se, às vezes, intervenções marcadas por experimentações e, de outro, contestações ideológicas muito aguerridas, que desejariam a intangibilidade das Igrejas para afirmar a memória do status quo ante.
A Conferência Episcopal Italiana emitiu em 1996 uma nota pastoral sobre “A adequação das Igrejas segundo a reforma litúrgica”, texto muito estimulante e rico em preciosas indicações para que, na fidelidade ao Concílio, "a adequação das igrejas não seja considerada um cumprimento discricionário nem seja abordado segundo modalidades totalmente subjetivas" (n. 1). Deve-se dizer, porém, que essas diretrizes nem sempre foram e estão sendo seguidas.
Em particular, nessa nota, pede-se que a adequação tenha a qualidade de um caminho percorrido na comunhão entre pastores e fiéis, caminho alimentado pela sabedoria litúrgica, busca paciente, diálogo entre os órgãos colegiais da Igreja local, busca de soluções marcadas por uma elevada qualidade artística e também debate entre comunidade eclesial e comunidade civil (cf. n. 4). Portanto, a adequação de uma igreja é sobretudo um evento eclesial, que pode representar uma ocasião de crescimento pastoral e de renovação da comunicação e da comunhão eclesial (Mariano Crociata).
Feitas essas considerações introdutórias, gostaria agora de fazer, em voz alta, uma primeira pergunta e tentar, brevemente, uma resposta: há princípios que devam ser honrados na atual adequação litúrgica de uma igreja, em particular de uma igreja catedral?
Uma observação absolutamente necessária a ser feita refere-se à catedral como construção. Ao longo da história, as formas foram muito diversas e devem ser diferenciadas: não apenas o Oriente e o Ocidente, mas também a Síria e o Norte da África – e se poderia continuar... – representam áreas em que se desenvolveram formas arquitetônicas muito diversas. Deve-se reconhecer que essas formas também se devem à teologia que as habitou e as justificou.
A arquitetura de uma catedral, de fato, não se deve somente à capacidade técnica ou à herança cultural, mas também à teologia, ou, melhor ainda, à eclesiologia de referência. Por isso, em determinadas épocas, marcadas por uma reviravolta teológica e eclesiológica, operaram-se transformações e adequações litúrgicas que mudaram o espaço e a forma da igreja.
Caminho, esse, que foi necessário e se impôs por razões eclesiais, embora nem sempre tenha sido operado de modo irrepreensível ou isento de críticas: críticas formuladas contextualmente à adequação ou também expressas mais tarde, quando outros cânones artísticos e teológicos levavam a um juízo diferente sobre as transformações.
Certamente, na Igreja Católica, ao contrário das orientais, a tradição constante é a da criação de novas formas e do recurso a formas estéticas contemporâneas para servir à liturgia: tudo isso sempre com a intenção de ajudar os homens e as mulheres de um determinado tempo ao louvor de Deus e ao culto cristão.
Acima de tudo, é salvaguardada a polaridade do altar, do ambão e da cátedra? Ou seja, esses espaços são capazes de ser eloquentes e de mostrar, de fazer sinal de que a verdade cristã da santidade de Deus e da encarnação do Filho no mundo inspira a determinação do espaço? Estou profundamente convencido de que a adequação litúrgica de uma igreja deve respeitar essas exigências.
O altar deve ser o centro focal ao qual toda a assembleia se dirige, e deve aparecer claramente a sua qualidade de altar do sacrifício da cruz, além do seu ser a mesa do Senhor à qual os seus discípulos são convidados.
O ambão deve ser e se mostrar como o púlpito do qual ressoa a Palavra para toda a assembleia, "a tribuna posta em um lugar elevado", segundo o trecho bíblico que testemunha, pela primeira vez, esse elemento essencial para a assembleia nascida da Palavra (cf. Ne 8, 1-12). Deve significar semaínein, fazer sinal ao Cristo presente na sua Palavra, "pois é Ele que fala ao ser lida na Igreja a Sagrada Escritura" (Sacrosanctum Concilium, 7). Não é mais, portanto, leitura voltada ao norte, in cornu altaris, mas sim leitura dirigida à assembleia, que deve "ver a Palavra" (cf. Dt 5, 24).
Por fim, a cátedra, embora ligeiramente elevada, deveria permanecer lá onde pode ser lida a presidência do bispo, a sua função de proestós e, ao mesmo tempo, lá onde o bispo se mostra também como o primeiro ouvinte da Palavra. Nesse sentido, a posição tridentina da cátedra, não central na abside, mas lateral e voltada ao ambão e à assembleia, parece ser ainda a mais adequada.
Portanto, tudo deve estar predisposto de modo que a assembleia se sinta convocada pelo Senhor, esteja na presença do Senhor que vem (ho erchómenos), seja por ele compaginada no seu corpo, ordenado conforme o deseja a tradição apostólica e católica.
A segunda pergunta a ser respondida é a seguinte: na obra de adequação litúrgica é salvaguardado a orientação escatológica da assembleia? Sobre esse ponto, eu acredita que não haja muito para se deter, a não ser para recordar que a igreja deve ter uma orientação, porque a assembleia em ato é uma comunidade peregrina que espera e invoca a vinda do Senhor.
Na liturgia eucarística, todos estão conversi ad Dominum, voltados ao altar: eu acredito, portanto, que um elemento decisivo para se avaliar a qualidade de uma adequação litúrgica é a sua capacidade de fazer perceber a orientação escatológica da assembleia convocada pelo Senhor, sabendo que a adequação de uma igreja é um caminho de comunhão a serviço dos cristãos, para que o seu encontro com Deus na liturgia seja aderente à sua fé e ao espaço em que esta se expressa.
E esse caminho deve ser empreendido animado por uma consciência de fundo, que nunca devemos esquecer: sobre os problemas arquitetônicos e artísticos, sempre se pode discutir e debater, mas isso deve ser feito com respeito recíproco e, se somos católicos, tentando não dilacerar a Igreja, mas sim praticar a escuta uns dos outros.
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Arte sacra: a polaridade do altar, do ambão e da cátedra - Instituto Humanitas Unisinos - IHU