10 Junho 2014
"Shalom, Paz, Salam", proferiu o papa argentino, que em poucos meses – com o seu não à guerra da Síria e o projeto da cúpula inter-religiosa no Vaticano – demonstrou para ter a força de um líder capaz de permanecer na cena internacional".
A reportagem é de Marco Politi, publicada no jornal Il Fatto Quotidiano, 09-06-2014. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Em um lento pôr-do-sol, com a lua pela metade que aparecia na transparência do céu, o pontífice colocou em um micro-ônibus o presidente israelense, Shimon Peres, o presidente palestino, Mahmoud Abbas, o patriarca de Constantinopla, Bartolomeu I, e o custódio franciscano da Terra Santa, padre Pizzaballa, e os levou para a sua "casa", a residência de Santa Marta, onde os recebeu separadamente, em um canto do jardim, onde o milagre se realizou.
Na língua de Abraão
No gramado, todos os cinco chegaram lado a lado, de Francisco – na contraluz – se viam as calças pretas de padre jesuíta por baixo da veste branca. A céu aberto – porque as epifanias de Deus ocorrem sempre debaixo do céu – em um espaço livre de sinais de posse de uma única religião, o rabino judeu invocou cantando Adonai (o Senhor) na língua de Abraão, e o sábio muçulmano de turbante cantou a misericórdia de Alá nos versículos do Alcorão, que nunca tinham ecoado entre os muros da capital do catolicismo romano.
Rezou-se em tempos distintos, segundo o ritmo da história – antes os judeus, depois os cristãos, depois os muçulmanos – mas permanecerá inesquecível a mistura de invocações ao Senhor, da qual emerge a profunda intimidade entre os salmos bíblicos, a linguagem evangélica e os versículos do Alcorão.
Louvor ao Senhor, reconhecimento dos pecados, invocação à paz foram os três capítulos da oração de todas as religiões. Mais clara e específica foi a autocrítica do lado cristão, feita usando o mea culpa de João Paulo II para o Jubileu: o arrependimento por cada vez que os cristãos "causaram guerras, fomentaram a violência, ensinaram o desprezo para com os nossos irmãos e irmãs".
Sentavam-se sérios, imersos em reflexões ouvindo as orações, os três protagonistas dessa histórica cúpula. Imóvel, quase esculpido era o rosto de Shimon Peres, o judeu que veio da Polônia, sobrevivente da guerra e do Holocausto e que depois se tornou construtor e presidente do Estado de Israel. Tenso e pensativo, Mahmoud Abbas, o palestino que atravessou a "catástrofe" do seu povo, mas conseguiu levar a Palestina a ser reconhecida pela maioria dos países do mundo.
Quando tomou a palavra, Francisco conseguiu mais uma vez unir o aspecto humano, religioso e também geopolítico. "Filhos demais – lembrou – caíram vítimas de guerras e violências".
O diálogo no lugar da violência
A sua memória pede paz, respeito e coexistência pacífica. "É preciso coragem para fazer a paz – insistiu – muito mais do que para fazer a guerra" e, portanto, "sim ao diálogo, não à violência, sim ao respeito dos pactos, não às provocações, sim à sinceridade, não à duplicidade, sim à negociação, não às hostilidades".
É preciso "romper a espiral do ódio e da violência – lembrou em crescendo, mas sempre com a sua voz de tom baixo e modesto – e é possível fazer isso com uma única palavra: Irmão!".
Outras vezes, no entanto, alertou, as negociações se paralisaram, o Maligno se enfiou, e então é preciso voltar-se ao Deus de Abraão e dos profetas, para que indique o caminho a seguir e transformar o medo em confiança e as tensões em perdão. E assim chegar à paz.
"Shalom, Paz, Salam", proferiu o papa argentino, que em poucos meses – com o seu não à guerra da Síria e o projeto da cúpula inter-religiosa no Vaticano – demonstrou para ter a força de um líder capaz de permanecer na cena internacional.
Peres e Abbas estavam comovidos quando tomaram a palavra. O presidente israelense defendeu a necessidade da "perseverança" e da disponibilidade a "sacrifícios e compromissos" para alcançar uma paz entre iguais. Mas com fé e determinação, "a alcançaremos".
O presidente palestino interveio prolongando a oração. Dirigindo-se a Deus para que haja "liberdade para a Palestina, e Jerusalém seja salva e segura para todos os crentes", para que acabem os sofrimentos do povo palestino e haja para todo o Oriente Médio uma "paz compreensiva". E reiterou no fim: "Paz, estabilidade e coexistência".
Uma oração para mudar o mundo
Enquanto as imagens de Francisco, Peres, Abbas e Bartolomeu – de pá em punho para plantar uma oliveira auspiciosa – davam a volta no planeta, corria a pergunta inevitável: uma oração pode mudar o mundo? Provavelmente não. Na verdade, certamente, todos os obstáculos para a paz ainda estão sobre a mesa. Mas o gesto poderoso de líderes e chefes religiosos, que se reúnem em oração aos olhos do mundo para buscar o caminho da negociação, está destinado a se imprimir no sentimento da opinião pública internacional, evidenciando o fato de que a situação na Terra Santa – como disse Francisco em Belém – tornou-se "cada vez mais inaceitável".
Agora, a permanência da ocupação da Palestina tornou-se intolerável. A partir de hoje, o Hamas deve entender que não pode negar Israel e deve aprender a "compreender a dor alheia" (palavras de Francisco na Terra Santa).
A partir de hoje, o primeiro-ministro Netanyahu está mais isolado com a provocação dos novos assentamentos em terras palestinas e as suas pretensões nacionalistas territoriais, inspiradas pelo extremismo do partido dos colonos.
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Shalom, salam: o papa une o Oriente Médio - Instituto Humanitas Unisinos - IHU