"O Egito do futuro? Um risco se for governado só pelo Islã"

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18 Julho 2011

Entrevista com Naguib Sawiris, o egípcio copta, magnata das telecomunicações. "Fundei um partido, mas não me candidato. É preciso um equilíbrio de forças".

A reportagem é de Francesca Paci, publicada no sítio Vatican Insider, 18-07-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Se o povo da Praça Tahrir, que no dia 8 de julho voltou a ocupar o lugar símbolo da revolução egípcia pedindo ao exército reformas rápidas, não tem experiência e malícia política, o magnata das telecomunicações Naguib Sawiris tem uma abundância de ambas as qualidades, tanto que, a poucas semanas da queda de Mubarak, ele já havia fundado o Partido dos Egípcios Livres.

Nascido em 1954 em uma família de empresários coptas, ele cresceu no Cairo dos primeiros islamistas e hoje é o principal investidor egípcio na Itália. Sawiris recebeu em Roma a honra de Comendador da Ordem da "Estrela da Solidariedade Italiana" pelo sucesso industrial da Wind. "Tenho muito pouco tempo, assim como o meu país", ele brinca, respondendo a algumas perguntas antes de voltar ao Egito, onde a raiva popular crscente trai a desconfiança com relação aos guardiães da transição de uniforme, mas também com relação aos Irmãos Muçulmanos, os antigos aliados que se revelaram perigosos antagonistas políticos.

Eis a entrevista.

No dia seguinte à revolução em nada completa, alguns coptas se atreveram a dizer que estavam melhor com Mubarak. O que mudou na sua comunidade a cinco meses do triunfo religiosamente transversal da Praça Tahrir?

Os coptas têm medo, é óbvio. Enquanto minoria estão regularmente com medo. Além disso, depois da revolução, recomeçaram os incêndios em igrejas que se esperava que estivesse arquivados com o velho regime. Mas eu tenho uma crítica a fazer à minha comunidade: não se pode ser sempre passivos politicamente segundo o princípio bíblico de dar a outra face infinitamente. Diante do diabo, não podemos nos dar ao luxo de ser fracos.

Quem é o diabo, ou melhor, o perigo que ameaça o Egito livre?

O risco real hoje é a afirmação do fundamentalismo, porque neste momento não há nenhuma garantia de que o Egito futuro será um Estado civil sem ser refém da lei religiosa. Estou preocupado. Os coptas também estão, mas os liberais também, que não podem excluir o fato de ficarem fora do próximo Parlamento, quando for realizada a contagem dos votos.

É por isso que o senhor fundou o Partido dos Egípcios Livres?

Eu não tenho intenção de entrar para a política diretamente. Não vou me apresentar nem às eleições parlamentares e não quero cargos. Criei um partido secular porque, imediatamente depois da revolução, eu pensei que não seria positivo para o país ter um único partido e de inspiração islâmica, os Irmãos Muçulmanos. Eu quero viver em uma sociedade civil liderada por leigos e acredito que as próximas eleições vão precisar de um equilíbrio de forças. Neste momento, no Egito, os três principais partidos são todos de inspiração muçulmana, e eu, mesmo enquanto copta, estou convencido de que ser governado exclusivamente pelo Islã seria um risco para o Egito e para o Ocidente, que certamente não gostaria de ser invadido por imigrantes em fuga. Temos à disposição o exemplo de três países liderados segundo princípios islâmicos: o Paquistão, o Irã e a Turquia. O único aceitável, a meu ver, é o modelo turco.

Na Turquia, o equilíbrio entre religião e política é garantido desde sempre pelo Exército. O senhor confia nos militares egípcios, até recentemente ao serviço da ditadura?

Eu não sou otimista, mas não tenho escolha. O que mais poderia fazer? Eu prefiro não me questionar a respeito. É claro, tenho diversas a fazer ao Exército, mas, goste ou não, só posso confiar, porque o país ainda não tem um governo estável, nem forças de segurança autônomas. Por isso, não aprecio aqueles que só sabem polemizar com os militares. É melhor procurar um diálogo e tentar ser influente, até porque sem eles o país mergulharia na anarquia. Os nossos jovens estão cheios de ótimas intenções, mas me parece que lhes falta a capacidade de construir: destruir é fácil, e depois? É hora de arregaçar as mangas e trabalhar com o que temos à disposição. Além dos militares, estão em campo os Irmãos Muçulmanos, e eu me preocupo porque eles se comportam como se estivessem diante de um fato consumado, como se já tivessem alcançado o objetivo, como se estivessem sozinhos.

Parece que os Irmãos Muçulmano vão vencer. O que o senhor pensa a respeito?

Certamente, eles são os que falam mais alto e são os mais bem organizados, até porque são apoiados pelas monarquias ricas do Golfo. O tempo à disposição dos liberais é pouco, mas ainda não é óbvio que os Irmãos Muçulmanos irão conquistar as eleições.

E, se acontecesse, se os religiosos conquistassem o Parlamento?

Seria uma catástrofe. Sou a favor de um Estado islâmico sob o modelo turco, mas eles não, eles não têm a Turquia em mente.

As certezas políticas vacilam, o turismo padece, os investidores estrangeiros não confiam, e a economia está quase no colapso. O senhor acha que a revolução egípcia está comprometida?

Sempre há um preço a pagar pela liberdade e pela democracia. A situação é problemática, a longo prazo a revolução vai se revelar positiva para o Egito e para o seu desenvolvimento. A democracia é a melhor garantia para a economia.