Por uma teologia pastoral que nasça de um ''convite para almoçar''

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16 Abril 2012

Talvez devêssemos pôr uma ênfase muito maior no desenvolvimento do "convite para almoçar" como parte integrante dos programas de teologia pastoral.

Publicamos aqui o editorial do jornal National Catholic Reporter, 09-04-2012. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Seria, talvez, apenas um sinal dos tempos que os católicos ficassem abalados ao ler que um cardeal, enfrentando uma situação pastoral difícil, reconhecesse publicamente que se perguntou "Como Jesus agiria"?

Essa é a pergunta que o cardeal Christoph Schönborn, de Viena, Áustria, fez ao considerar se ele deveria manter uma decisão de um pároco de proibir um homem gay, em uma união doméstica registrada, servir em um conselho paroquial.

Em março, Florian Stangl, 26 anos, foi eleito com ampla maioria para o cargo, recebendo 96 dos 142 votos expressos pelos membros da paróquia. O pároco, Pe. Gerhard Swierzek, líder da pequena paróquia, interveio e, sustentando a lei da Igreja contra as uniões homossexuais, pediu-lhe para renunciar à posição e também, de acordo com as reportagens, pediu que Stangl não recebesse a Eucaristia.

A arquidiocese, no início, sustentou a regra. Então, Schönborn fez a si mesmo aquela pergunta. E Stangl pediu para falar com o cardeal.

Schönborn aparentemente decidiu que uma coisa que Jesus faria, seria convidar Stangl e seu parceiro para almoçar.

O que ele descobriu durante o almoço, disse ele mais tarde, é que ele ficou "profundamente impressionado com a disposição fiel [de Stangl], com a sua humildade e com a forma pela qual ele vive o seu compromisso com o serviço. Por isso, eu posso entender", disse o cardeal, "porque os moradores de Stützenhofen votaram tão decididamente pela sua participação no conselho paroquial".

E então Schönborn indicou que a arquidiocese iria tentar refazer as regras para as eleições pastorais, que atualmente exigem que os candidatos assinem uma declaração de que eles apoiam todos os ensinamentos da Igreja.

Em uma declaração explicando a sua decisão, Schönborn disse: "Há muitos conselheiros paroquiais cujo estilo de vida não está completamente em conformidade com os ideais da Igreja. Em vista do testemunho de vida que cada um deles dá, tomados em conjunto, e o seu compromisso com a tentativa de viver uma vida de fé, a Igreja se alegra com os seus esforços".

É interessante que, na mesma semana, circularam notícias amplamente na Internet e em outros lugares sobre a opinião do cardeal Carlo Maria Martini, expressas no livro Crer e conhecer, de que, embora a sociedade deva defender e apoiar a vida familiar, "não é ruim que duas pessoas tenham alguma estabilidade ao invés de relações homossexuais ocasionais, e, nesse contexto, o Estado também poderia favorecê-las".

Seria demais sugerir que Martini e Schönborn poderiam ser a vanguarda de uma mudança no pensamento hierárquico? Afinal, essa é a primeira geração de prelados que tiveram que se confrontar com a realidade de que gays e lésbicas não continuarão mais sendo um "problema" oculto. Eles abertamente fazem parte das nossas vidas, das nossas culturas, das nossas comunidades de fé e continuarão sendo. Eles já não são uma abstração sobre a qual se pronunciar, sem desafio, como alguma curiosidade teológica ou ética.

A outra coisa que Schönborn fez, foi falar publicamente sobre a sua luta com essa questão, discutindo a respeito durante uma entrevista de uma hora na televisão austríaca na noite do Domingo de Ramos. Essas questões fazem parte do discurso público, e ele demonstrou que a Igreja pode fazer parte desse discurso.

Schönborn revisitou essa questão em uma homilia dirigida aos padres da arquidiocese durante a Missa do Crisma na Terça-Feira Santa e a situou na questão mais ampla do cuidado pastoral para os católicos cujos estilos de vida não "estão em plena conformidade com os ideiais da Igreja". Ao invés de lançar invectivas contra pessoas em uniões homossexuais, contra católicos heterossexuais coabitantes e contra divorciados católicos em segunda união, Schönborn disse que a Igreja precisa abraçá-los em sua jornada de fé.

A abordagem de Schönborn atraiu muitas notícias, é claro, porque ela é muito notavelmente diferente de grande parte do policiamento confrontacional de fronteiras que existe na Igreja nos dias de hoje. Ela não sobrecarrega os leigos com uma exigência diante da qual a hierarquia, como sabemos, falharia miseravelmente enquanto classe – que todos sejam perfeitos em todos os detalhes.

E se, por exemplo, os bispos norte-americanos decidissem convidar a teóloga e irmã de São José Elizabeth Johnson para um almoço – ou mesmo para um jantar – para discutir a sua obra antes de condená-la imediatamente? E se Dom Robert McManus, de Worcester, Massachusetts, tivesse convidado Victoria Kennedy para almoçar e para conversar sobre qualquer objeção que ele pudesse ter contra ela como paraninfa do Anna Maria College? E se essas lideranças dos Estados Unidos tivessem levado em consideração o "testemunho de vida" dessas mulheres como um todo? Ambos os episódios poderiam ter tido finais mais civis, ou mesmo racionais.

Passar o tempo com alguém, especialmente partindo o pão com esse alguém, tende a suavizar as arestas duras. Isso não nega o princípio, mas pode fazer com que hesitemos, ou mesmo repensemos, antes de condenar alguém publicamente.

Os guerreiros da cultura entre nós podem recusar essa estratégia. À distância, as linhas sempre parecem mais nítidas e mais definidas. É difícil continuar guerreando contra alguém que você conhece um pouco mais e contra quem você percebe como alguém razoável e bem intencionado.

Talvez os seminários devessem levar em consideração o fato de pôr uma ênfase muito maior no desenvolvimento do "convite para almoçar" como parte integrante dos programas de teologia pastoral.

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